Biodiversidade: vítima e ferramenta contra mudança climática
2006-03-27
A biodiversidade é uma das principais vítimas da mudança climática e, ao mesmo tempo, uma ferramenta valiosa para reduzir seus efeitos, disseram na sexta-feira(24/03) analistas na Conferência da Convenção sobre Diversidade Biológica. O aquecimento do planeta, que causou o derretimento das calotas polares e de glaciais, assim como o aumento do nível do mar e mudanças no regime de chuvas, também obriga muitas espécies a emigrar para outras regiões ou a se adaptarem aos aumentos da temperatura, segundo os especialistas.
"Está claro que o componente biológico foi gravemente afetado pela mudança climática. Inevitavelmente todos teremos que nos adaptarmos a essas alterações", disse o oficial para Assuntos Ambientais da Secretaria da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), Manuel Guariguata. O coordenador do Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Carlos Nobre, advertiu, por sua vez, que "se o mundo continuar aquecendo a extinção de espécies aumentará", já que muitas delas não resistirão ao aumento das temperaturas.
Relatório
Um relatório elaborado por um grupo de 23 analistas de vários países e organizações internacionais a pedido da CDB analisou os processos de adaptação das espécies à mudança climática e elaborou uma série de recomendações que foram debatidas em Curitiba. "Com o nível do mar subindo, muitas zonas costeiras serão afetadas e alguma estratégia de adaptação terá que ser elaborada. O mesmo ocorre com muitas espécies que não agüentam o calor e para as quais se necessitam alternativas migratórias", afirmou Guariguata.
Os analistas que estão em Curitiba lembraram que há casos que merecem atenção especial, como o da ilha de Tuvalu, situada no Pacífico sul, e formada por nove atóis marítimos, que está ameaçada pela elevação do nível do mar. Se esse perigo se concretizar, a ilha de Tuvalu, que tem pouco mais de 11 mil habitantes, teria que ser evacuada nos próximos anos, já que a maior altitude nesse pequeno país é de apenas cinco metros. Porém, pouco poderia ser feito para salvar suas espécies animais.
Recomendações
Uma das principais recomendações do documento da CDB é que os governos incorporem componentes ambientais nas estratégias para enfrentar a mudança climática, pois a natureza é um importante aliado na luta contra o aquecimento da Terra. Guariguata explicou que, por exemplo, os mangues, quando estão intactos, constituem uma barreira importante para suavizar os impactos da mudança climática.
De acordo com os especialistas, se as zonas de pântanos em Nova Orleans não tivessem sido destruídas pela ação do homem, as inundações causadas no ano passado pelo furacão Katrina teriam sido menos intensas, já que os mangues atuam como reguladores dos movimentos das águas. O mesmo exemplo vale para os países do sudeste asiático que foram devastados pelo tsunami de dezembro de 2004.
Embora as ondas gigantes que deixaram milhares de mortos não tenham sido conseqüência da mudança climática, está comprovado que as zonas costeiras que tinham seus mangues intactos sofreram menos do que aquelas onde esses ecossistemas tinham sido removidos. De acordo com os especialistas, estudos mostram que mesmo que o mundo acabasse imediatamente com as emissões de gases poluentes, especialmente do dióxido de carbono (CO2), haverá um efeito de inércia e a Terra continuará se aquecendo durante décadas, por isso é necessário buscar na biodiversidade as alternativas para enfrentar esse fenômeno.
"Não há dúvidas de que a temperatura do planeta está subindo. Quanto mais rápido abordarmos as relações entre mudança climática e biodiversidade, melhor", opinou Nobre. Conscientes disso, representantes de um grupo de pequenas ilhas-Estado disseram nesta sexta que na próxima semana, quando os ministros do Meio Ambiente se somarem aos trabalhos da reunião de Curitiba, anunciarão sua incorporação a uma rede mundial de áreas de proteção da biodiversidade marinha. Na Oitava Conferência da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), que começou na segunda-feira passada e se estenderá até 31 deste mês, participam delegações de 187 países e da União Européia (UE), que discutem o estado da biodiversidade mundial e seu futuro.
(EFE, 25/03/06)
http://www.estadao.com.br/ciencia/noticias/2006/mar/24/293.htm