Polícia acredita que agricultoras em Passo Fundo podem estar ligadas a incidente na Aracruz
2006-03-23
Lenços de cor lilás, em forma triangular e impressos com a mensagem "não ao
deserto verde", foram apreendidos na Associação das Mulheres Trabalhadoras
Rurais (AMTR), em Passo Fundo. Para a polícia, seria um dos indícios do
envolvimento das mulheres ouvidas na noite de terça-feira (21/03) e ontem (22/03) com o ataque
à Aracruz Celulose, perpetrado na madrugada de 8 de março, em Barra do Ribeiro.
- São iguais aos usados pelas pessoas que participaram da depredação - confirmou
o delegado regional de Camaquã, Rudymar de Freitas Rosales.
Entre as nove suspeitas ouvidas em Passo Fundo, há integrantes da AMTR,
simpatizantes e a jornalista suíça Corinne Chantal Dobler, 33 anos. Ela afirmou
à polícia que mora há um ano no município e faz um estágio voluntário para a
associação. A reportagem de Zero Hora localizou Corinne pelo telefone, mas ela
disse que não falaria com a imprensa.
- Desculpe, não posso dizer nada - declarou com um português precário.
Uma das investigadas disse só ter visto o ato pela TV
Também foram recolhidos na sede da AMTR nove computadores, bandeiras, R$ 10 mil,
US$ 5 mil e notas de peso chileno e de quetzales, a moeda da Guatemala. A
exemplo dos depoimentos de terça-feira, todas negaram a participação ou se
valeram do direito de permanecer caladas diante das perguntas. À imprensa, as
agricultoras disseram não conhecer a origem dos lenços apreendidos.
- Eu vi a destruição em Barra do Ribeiro só pela TV. Não tenho nada a ver com
que aconteceu - falou, chorando, Noemi Krefta, uma das investigadas.
A polícia ainda não pretende pedir a prisão de ninguém. Primeiro verificará o
conteúdo dos computadores e analisará as imagens das emissoras de TV que podem
confirmar as suspeitas. Quem for identificado poderá ser indiciado por
sabotagem, danos qualificados e cárcere privado.
- As provas estão sendo compiladas dentro dos autos. Felizmente as informações
que tínhamos se comprovaram. Temos elementos de materialidade positivos para
demonstrar a responsabilidade de algumas das pessoas que participaram daqueles
atos - disse o delegado Rosales.
Ele explicou que a polícia não tem a pretensão de identificar todos os
envolvidos, mas responsabilizará os que tiverem a participação confirmada.
Mulheres reclamam da ação policial
Depois do final dos depoimentos, três das mulheres ouvidas pela Polícia Civil
falaram à imprensa para se queixar de supostas arbitrariedades dos agentes que
estiveram na sede da Associação das Mulheres Trabalhadoras Rurais (AMTR).
- Sete pessoas com armas de fogo entraram gritando. Nós não sabíamos o que
estava ocorrendo. Deu um pânico geral. Nós todas ficamos assustadas porque não
sabíamos o que era. Demoraram mais de uma hora para chamar o advogado - disse
Luci Piovesan, tesoureira da AMTR e uma das investigadas.
As agricultoras também reclamaram que a polícia vasculhou a parte de baixo da
casa, onde funciona a Associação Nacional das Mulheres Trabalhadoras Rurais.
Alegam que o mandado era somente para o andar de cima.
Contraponto
O que diz o delegado Rudymar de Freitas Rosales, delegado regional de Camaquã
que comanda as investigações da depredação:
A Polícia Civil cumpriu estritamente seu dever legal. A entrada na casa (sede da
AMTR) foi dentro da lei, e não houve nenhum tipo de abuso. O mandado que
tínhamos era para a casa. Como o local tem dois andares, nós poderíamos fazer
buscas nos dois pavimentos.
Indústria fará ação judicial
Assim que as investigações identificarem os responsáveis, a Aracruz ingressará
na Justiça contra os invasores de seu viveiro, em Barra do Ribeiro. O diretor de
operações da empresa, Walter Lídio Nunes, informou ontem que a empresa
está acompanhando as apurações da polícia e do Ministério Público e que
recorrerá ao Judiciário por questões de princípio.
- A partir do que for apurado, a Aracruz se integra ao processo para buscar o
seu direito. É uma obrigação nossa porque, numa democracia, cada um briga pelos
seus direitos. Alguém tem de ser chamado à responsabilidade pela transgressão -
explicou.
Nas análises públicas que vêm fazendo, os representantes da empresa salientam
que não consideram o episódio um ato contra a Aracruz. Avaliam que faz parte de
um movimento mais amplo, de caráter internacional, contra o setor, em particular,
e contra o agronegócio, de um modo geral.
ONGs lançam guerra de dados contra a empresa
O executivo, que participou ontem de um seminário sobre as razões para se
investir no Rio Grande do Sul, cobrou do governo federal mais transparência no
relacionamento e no controle das organizações não-governamentais (ONGs) que
atuam no país. Walter Lídio reclamou também que as entidades disseminam
informações no Exterior, que causam transtornos para os negócios.
- Temos clientes de longo prazo que vêm até aqui para ver se o que estamos
informando é correto uma vez que as ONGs falam de atritos com as populações e
poluição - reclamou.
Uma das informações divulgadas recentemente pelas ONGs foi a decisão da família
real da Suécia de vender as ações que possuía da Aracruz, por causa dos
conflitos. Ontem, o executivo da empresa minimizou o episódio.
- A família real sueca enviou uma carta, que está no nosso site, elogiando a
empresa e afirmando não conhecer nada de desabonador sobre nós. Mas as ações
eram equivalentes a US$ 10 mil apenas. A família real vendeu para não ficar no
centro de uma polêmica inútil, para não ter as ONGs, por nada, fazendo
manifestações na frente do palácio - afirmou.
(ZH, 22/03/06)