Despoluição do Lago de Araruama (RJ) morre na praia
2006-03-22
De volta à estaca zero. As estações de tratamento de esgoto recém-construídas em Iguaba, Araruama, São Pedro da Aldeia e Cabo Frio estão longe de evitar o fim da poluição na Lagoa de Araruama. Os 520 litros de resíduos tratados e lançados no espelho d´água, por segundo, continuam alimentando a lagoa com fósforo e nitrogênio - principais nutrientes das microalgas que se reproduzem em ritmo acelerado, alterando a coloração da água. Mais de R$ 100 milhões foram gastos pelas concessionárias Prolagos e Águas de Juturnaíba na construção das estações, segundo Luiz Firmino, secretário executivo do Consórcio Intermunicipal Lagos São João. O grupo foi criado há sete anos para executar ações de controle ambiental na região.
A concentração de fósforo na lagoa está 200% acima dos padrões considerados normais, segundo Firmino. No terceiro capítulo da série sobre o drama ambiental da Lagoa de Araruama, o JB mostra a ineficácia dos planos emergenciais de despoluição do ecossistema local.
- Algumas das estações que foram construídas promovem o tratamento secundário do esgoto. Esse método é ultrapassado e não resolverá o problema de poluição por nutrientes porque não elimina de maneira eficiente o nitrogênio e o fósforo, que são a causa do crescimento das algas - explica o oceanógrafo André Luiz Costa Moreira.
Estudo científico realizados pelo oceanógrafo na Baía de Tóquio, no Japão, há sete anos, demonstrou que o tratamento secundário acelera o crescimento de algas quando os resíduos finais de esgoto são lançados em ambientes costeiros de circulação restrita, como a Lagoa de Araruama.
- O despejo de milhões de litros por dia de nutrientes mineralizados na lagoa causará um impacto ecológico considerável. Justo o que se pretende evitar com a construção de uma estação de tratamento. O ideal é promover um tratamento terciário, quando fósforo e nitrogênio são totalmente removidos dos resíduos - alerta Moreira.
O secretário executivo do consórcio afirma que 80% do esgoto produzido na região é captado pelos cinturões no entorno da lagoa e conduzido às estações. A de Araruma promove o tratamento secundário de 130 litros de esgoto por segundo. Também sem remover fósforo e nitrogênio nas condições esperadas, a estação de Cabo Frio trata 230 mil litros de esgoto por segundo.
Nem mesmo a estação de São Pedro da Aldeia, que promove o tratamento terciário de 90 litros de esgoto por segundo apresenta índices finais satisfatórios, segundo Firmino.
- As terciárias não estão dando os resultados esperados. A concentração de fósforo nos afluentes tratados ainda é bastante elevada - observa Firmino.
Apontado como principal vilão do drama ambiental ancorado na Lagoa de Araruama, - a maior de água salgada do mundo - o esgoto modificou o curso de vida de centenas de pescadores. O sumiço de espécies como a carapeba e a diminuição do tamanho de outras, como a tainha, já obrigam os comerciantes a importar pescado de outros estados brasileiros.
Estação de esgoto desativada
Finalizada há mais de um ano, a estação de tratamento de esgoto de Iguaba nunca funcionou. A escolha do ponto de lançamento dos resíduos tratados é um dos impasses entre a concessionária Prolagos e o Consórcio Intermunicipal Lagos São João. A empresa insiste que os resíduos sejam despejados nas proximidades do Quiosque Popeye. O local é um dos que reúne a maior concentração de banhistas.
- Somos totalmente contra. Aquele ponto é freqüentado por um grande número de banhistas. É inviável conceber que os afluentes, mesmo que tratados, sejam lançados naquela localidade - afirma Luiz Firmino, secretário executivo do Consórcio Intermunicipal Lagos São João.
A localização da comporta que desviará os afluentes do Rio Salgado para a estação elevatória, que o conduzirá para a estação de tratamento, é outro assunto ainda em debate. Os temas serão discutidos na Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico, do governo do estado, na quinta-feira.
Para tentar contornar a ineficiência das estações de tratamento, o consórcio elaborou um estudo para lançamento dos afluentes tratados em áreas rurais da Região dos Lagos.
- O plano é bombear os afluentes atualmente lançados na Lagoa de Araruama em direção ao Rio Una, na zona rural. Dessa forma, promoveríamos a reutilização da água, que neste caso passa por tratamento terciário, na agricultura - planeja Firmino.
Segundo ele, mesmo o fósforo, que contribui para a falência da lagoa, pode ser transformado.
- Países europeus utilizam um sistema no qual, a partir de tratamento químico, o fósforo pode ser usado na composição de adubo agrícola. O óleo proveniente do esgoto serve à fabricação de combustível e o lodo, na indústria cerâmica - complementa o oceanógrafo André Luiz Costa Moreira.
(Jornal do Brasil, 21/03/06)