Monocultura de frangos ameaça a diversidade biológica global
2006-03-21
Da mesma maneira que plantações de poucas espécies
de árvores têm se espalhado pelo planeta, para a produção de papel e celulose, a “monocultura” de variedades domésticas de frangos avança pelo globo em granjas onde esses animais se espremem aos milhares. Esse modelo de criação agrícola estaria facilitando a disseminação de doenças como a gripe aviária, ao diminuir a diversidade genética que serviria como barreira natural à contaminação em massa, acredita o professor Reuben Shanthikumar, originário do Sri Lanka e atualmente trabalhando no tema do desenvolvimento rural da Universidade da Califórnia, Estados Unidos.
O pesquisador participou nesse fim de semana de uma reunião informal com especialistas de vários países. Eles estão presentes à 8ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP8), que começou nesta manhã em Pinhais, região metropolitana de Curitiba. Os cientistas vão encaminhar à COP8, oficialmente, hoje à tarde, recomendações para ajudar no combate à gripe das aves.
O primeiro caso conhecido da doença ocorreu na província de Guangdong, China, em
1996. De lá, o microrrorganismo da gripe se disseminou em outras direções. Na sua rota, 17 países da Ásia, África e Europa já registraram casos em animais e pessoas. Pelo menos 150 milhões de aves domésticas foram sacrificadas na tentativa de evitar a disseminação da epidemia, causada pelo vírus H5N1.
A doença circula principalmente entre aves, mas grandes mamíferos, como seres
humanos, não estão imunes. Mais de cem pessoas já morreram pela ação do vírus, além de dois tigres e dois leopardos vitimados na Tailândia. O temor é de que o vírus se adapte, podendo ser transmitido de pessoa para pessoa.
Apesar de ainda não existir comprovação científica sobre o papel das monoculturas de frangos no avanço da gripe aviária, Reuben estima que ao infectar essa ave, o H5N1 teria facilidade em circular pelo planeta contaminando outras espécies. “É o mesmo tipo de galinha produzida no Brasil, nos Estados Unidos, na Itália, na China e em muitos outros países”, disse.
Durante o evento, os cientistas chegaram ao consenso de que a culpa pelo avanço
do vírus H5N1 não é exclusiva das aves migratórias, mas conta com atividades humanas como a produção global de frango e o comércio ilegal de animais silvestres. Isso, conforme os especialistas, deve servir de alerta principalmente para países em desenvolvimento, onde as criações têm condições sanitárias inadequadas ou concentram milhares de aves em espaços reduzidos.
Ameaça à biodiversidade
Conforme estudo apresentado por Diana Bell, do Centro de Ecologia , Evolução e Conservação da Universidade da Anglia do Leste, na Inglaterra, doenças exóticas como a gripe aviária são uma ameaça à biodiversidade. Populações de cachorros selvagens africanos, sapos, tartarugas do deserto e gorilas, por exemplo, estariam em declínio pela ação de vírus contra os quais não têm resistência natural. De acordo com a pesquisadora, 45% ordens (grandes grupos) de aves foram
afetadas pelo H5N1, principalmente pela proximidade com criações domésticas. Isso é um risco para 54 espécies ameaçadas de aves.
O professor Reuben afirma que uma barreira contra a gripe aviária seria o aproveitamento da biodiversidade. Ela aposta que se os países valorizassem as aves típicas de cada região, formariam uma “barreira natural” ao avanço de alguns vírus.
Para o pesquisador do Sri Lanka, também são necessários mais estudos sobre as rotas de migração de aves, fortalecimento dos sistemas nacionais de vigilância e o urgente treinamento de veterinários e técnicos para acompanharem e reconhecerem os sintomas da gripe aviária.
Isso também pode ser um alerta também para o Brasil, que recebe todos os anos
cerca de 20 espécies migratórias da América do Norte e que, na opinião dele, ainda não possui um sistema adequado de vigilância e nem laboratórios em quantidade suficiente
diagnosticar o H5N1. Na América do Norte e no Brasil não há registros de casos, mas “ninguém sabe o que acontecerá no futuro”, disse Reuben. “É preciso estar preparado”, completou.
Aldem Bourscheit, Assessoria de Imprensa COP8/MOP3