Coordenador da Via Campesina afirma que exclusão é mais violenta que as ações do movimento
2006-03-20
Entrevista: Rafael Alegria Coordenador da Via Campesina
Zero Hora - Qual o modelo de desenvolvimento para o campo?
Rafael Alegria - O modelo de desenvolvimento agrícola que defendemos é o da soberania
alimentar, que implica garantir o direito à alimentação dos povos. Cada vez mais os
consumidores querem alimentos orgânicos e sustentáveis. Chamamos de soberania alimentar.
ZH - No passado, os sem-terra combatiam as grandes propriedades improdutivas. Hoje, lutam
contra o quê?
Alegria - Há uma guerra contra o latifúndio na Venezuela, na Bolívia, no Brasil e em
outros países. Hoje, temos um projeto global alternativo, da Via Campesina e de outros
setores da sociedade civil.
ZH - Qual a importância do presidente venezuelano Hugo Chávez para o projeto de vocês?
Alegria - O governo Chávez declarou guerra ao latifúndio e proibiu os organismos
geneticamente modificados. Por isso que solicitamos que Lula faça reforma agrária.
ZH - Por que a reforma agrária não avança no Brasil?
Alegria - Falta vontade política do governo.
ZH - Falando sobre o Brasil, qual a importância do MST para a Via Campesina?
Alegria - O MST é uma organização importante, bem organizada e com muita capacidade de luta.
ZH - Quando foi decidido que grandes empresas produtoras de eucaliptos deviam ser atacadas?
Alegria - A produção de eucalipto resulta em problemas ambientais. Há uma regra geral no
movimento contra a produção de eucaliptos e de papel porque trazem enormes danos ao
ambiente.
ZH - Os assentamentos do MST produzem eucaliptos.
Alegria - Claro, me refiro à produção em grande escala. Mas também não deve haver
experimentos nos assentamentos devido aos danos ao ambiente.
ZH - Quando foi definido que a Aracruz seria invadida?
Alegria - Foi uma ação das mulheres internacionais. Elas comemoraram o Dia Internacional
da Mulher com uma ação dessa natureza. Nós apoiamos.
ZH - Como foi a repercussão da invasão na Via Campesina?
Alegria - A Aracruz foi uma questão simbólica. Uma mensagem enviada pelas mulheres às
multinacionais. Fizemos algo parecido, há alguns anos, contra a Monsanto, em Não-Me-Toque.
ZH - O senhor esteve em Não-Me-Toque?
Alegria - Sim, estive.
ZH - E na Aracruz?
Alegria - Não. A atividade na Aracruz foi das mulheres.
ZH - Mulheres de quantos países estavam em Porto Alegre?
Alegria - Mais de 90.
ZH - Todas participaram?
Alegria - Não sei, porque foram as mulheres que organizaram.
ZH - Vocês defendem a luta armada contra o neoliberalismo?
Alegria - Não. Defendemos luta popular. Não defendemos violência.
ZH - Defender a invasão da Aracruz não é defender a violência?
Alegria - Quero pedir a compreensão dos habitantes do Rio Grande do Sul de que estamos
defendendo a terra, a água e o ambiente. A violência gerada pela exclusão social é muito
maior.
(ZH, 19/03/06)