Especialista da Poli avalia potencial da energia eólica no Brasil
2006-03-17
O impacto ambiental e social causados pelas matrizes energéticas
tradicionais, o crescimento incessante do consumo, a escassez dos
recursos fósseis e a assinatura do Protocolo de Quioto levam o Brasil a
seguir uma tendência mundial de investimentos em fontes alternativas de
energia. Além da biomassa, uma opção se destaca pelo seu potencial no
país: a energia eólica. Dados do Conama (Conselho Nacional do Meio
Ambiente) revelam que o potencial eólico é duas vezes maior que o das
hidrelétricas e equivale a 143 GW – quase 50% a mais que a produção
atual de energia do país.
“O Brasil segue a tendência mundial e tem criado mecanismos para
incentivar o desenvolvimento da energia eólica. Até 2008 o governo
pretende dispor de uma capacidade instalada de 1.100 MW”, diz a
professora Eliane Amaral Fadigas, do Departamento de Engenharia de
Energia e Automação Elétricas da Escola Politécnica da USP.
A professora, responsável pela disciplina “Energia Eólica: Fundamentos e
Viabilidade Técnico-Econômica”, na pós-graduação da Poli, explica que o
investimento virá do Proinfa (Programa de Incentivo às Fontes
Alternativas de Energia), lançado pelo Governo Federal em 2002. “O
programa contempla três modalidades de fontes alternativas: usinas
eólicas, pequenas centrais hidrelétricas e centrais termelétricas
movidas com biomassa”,diz. No total, o programa investirá R$ 8,6
bilhões, e deverá resultar numa capacidade de 3.300 MW, um terço para
cada modalidade.
Cenário mundial
O Brasil possui atualmente, segundo a professora, 30 MW instalados em
turbinas eólicas. Estão no litoral do Ceará, no Rio Grande do Norte,
Santa Catarina e Paraná. Está em implantação um parque eólico de 150 MW
no Rio Grande do Sul. “Ainda é pouco, mas o Proinfa deverá impulsionar o
interesse pela energia eólica”, declara.
Hoje no mundo há cerca de 50 GW de potência instalada com turbinas
eólicas, segundo a especialista. “Para se ter uma idéia, isso
corresponde à metade da capacidade instalada do que o Brasil possui em
todos os tipos de usinas para produção de energia”, diz ela. Cerca de
75% deste total de energia eólica é gerada na Europa. O maior produtor é
a Alemanha, com 18 GW, seguida pela Espanha, com 10 GW e os Estados
Unidos, com 7 GW. Depois vêm a Dinamarca e a Índia.
O grande fator limitante das energias alternativas de modo geral, na
opinião de Eliane, é que elas ainda são mais caras que as tradicionais e
dependem de incentivos do governo. Os incentivos são feitos tanto em
forma de subsídios, quanto de descontos e outros mecanismos. A
obrigatoriedade das concessionárias de terem um percentual mínimo de sua
produção em energias renováveis também contribui para seu desenvolvimento.
“Precisamos nacionalizar a produção de turbinas eólicas”
“Os incentivos ainda são escassos, mas já tivemos um grande avanço com o
Proinfa”, diz Eliane. Com o investimento do programa, explica ela, a
holding do setor elétrico – a Eletrobrás – comprará energia produzida
pelas vias alternativas e repassará ao mercado com subsídios. O
consumidor final terá também um acréscimo para financiar as novas fontes
energéticas – com exceção do consumidor de baixa renda.
Além dos subsídios, o governo dará desconto de 50% no transporte de
energia para as empresas que a produzirem dentro das três modalidades
alternativas. “Os grandes consumidores de energia, como as indústrias e
grandes empresas (com demanda de mais de 3 MW), ao contrário dos
consumidores residenciais que têm fornecimento exclusivo das
concessionárias, podem comprar energia de vários geradores. Uma empresa
de São Paulo pode decidir comprar de um fornecedor do Nordeste, por
exemplo, pagando o custo de transporte ao governo. Se comprar energia
eólica, terá o desconto”, explica.
Além dos incentivos e subsídios, a professora acredita que, para fazer a
energia eólica decolar definitivamente, o governo vai precisar investir
em pesquisa, no mapeamento do potencial eólico do país e,
principalmente, na nacionalização das turbinas eólicas, cuja importação
é um dos maiores limitantes. “O Brasil não tem fábrica de turbinas. Só
existe no território nacional a Wobben Wind Power, de capital alemão,
instalada em Sorocaba, no interior paulista. Este é o ponto de partida
para reduzir os custos da energia eólica”.
Centros de excelência
O crescimento do interesse pela energia eólica no Brasil proporcionou a
criação de centros de excelência para pesquisar o assunto em várias
universidades, segundo Eliane. Equipes especializadas se preocupam em
conhecer como se faz o levantamento do potencial econômico, estudam
equipamentos aplicados a turbinas e o impacto deste tipo de geração
integrado à matriz energética do país.
O custo deste mapeamento é alto, segundo ela, porque as torres
meteorológicas utilizadas para medição dos ventos também têm 90% dos
componentes importados. “A avaliação do potencial é um fator importante,
porque a insuficiência do regime de ventos de determinada localidade é
também um fator limitante fundamental”, diz Eliane. Segundo ela, a
energia eólica é viável em regiões com ventos acima de 7 metros por
segundo em média (equivalente a 25,2 km/h). “Abaixo disso, o fator de
capacidade da planta é baixo e o custo, por conseqüência, muito alto.
Hoje, o custo por megawatt gerado está em torno de US$ 70 por megawatt”,
diz. As máquinas só funcionam a partir de ventos de 3 m/s.
No Brasil, algumas regiões do Nordeste apresentam fator de capacidade em
torno de 45%. “Se houver bom potencial no local e uma indústria
nacionalizada, a geração eólica é altamente viável. O custo do quilowatt
instalado numa turbina eólica (a máquina inteira) está entre mil e 1300
dólares por quilowatt – valor equivalente ao de muitas centrais
hidrelétricas, por exemplo”. Apesar do potencial, a pesquisadora
acredita que a energia eólica será sempre uma fonte complementar. “O
importante é diversificar a matriz energética para não ficarmos
dependentes de um recurso único”, pondera. (Carta Maior, 16/03/06)