Especialistas discutem cenários futuros para as águas sul-americanas
2006-03-14
Com o objetivo de avaliar os impactos regionais decorrentes do aumento da demanda de água doce na América do Sul, o projeto Sustentabilidade das Águas Sulamericanas propõe mecanismos de precaução para as mudanças globais de curto, médio e longo prazo. O trabalho, iniciado em 2002, reúne especialistas em recursos hídricos de diversos países, que desenvolvem documentos conceituais sobre sustentabilidade das águas do continente, levando em consideração dois programas internacionais.
Um deles é a Avaliação Ecossistêmica do Milênio, da Organização das Nações Unidas (ONU), e o outro é a Previsão de Bacias com dados escassos (PUB, na sigla em inglês), da Associação Internacional de Ciências Hidrológicas. O primeiro programa projeta cenários globais da água até o ano 2100; o segundo colaborou na criação, para o período 2005-2015, dos projetos "Década da Água: água para vida" (também da ONU) e "Década Brasileira de Água".
A América do Sul possui mais de 47% da reserva de água doce do mundo e as previsões sobre a oferta hídrica não são animadoras: até 2025, a escassez de água poderá afetar metade da população do planeta. Além disso, o setor de hidronegócio está crescendo e poderá superar em 2015 o setor de agronegócio.
"Os resultados principais do projeto foram imediatos, devido ao impacto obtido pelos documentos conceituais que chegaram a tempo aos tomadores de decisão e formadores de políticas de desenvolvimento", explica Eduardo Mendiondo, um dos especialistas participantes do programa e coordenador do Núcleo Integrado de Bacias Hidrográficas (NIBH), da Escola de Engenharia da Universidade de São Paulo (USP) de São Carlos.
"Em relação à Bacia do Prata, a Organização dos Estados Americanos (OEA), por exemplo, convidou-nos em 2004 a colaborar, utilizando estas visões globais complementares, com a identificação e seleção de projetos pilotos que seriam mais adequados para demonstrar a real capacidade de soluções de conflitos de recursos hídricos nos cinco países: Argentina, Brasil Bolívia, Paraguai e Uruguai", diz o especalista.
Também em 2004, afirma Mendiondo, o Comitê Gestor da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde de São Paulo, cuja área de abrangência é considerada uma área piloto global, se beneficiou com estas visões e diretrizes, que incidiram em projetos de grande porte, como o caso do Rodoanel. A partir disso, demonstrou-se os impactos socioambientais desta obra e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) exigiu que houvessem modificações no trecho sul.
O projeto de sustentabilidade das águas é marcado por reuniões internacionais que já foram realizadas no Brasil, Argentina e Equador com a participação de especialistas internacionais, em especial da América do Sul. Mendiondo enfatiza que os encontros realizados no país foram importantes para as agências de fomento como Finep, Fapesp e CNPq, que se beneficiaram com assessorias científicas e diretrizes para futuras pesquisas que incluem esses novos conceitos de programas globais. Além disso, as reuniões influenciam os tomadores de decisão com relação à água.
Neste ano e em 2007, os resultados serão voltados diretamente para a população sob a forma de cartilhas, diretrizes e protocolos que tratarão, sobretudo na mídia, de sistemas de alerta ambiental e da relação das reservas hídricas com o PIB, bônus ambiental e IPTU - acrescentando na Planta Genérica de Valores (PGV), que estipula o preço deste imposto, um valor referente ao impacto ambiental causado pelo imóvel.
Arquivo: Iniciativas para conter impactos ambientais começam a ser levantadas por cidades (27/10/05)
As populações urbanas consomem 75% das reservas naturais mundiais, produzindo 75% de seu lixo, segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU). Dessa forma, é necessário que medidas para combater os efeitos das mudanças climáticas sejam definidas de forma descentralizada, ou seja, pelas administrações das próprias cidades e não em escala nacional. Essa idéia está em discussão no interior de São Paulo, em São Carlos. Uma carta enviada por um membro do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema) a vereadores, empresas e Ministério Público, quer acrescentar na Planta Genérica de Valores (PGV), que estipula o preço do IPTU (Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana), um valor referente ao impacto ambiental causado por um imóvel que se reflita em diminuição ou aumento do IPTU. O debate já é antigo no município, mas ganhou destaque neste ano porque a prefeitura está revendo os valores da PGV.
As equipes envolvidas com a mudança na PGV já enviaram suas sugestões para a Câmara Municipal. “Eles estão avaliando como proceder para incluir como uma nova lei a partir de 2006”, explica o autor da carta, Eduardo Mario Mendiondo, membro do Comdema e coordenador do Núcleo Integrado de Bacias Hidrográficas (NIBH) da USP de São Carlos. Na opinião dele, o efeito "impacto ambiental" deveria ser considerado de forma imediata para as novas construções e gradativa para os imóveis antigos ou já consolidados em planta na prefeitura.
Eduardo Mendiondo ainda espera candidatar a São Carlos a receber contrapartidas de mercados ambientais, como por exemplo, o mercado de carbono, realizando o que chama de urbanização inteligente. De acordo com ele, o passivo ambiental de São Carlos gira em torno de R$ 2 a 3 bilhões hoje. A idéia é que, em 2020, ocorra uma diminuição de 50% da dívida ambiental do município com as potenciais contrapartidas de mercados ambientais que aderirem a um projeto de urbanização inteligente.
A população pode diminuir os impactos ambientais gerados em seu imóvel aplicando às construções dispositivos de detenção e/ou retenção de água pluvial do lote, fazendo um reaproveitamento da água e evitando inundações. “O proprietário do imóvel, além de reaproveitar a água, tem a possibilidade de reduzir a poluição difusa que acaba agravando o problema de entupimento de bueiros e bocas de lobo. Reduz também o transporte de substâncias contaminantes”, explica Mendiondo. A água, sugere ele, pode ser reaproveitada para usos não potáveis, como lavagem de calçadas e quintais, irrigação em jardins, hortas domiciliares ou para dar descarga nos vasos sanitários do banheiro, como já é feito na cidade de São Paulo. “Os dispositivos para essas medidas são objeto de constante pesquisa nas universidades e sua execução pode ser feita com mão-de-obra comum, junto com o acompanhamento de um técnico da área”, completa ele.
Iniciativas Mundiais - A descentralização de ações no combate aos prejuízos causados ao meio ambiente também foi tema de discussão da Conferência Mundial de Lideranças Municipais sobre Mudanças Climáticas, ocorrida em Londres no início de outubro. O encontro reuniu mais de 20 representantes de diferentes cidades do mundo, que trocaram experiências bem sucedidas na tomada de medidas para reduzir os danos ambientais em escala municipal.
A carta de São Carlos se baseia em dados da Avaliação Ecossistêmica do Milênio, iniciativa que reuniu 1360 especialistas de 95 países que, entre 2000 e 2005, a pedido do secretário-geral da ONU Kofi Annan, estudou futuros cenários ambientais até o ano 2100. Assim, segundo o documento, o município estaria mais preparado para enfrentar a penúria ambiental que marcará a próxima década (2010 a 2020), porque a maioria das prefeituras não terá investido o suficiente em projetos relativos à preservação ambiental entre os anos de 2005 e 2020.
(ComCiência, 13/03/06)