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2006-03-08
Os usos da terra para o plantio de grandes lavouras de soja, para pastagem de rebanhos de gado, as queimadas no Sul da Amazônia, entre outros fatores, promovem o aumento da emissão de gases de efeito estufa na atmosfera. A maior concentração desses gases na atmosfera está contribuindo para a elevação da temperatura média do planeta, o que pode estar causando mudanças no clima em várias regiões. O inventário das emissões de gases-estufa do país demonstra que a maior parte das emissões de gás carbônico (CO2), um dos principais gases responsáveis pelo aquecimento anormal da atmosfera, vem do desmatamento na Amazônia.

Localmente, os usos da terra modificam as propriedades da superfície (refletividade, cobertura do solo, transferência de água para atmosfera, absorção de carbono etc). Essas alterações afetam diretamente a quantidade de energia disponível aos processos biofísicos e biogeoquímicos (aquecimento do ar, transpiração das plantas, fluxo de carbono etc), a distribuição da água no solo (umidade do solo, lençol freático, drenagem para os igarapés e rios, etc.) e, conseqüentemente, o funcionamento dos ecossistemas.

Então, quais os possíveis impactos que mudanças climáticas globais podem promover na região? Há possibilidades de transformações do ecossistema no bioma amazônico? E como os usos da terra podem contribuir para o agravamento destes impactos? Essas perguntas serão respondidas pelo Núcleo de Modelagem Climática e Ambiental do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (NMCA/Inpa). O objetivo é entender o funcionamento do conjunto clima-ecossistema no presente e investigar os impactos sobre o clima da Amazônia no futuro. O núcleo é o primeiro da região Norte e tem como meta principal realizar pesquisas sobre as questões da Amazônia e contará com a colaboração de grupos de pesquisas, especialistas e instituições de todo o País e também do exterior.

No NMCA foram investidos, somente em equipamentos, aproximadamente R$ 600 mil para a compra de supercomputadores, além da infra-estrutura que foi montada para receber os aparelhos na sede do projeto Larga Escala da Biosfera Atmosfera da Amazônia (LBA). Dois tipos de sistemas foram adquiridos com previsão de instalação até final de março. O primeiro, é um de arquitetura vetorial que permite a realização de cerca de 16 bilhões de cálculos por segundo, ideal para simular o clima global e testar as hipóteses de mudanças. O segundo, tem uma arquitetura idêntica aos dos computadores pessoais reunidos num sistema de comunicação entre vários processadores, configurando o que tecnicamente se chama “cluster”.

O pesquisador Luiz Antônio Cândido, da Coordenação de Pesquisa em Clima e Recursos Hídricos (CPCRH), explicou que o sistema vetorial é um NEC-SX semelhante ao utilizado pelo Centro de Previsão do Tempo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/Inpe). “O CPTEC utiliza o NEC SX-6 com 64 processadores de 8Gflops enquanto o nosso é o NEC SX-8 com um único processador de 16Gflops”, afirmou.

Segundo ele, a função do núcleo é estabelecer um pólo regional para pesquisar a biosfera e sua importância para o clima, a partir do entendimento da interação da floresta amazônica com a atmosfera, tendo como ferramenta a modelagem numérica (matemática) dos processos. Cândido explicou que a modelagem é a representação matemática da realidade por meio de códigos de computadores que utilizam linguagem de programação. “Os modelos climáticos representam de forma aproximada o comportamento da atmosfera e do oceano”.

De acordo com o pesquisador, os trabalhos do núcleo de modelagem terão dois focos. O primeiro, apoiado nas medidas feitas pelo LBA e nos dados coletados durante os últimos cinco anos de pesquisas na região. “A idéia é compilar essas informações de forma que possa ser aplicada no entendimento da interação entre a biosfera e atmosfera visando o desenvolvimento dos modelos climáticos. Sempre ligadas às linhas de pesquisa do grupo”, destacou, acrescentando que outros parâmetros também serão fundamentais para compor os modelos, como: hidrologia; água no solo; os níveis do lençol freático, entre outros.

O segundo, são as mudanças climáticas globais. Cândido ressalta que, quando considerado esses fatores, é preciso unir a biosfera (sobre o continente), os oceanos (correntes oceânicas, variação de temperatura das águas do mar), a atmosfera (o ar que escoa sobre as superfícies) e as regiões geladas (criosfera), ligando-as umas as outras. Essa aglutinação acontece por meio dos cálculos matemáticos utilizados na modelagem climática. “É fundamental a análise de diferentes componentes de nosso sistema climático. Cada componente tem sua função específica e, ao mesmo tempo, se comunicam entre si”, afirmou.

Ele explicou que o continente comunica-se com o oceano por meio das águas dos rios (vazão). Da mesma forma, o continente transfere a água de sua superfície para atmosfera por meio do ar e dos ventos até chegarem também aos oceanos. “Tudo está interligado. Por isso é tão complicado simular os processos”, ressaltou. Cândido destacou que o papel dos pesquisadores é fazer as análises dos dados para entender como os processos respondem às mudanças climáticas e como um depende do outro.

A compreensão mais detalhada do funcionamento dos processos climáticos serve para “melhorar” os modelos matemáticos. Para isso, são feitos testes com os modelos para averiguar o funcionamento dos mesmos comparando-os com os dados obtidos na natureza. Ou seja, o quanto ele representa do que foi observado pelos pesquisadores em campo. Caso sejam verificados erros nos cálculos computacionais, avalia-se a porcentagem de erros e é feita a correção ou o melhoramento do modelo. “Queremos tornar os modelos matemáticos os mais confiáveis possíveis para entender a interação entre a biosfera e a atmosfera”, informou.

Cândido afirmou que os modelos são as principais ferramentas utilizadas para desenvolver estudos de cenários climáticos, como, desmatamento, usos da terra, e concentração de gases do efeito estufa na atmosfera, etc. Isso porque quando um dos cenários é modificado altera todos os sistemas. Dessa forma, é possível simular o que pode acontecer no futuro ou como era a Amazônia há mil anos. “A modelagem tem esse papel. É possível prever o tempo, cheias, secas, índice de água no solo para a irrigação de lavoura etc. Tudo isso pode ser feito desde que se conheça o ambiente”, frisou. No futuro, o NMCA estará dotado de modelos totalmente integrados que associam além da atmosfera, oceanos e criosfera, que incluirão também modelos de dinâmica da vegetação, de química da atmosfera, de hidrologia e química da água.

Centros de Pesquisa – No Amazonas poucos são as instituições que trabalham com modelos climáticos, porém diferentes dos que serão utilizados pelo Inpa. O pesquisador Luiz Cândido explicou que, mesmo com essa diferença, o enfoque é semelhante, ou seja, entender e fundamentar a compreensão sobre a Amazônia. Ele disse que a Universidade Federal do Pará (UFPA) é uma dessas instituições. “Os pesquisadores de lá utilizam os modelos de alta resolução para investigar os impactos no clima local associado ao uso da terra. Pesquisas utilizando modelos de dinâmica de desmatamento são feitas em outro setor no Inpa”, destacou.

Ele explicou que para prever a dinâmica das relações de uso da terra são feitas estatísticas a partir da ocupação do espaço geográfico e o conseqüente desmatamento, entre outras variantes. Um exemplo é quando se abre uma estrada. A tendência é que nos arredores as pessoas passem a desmatar. Os modelos de dinâmica de desmatamento adotam esses tipos de padrões. “Os seus resultados auxiliam na geração de cenários de usos da terra para aplicação nos modelos climáticos”, afirmou.
(INPA - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, 05/03/06)

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