Clima: Existe vida depois de Kyoto
2006-03-06
Uma rede de organizações não-governamentais, multilaterais e jornalísticas convocaram um diálogo entre parlamentares,
empresários e ativistas para se chegar a um acordo sobre mudança climática para entrar em vigor em 2012, quando expirar o
Protocolo de Kyoto. Não parece muito cedo para iniciar tal deliberação. O Protocolo origina grandes dúvidas mesmo faltando três
anos para começar seu primeiro período de implementação, entre 2008 e 2012. O tratado assinado na cidade japonesa de Kyoto em
dezembro de 1997 obriga os países industrializados a reduzirem nesses cinco anos suas emissões de gases causadores do efeito
estufa 5,2% em relação a 1990. A maioria dos cientistas atribui o acelerado aquecimento do planeta a esses gases.
Mas o país que libera a maior quantidade de tais gases do planeta – a quarta parte do total – os Estados Unidos, em 2001 retiraram
sua assinatura do documento, o qual, por outro lado, não obriga a nenhuma redução nas emissões por parte de países em fases de
industrialização, como Brasil, China, Índia e México. Na reunião do Grupo dos Oito países mais poderosos do mundo em julho
passado, o anfitrião e primeiro-ministro da Grã-Bretanha, Tony Blair, disse que o acordo de Kyoto tem escasso significado se os
países deixados como exceção não se comprometem a reduzir suas emissões.
O diálogo anunciado na última sexta-feira, em Londres, tem a intenção de reduzir, com vistas a 2012, as diferenças que afloraram
entre os sete países do G8 signatários do Protocolo de Kyoto e as nações em desenvolvimento por causa das declarações de Blair.
A rodada de diálogos de três anos foi lançada pela COM+ - como é conhecida a Aliança de Comunicadores para o Desenvolvimento
Sustentável -, rede de mídia comprometida com a informação sobre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da Organização das
Nações Unidas, e a Organização Mundial de Legisladores para um Ambiente Equilibrado (Globe) – rede de parlamentares de todo o
mundo.
Entre os integrantes da COM+ figuram o Trust Service Mundial da BBC, Banco Mundial, Fundação Reuters, União Mundial para a
Natureza (IUCN) e a Inter Press Service (IPS). O diálogo reunirá legisladores dos países do G8 e do Brasil, México, Índia, China,
África do Sul, Espanha e Austrália, bem como empresários e dirigentes da sociedade civil “para gerar um entendimento dos cenários
para além de Kyoto e para discutir um acordo sobre mudança climática rumo a 2012”. Vários legisladores norte-americanos se
mostram dispostos a unirem-se ao processo. “Houve um considerável interesse nos Estados Unidos e vários legisladores se unirão a
nós em uma reunião em Washington”, disse a parlamentar britânica Joan Ruddock.
A maioria dos cientistas concorda que o aquecimento do planeta obedece a atividades humanas, sobretudo a gases como o dióxido
de carbono e o metano, liberados pela queima de petróleo, gás e carvão em processos industriais, de transporte e calefação. O
Protocolo de Kyoto entende que os países industrializados, ao emitirem a maior parte desses gases, têm a principal
responsabilidade para reverter o problema. A iniciativa de diálogo inclui os Estados Unidos, nação que se tentará incluir, junto com os
países em rápida industrialização, no futuro acordo. As reduções de emissões dos países industrializados servirão de pouco se as
nações em desenvolvimento não fizerem o mesmo, disse a secretária britânica para o Meio Ambiente, Alimentação e Assuntos
Rurais, Margareth Beckett.
O Norte industrializado reconhece as necessidades dos países em desenvolvimento também o princípio comum de responsabilidades
diferenciadas, contemplado no Protocolo de Kyoto, mas deve-se encontrar um modo de “minimizar o impacto de seu crescimento na
mudança climática’, afirmou Beckett. “Nos próximos 20 ou 30 anos as emissões dos países em desenvolvimento excederão as do
mundo desenvolvido”, disse o vice-presidente do Banco Mundial, Ian Johnson, ao fundamentar a necessidade de novo diálogo.
Algumas das opções em consideração são a transferência de tecnologia e o desenvolvimento de uma nova geração de equipamentos
para a produção de energia, afirmou Johnson. O Banco Mundial já financia o uso de fontes renováveis, mas o desafio é cada vez
maior, acrescentou.
Blair, acusado por ambientalistas de se alinhar com o presidente George W. Bush com seu discurso de julho, aplaudiu a nova
iniciativa. O primeiro-ministro manteve a Grã-Bretanha entre os signatários do Protocolo, mas anunciou que não aceitará uma
solução semelhante para depois de 2012. “Os legisladores têm um papel-chave na conscientização, no incentivo do debate e,
naturalmente, no chamado à responsabilidade de seus governantes”, afirmou Blair em uma mensagem enviada por ocasião do
lançamento da iniciativa. De todo modo, acrescentou, os países do G8 devem manter um papel de liderança em matéria de mudança
climática.
“Nossas economias e sociedades ainda são as maiores responsáveis pelo aumento dos gases que causam o efeito estufa. Devemos
tomar decisões urgentes para reduzir o dano que estamos causando. Também temos o poder econômico e a capacidade de
pesquisa necessários para alcançar as soluções tecnológicas necessárias”, acrescentou Blair. O temor é que o custo de tais
tecnologias aumente o preço dos produtos industriais no mundo em desenvolvimento e que o G8 não dê o financiamento necessário
para equilibrar o campo de jogo.
(IPS/Envolverde, 03/03/06)
http://www.jornaldomeioambiente.com.br/JMA-index_noticias.asp?id=9526