Pesquisadores encontram novo tipo de formação no cerrado
2006-03-06
Pesquisadores do Departamento de Botânica da Universidade Federal de São Carlos promoveram a compilação de mais de 600 espécies de plantas no Parque Nacional das Emas e relataram a existência de um novo tipo de cerrado – o hiperestacional
O cerrado é considerado a maior região de savana nas Américas. Ocupou originalmente cerca de 23% do território brasileiro e mais de 90% do Planalto Central. Hoje, porém, mais da metade desse tipo de vegetação já foi desmatado ou transformado pela ação humana. Essa rápida diminuição é seguida pela perda da diversidade de espécies que compõem o cerrado, cujo número, apenas para as plantas, pode chegar a mais de 7 mil espécies. Para Marco Antônio Batalha, pesquisador da Ufscar, apesar de sua importância ecológica, o cerrado continua sendo um tipo de vegetação pouco valorizado.
O biólogo é responsável pela elaboração e coordenação de diversas pesquisas realizadas no Parque Nacional das Emas (PNE), localizado no Planalto Central Brasileiro e onde já foram catalogadas mais de 600 espécies vegetais, algumas delas ainda não descritas para a ciência. Além de realizar a compilação de dados das espécies vegetais do PNE, corrigindo algumas classificações e acrescentando novas espécies, o grupo coordenado por Batalha, descobriu um novo tipo de vegetação - encontrada, por enquanto, com exclusividade no PNE - o cerrado hiperestacional.
O PNE possui cerca de 130 mil hectares e foi considerado pela Conservação Internacional uma das áreas criticamente prioritárias para a conservação do cerrado. Criado por decreto nacional em 1961, o Parque Nacional das Emas recebeu esse nome por causa do grande número de emas (Rhea americana) que habitam seu interior. Representa atualmente uma das principais reservas de cerrado no Brasil, sendo uma das áreas criticamente prioritárias para a sua conservação.
"O PNE representa um resumo de toda biodiversidade do cerrado brasileiro. Em seu território, já conseguimos identificar cerca de 10% das espécies vegetais presentes no cerrado. Apenas nosso grupo realiza atualmente pesquisas relativas a biodiversidade vegetal dentro do Parque", salientou Batalha. Os estudos envolvem pesquisas de campo - que podem durar mais de 30 dias - e tiveram ou têm o financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e apoio da diretoria do PNE e do Departamento de Botânica da Ufscar.
Para o biólogo, o relato da primeira ocorrência de um cerrado hiperestacional - com aproximadamente 300 hectares e localizado na porção sudoeste do PNE - evidenciou ainda mais a importância do PNE para a conservação da biodiversidade do cerrado. "O cerrado hiperestacional é um tipo de savana que alaga. É interessante do ponto de vista ecológico, porque as plantas nesse ambiente passam por dois momentos grandes de estresse: um na época do verão com o alagamento e outro na época do inverno com aa seca, diminuindo o número de espécies nessa formação vegetal, quando comparada aos cerrados estacionais, que nunca alagam", explicou Batalha.
O pesquisador considera preocupante a falta de valorização do cerrado brasileiro que nas últimas duas décadas passou a ser fortemente ameaçado pela agricultura mecanizada que se instalou nas regiões de cerrado do Planalto Central. "Por meio de técnicas voltadas ao melhoramento do solo, ficou mais fácil à utilização das áreas de cerrado para agricultura intensiva, principalmente para o plantio da soja. Essa é uma das grandes ameaças atuais ao cerrado". Segundo o biólogo, mesmo as Unidades de Conservação e áreas protegidas, que não ocupam mais de 2% da área original do cerrado, acabam sofrendo indiretamente com esse tipo de agricultura, já que os agrotóxicos acabam contaminando as reservas e espécies exóticas acabam invadindo as áreas protegidas.
Os próximos estudos que devem ser iniciados pelos pesquisadores da Ufscar abordarão o conceito de diversidade funcional, que busca analisar a variação de características das plantas que são importantes para o funcionamento da comunidade, como a altura, o tipo de polinizador e a espessura da casca em relação ao regime de queimadas. Esses estudos podem, no futuro, orientar as políticas de queimadas em áreas protegidas do cerrado.
(Envolverde, 03/03/06)