Hidrelétricas - Ibama pede revisão no Rio Madeira
2006-03-06
O estudo de impacto ambiental (EIA) apresentado pela Furnas Centrais Elétricas não foi suficiente para garantir o licenciamento da construção de duas hidrelétricas no Rio Madeira, em Rondônia. Em ofício enviado semana passada à estatal, o Ibama solicita uma série de complementos e adequações ao projeto, que integra um grande pacote de obras anunciado pelo governo para 2006. "O estudo é muito bom em vários aspectos, mas há questões que precisam ser mais bem avaliadas", disse ao Estado o diretor de Licenciamento do Ibama, Luiz Felippe Kunz.
As usinas de Santo Antônio e Jirau deverão alagar uma área de 529 quilômetros quadrados, para produzir 6.450 megawatts - cerca de metade da energia de Itaipu, a maior hidrelétrica do mundo. O complexo, orçado em US$ 4,5 bilhões, é considerado uma das maiores obras de infra-estrutura da Amazônia, ao lado do asfaltamento da BR-163 (Cuiabá-Santarém). Organizações ambientalistas, entretanto, questionam a necessidade e a viabilidade do projeto.
As solicitações do Ibama referem-se a questões técnicas e ambientais. O instituto quer estudos mais detalhados sobre o tamanho da área alagada e a vida útil dos reservatórios, sem a necessidade de dragagem, já que o rio carrega grande volume de sedimentos e matéria orgânica (madeira). "À medida que você tem assoreamento e diminuição da profundidade, pode haver um aumento da área alagada", explica Kunz.
Outra preocupação diz respeito à fauna de peixes do Madeira, que é a principal fonte de proteínas para a população de Porto Velho. Segundo Kunz, a biodiversidade aquática não foi devidamente estudada, especialmente as espécies de fundo. "Precisamos saber exatamente o que existe no rio para ter a dimensão exata do impacto."
O órgão também solicitou mais informações sobre a perda de áreas de lazer e turismo (principalmente praias fluviais), o impacto da elevação do lençol freático sobre os ecossistemas de entorno dos reservatórios, a influência sobre o abastecimento de água de Porto Velho (que poderá ser contaminado por mercúrio de garimpos), o impacto sobre atividades agrícolas abaixo das barragens (que dependem do regime de vazantes) e o remanejamento de populações ribeirinhas. A estimativa é de que mais de 2.800 pessoas deverão ser retiradas das áreas alagadas.
Procurada pelo Estado, Furnas informou que recebeu o ofício do Ibama anteontem e que está avaliando as solicitações. A empresa disse que tem quatro meses para complementar os estudos, mas pretende fornecer os dados muito antes disso.
A solicitação de esclarecimentos e dados adicionais é comum no processo de licenciamento. As revisões do Ibama, entretanto, poderão atrasar os planos de alguns setores do governo, que querem ver o projeto aprovado o mais rápido possível. Para que a licença prévia seja emitida, ainda será preciso realizar uma série de audiências públicas nas regiões afetadas.
A principal bandeira ambiental levantada pelos empreendedores é a utilização de barragens menores e turbinas de última geração, do tipo bulbo, que reduzem a área de alagamento. Os reservatórios menores são compensados pela vazão elevada do Rio Madeira, que garante o funcionamento das turbinas. Segundo Furnas, a área inundada será a mesma do rio nos períodos de maior cheia.
Ambientalistas, entretanto, temem os impactos da obra e contestam a necessidade das usinas. "Não vejo como isso pode sair do papel. É uma maluquice", resume Telma Delgado Monteiro, integrante do GT Energia do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais. "Há informações gravíssimas nesse estudo."
IPUEIRAS
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem no lançamento do Plano Nacional de Recursos Hídricos, em Brasília, que foi "convencido" de que o País não precisa construir a hidrelétrica de Ipueiras, no Tocantins (de 480 megawatts). Lula confirmou a avaliação do Ibama, que considerou o projeto inviável do ponto de vista ambiental.
(O Estado de S. Paulo, 04/03/06)