Energia Renovável - Entrevista com Thomas Renatus Fendel
2006-03-02
Muito se fala na crise ecológica que passa o planeta, e principalmente, no fim dos recursos naturais de origem fóssil. Neste contexto, a produção e a utilização de energia renovável se tornou um dos maiores desafios do novo século. Muitas pesquisas são desenvolvidas nesta área, pois já se sabe que os ganhos ambientais, sociais e econômicos provenientes da utilização de recursos renováveis para geração de energia é muito grande. O engenheiro mecânico Thomas Renatus Fendel é um destes pesquisadores que procura viabilizar projetos utilizando as bioenergias. O polêmico Thomas Fendel defendeu suas idéias para otimizar a produção de energia renováveis no país em entrevista à revista EcoTerra Brasil.
O que se pode definir sobre energias alternativas ou renováveis?
Primeiro vamos corrigir o termo alternativa. Como diz o mestre Bautista Vidal, que é o papa mundial das bioenergias, o brasileiro que inventou o Pro Álcool, as energias que nós chamamos de alternativas são definitivas. Alternativo é o petróleo, que não é renovável. Energias definitivas são as energias renováveis, como a biomassa, vento, sol, etc.
Atualmente se fala muito na utilização do biodiesel como uma opção ecológica de combustíveis, já que incorpora óleos vegetais ao diesel comum. Qual é a sua opinião?
O biodiesel, na minha opinião, é uma forma transitória entre a era fóssil e a era solar das bioenergias. Biodiesel é algo bom, ótimo, mas eu acredito que se pode usar o óleo vegetal natural. Tenho esta convicção. Como exemplo tem o caminhão que estou viajando nesta expedição. Eu esquento o óleo, ele fica mais fluido e queima diretamente no motor. Acho que podem ser desenvolvidos motores para óleo vegetal. Não precisa adaptar o óleo no motor. Deve-se adaptar o motor para o óleo. Com os recursos que a gente tem hoje em dia, acho que se deve partir para isso.
O Brasil desenvolveu e domina a tecnologia do álcool combustível. O que impede a expansão da produção desta e outras energias renováveis?
Eu acho que nós estamos atrasados. A gente já deveria ter deslanchado nestas energias há muito mais tempo. O Brasil deu um exemplo para o mundo com o Pro Álcool, mas infelizmente o brasileiro não deu valor. Agora o mundo todo está apavorado atrás de álcool.
Quais são os benefícios das energias eólica e solar? O custo ainda é alto ou já existem alternativas viáveis?
A energia eólica é uma maravilha. Ainda é um pouco cara, mas em regiões onde tem muito vento já é rentável e vale a pena fazer. O Brasil tem ótimos lugares para produzir energia eólica. A energia solar é a energia radiada pelo sol e que faz crescer os vegetais. Utilizar energia solar através de placas fotovoltaicas é ótimo. Mas placas de energia solar são caras. Então quem tem dinheiro sobrando e quer ser ecológico pode fazer uma instalação desta injetando energia na rede.
O Brasil vive uma crise energética?
Vive porque quer. O nosso potencial de biomassa (energia obtida a partir de estrume de gado, lixo orgânico, restos agrícolas, aparas de madeira ou óleos vegetais) é algumas vezes maior do que as reservas de petróleo da Arábia Saudita.
O senhor tem um projeto sobre aproveitamento da energia elétrica. Como é desenvolvido este trabalho?
Eu tenho um projeto chamado ENERNET, que eu estou mudando o nome para BIOENERREDE. Por exemplo, um hotel precisa de água quente, e o Brasil, terra do chuveiro elétrico, precisa de energia das seis da tarde às nove da noite, no horário de pico. Seria ótimo se os pequenos pudessem gerar energia neste horário. O hotel pode gerar sua energia elétrica com álcool ou com óleo vegetal e aproveitar o calor residual. Isto se chama co-geração. Então, no horário de pico se o hotel gera 50 kwh e gasta 5 kwh, injeta 45 kwh na rede. Se gasta R$ 0,40 por kwh recebe R$ 0,30 de volta. Isto é totalmente automático. Seria justo e todo mundo sairia ganhando.
Muito se fala na utilização do hidrogênio como uma nova forma de energia, com menor custo e em grande quantidade. Existe esta possibilidade?
A questão do hidrogênio é uma palhaçada enorme porque não existe solto na natureza. Ele existe na água, no álcool, nós temos o hidrogênio no corpo, mas para retirar o hidrogênio da água e transformar em combustível, se gasta quatro vezes mais energia nobre, elétrica e cara, do que a energia que você vai obter com o hidrogênio. Sua produção é impossível sem o uso de gás natural, um combustível fóssil. Então é uma coisa sem fundamento. Tem pessoas querendo fazer hidrogênio a partir do álcool. Não é melhor usar o álcool? E além do mais, armazenar hidrogênio é muito complicado. A molécula passa pelo aço. Então para fazer um tanque ele tem que ser em altíssima pressão e é perigoso. O mundo inteiro fala em hidrogênio, mas não se ouve tanto como em alguns anos atrás.
Quais as diferenças entre o gás natural, um combustível fóssil, e o biogás, produzido a partir da decomposição de matéria orgânica?
Dizem que o gás natural é limpo, mas não é tão limpo. É carbono tirado da terra e jogado no ar. As bioenergias são justamente o contrário. Por exemplo, o álcool, óleo vegetal, biogás e carvão vegetal são de atmosfera limpa, porque saem de vegetais, que nada mais são do que gás carbônico seqüestrado do ar através da energia solar, da fotossíntese, da água. As bioenergias fazem o contrário do que fazem os fósseis. O biogás é feito em digestores, em estações de tratamento de esgoto e de lixo. Isso é bioenergia. Realmente as plantas absorvem muito mais carbono do que o carbono que você devolve para a atmosfera. Se nós fizéssemos este marketing, ao invés de efeito estufa com os fósseis, nós poderíamos fazer o efeito geladeira com as bioenergias. Se tivesse marketing do álcool, nenhum brasileiro estaria consumindo gasolina.
Hoje temos no mercado carros bicombustíveis e com o gás natural veicular (GNV). É possível adaptar um motor para funcionar só com óleo vegetal?
Claro, na Alemanha existem mais de vinte mil carros andando a óleo vegetal, locomotivas andando a óleo vegetal. Existia um motor chamado Elko, há uns vinte anos, que inclusive veio aqui para o Brasil, mas não sei por que foi esquecido. Eu acho que nunca um motor vai ter o mesmo rendimento andando com gasolina, com álcool, com gás e com óleo. Um motor feito para funcionar com vários combustíveis não vai ser tão bom quanto aquele motor feito só para um tipo de combustível.
O que é preciso para efetivar a produção do motor movido à óleo vegetal?
É preciso que o povo comece a raciocinar que o petróleo é finito. As guerras do Bush são por causa do petróleo, “para inglês ver”. É estúpido o mundo se sujeitar a isso. Nós estamos no paraíso do mundo. Nós vamos fornecer energia para eles. O mundo não se divide mais em ocidental e oriental. Segundo o meu mestre Bautista Vidal, o mundo se divide nos trópicos. Nós trópicos tem sol, energia solar que produz a biomassa. Nós temos tudo aqui, sabemos fazer computador, fazer programas, tricot, prego, motores, aliás, os melhores motores do mundo são feitos aqui no Brasil.
De quem depende esta mudança na forma de pensar?
Eu acho que tem que partir da mídia. Ela tem que começar a pensar mais e não engolir qualquer coisa. Se a mídia quer eleger um presidente, ele é eleito. A mídia, que é divulgadora, deveria trabalhar melhor os assuntos relevantes.
Como o senhor imagina o futuro do meio ambiente?
Eu vejo que daqui a seis meses o barril do petróleo vai custar U$100. Isto vai dar uma reviravolta, uma conscientização. Acredito que com a crise energética que precede a crise climática, o mundo pode acordar. E espero que os brasileiros acordem e parem de ser “capachos”. Que acordem e percebam o real valor deles. A floresta amazônica, por exemplo, não contribui com a limpeza do ar. A floresta velha não cresce. O ciclo do carbono ali está fechado. O que capta carbono é floresta nova, replantada, de preferência com biodiversidade e várias espécies. O meio ambiente deve ser repensado, reformulado e “remarquetado”.
O que cada brasileiro pode fazer para contribuir?
Exigir comportamentos. A Alemanha é um exemplo de guerra contra a energia nuclear. Os alemães não deixam fazer energia nuclear e estão desmontando todas as suas usinas nucleares no prazo de vinte anos. Já se passaram três, então daqui dezessete anos não vai mais ter energia nuclear na Alemanha. Este é um exemplo fantástico a ser seguido. Lá, mesmo tendo pouco sol, eles plantam, fazem óleo de canola, óleos energéticos. O mundo é das bioenergias. Nós temos que acordar pra isso. Veja a integra da entrevista no link http://www.ecoterrabrasil.com.br/home/index.php?pg=ecoentrevistas&tipo=temas&cd=961
(Eco Terra, 2/3)