O verde da nossa bandeira – Artigo
2006-02-22
Por Karla Aharonian *
Exemplo da Mata Atlântica deve ser sempre um alerta. Quando olhamos a
região amazônica, ficamos perplexos. Mais ainda ao notar a densidade
da floresta e suas inúmeras variações da cor verde, uma das quais
representa nossas florestas na bandeira do Brasil, o verde louro de
nossa flâmula. Para quem caminha na floresta ou a sobrevoa, lê
estatísticas ou vê imagens na TV, os adjetivos recorrentes são: imensa,
fantástica, gigante, incontável, indescritível, infindável...
Infindável?
Ano de Copa do Mundo normalmente é o período em que mais ostentamos as
cores nacionais. Relembro uma imagem estilizada de nossa bandeira, em
que parte do verde é substituída pelo branco, com o slogan: "Estão
tirando o verde da nossa terra". Essa incisiva mensagem foi veiculada
durante anos em adesivos e na mídia pela Fundação SOS Mata Atlântica,
com um histórico de 19 anos de luta ambiental.
A área original da Mata Atlântica se estendia por 17 estados ao longo
da costa, do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul, e ainda
continente adentro nas regiões Sul e Sudeste, indo até a Argentina e o
Paraguai. Provavelmente os colonizadores portugueses em 1500 devem ter
exclamado o mesmo "É infindável!" que usamos hoje em relação à
Amazônia.
A Mata Atlântica, além da pressão dos ciclos do ouro, da
cana-de-açúcar e do café, sofreu veloz processo de industrialização e
urbanização. De uma área original superior a 1,3 milhão de km², restam
hoje apenas 7,3%. Além da perda do patrimônio ambiental e cultural, com
a agressão às florestas, as nascentes secam e chegamos ao grave
problema que preocupa os especialistas: a questão da água.
A Mata Atlântica é hoje uma colcha de retalhos. A Rede Mata Atlântica
congrega 256 ONGs com objetivos similares de preservar e contribuir
para a regeneração do que resta de um dos ecossistemas mais ricos do
mundo, que abriga mamíferos inexistentes em outros ambientes. Serra da
Cantareira e Ilhabela sofrem pressão. Do Nordeste ao Sul do País, em
cada pedaço da Mata o homem age sem se importar com os recursos
naturais, que não são infindáveis.
Na semana passada foi dado importante passo com a aprovação, pelo
Senado, do Projeto de Lei da Mata Atlântica (107/03), que dispõe sobre
a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica.
Volta à Câmara para aprovação das emendas, mas é considerada uma
vitória pelo movimento ambientalista.
Apresentado em 1992 pelo deputado Fábio Feldmann, o PL recebeu 80
emendas e sofreu forte resistência da bancada ruralista. Ele
estabelece incentivos econômicos à produção sustentável. Cria também
estímulos financeiros para restauração de ecossistemas, estimula
doações da iniciativa privada para projetos de conservação,
regulamenta o artigo da Constituição que define a Mata Atlântica como
patrimônio nacional, delimita seu domínio, proíbe o desmatamento de
florestas primárias e cria regras para exploração econômica.
Felizmente o País está tomando providências mais cedo quanto à Floresta
Amazônica. Neste mês o presidente Lula assinou decretos importantes
para a preservação das florestas. A Amazônia passa a ter 45.803.297 de
hectares de Unidades de Conservação. Até 2003 elas se estendiam por
30,7 milhões de hectares.
Foi criado também o 1 Distrito Florestal Sustentável do País. Sua
abrangência é de mais de 16 milhões de hectares, com cerca de 5 milhões
sob manejo florestal. As unidades recém-criadas se dividem em dois
grupos: proteção integral (dois parques nacionais e a ampliação do
Parque Nacional da Amazônia); e uso sustentável (quatro florestas
nacionais e uma área de proteção ambiental).
A área escolhida para a criação do distrito foi definida a partir da
Lei de Gestão de Florestas Públicas, já aprovada pelo Congresso
Nacional e à espera de sanção presidencial. A partir dessa experiência,
o governo planeja criar outros distritos florestais sustentáveis.
Que o exemplo da Mata Atlântica seja sempre um alerta para aqueles que
acham que nossa imensidão verde não tem fim, ou que pode esperar.
* Karla Aharonian é gerente da linha ecológica da EcoLeo, primeira
revenda de madeira certificada da América Latina
(GM, 22/02/06)