Agricultores fazem moção contra barragem no Vale do Ribeira
2006-02-22
Agricultores familiares se reúnem em Cerro Azul, município paranaense do Vale do Ribeira que pode vir a ser o mais impactado pela barragem da usina hidrelétrica de Tijuco Alto, e manifestam sua disposição de resistir ao projeto pretendido pela Companhia Brasileira de Alumínio (CBA).
A barragem de Tijuco Alto é como um fantasma para as famílias de agricultores de Cerro Azul. Todas ali já foram procuradas por emissários da CBA para vender suas terras, e todos os moradores da zona rural do município conhecem vizinhos ou parentes que não resistiram ao assédio da empresa e venderam suas propriedades. Na reunião da última sexta-feira, um comerciante, indignado, perguntava se também seria indenizado, já que toda sua clientela havia vendido suas terras e abandonado a comunidade onde moravam e por isso, há muitos anos, não tinha mais para quem vender. "Infelizmente esse tipo de caso não é considerado como prejudicado direto, e portanto a prática dos empreendedores do setor elétrico não o considera indenizável", explicou o advogado Raul Silva Telles do Valle, do ISA, presente ao encontro.
Entre os participantes da reunião da ultima sexta-feira estavam duas pessoas que já haviam sido impactadas por outras hidrelétricas e que puderam relatar suas experiências. Em ambos os casos, foram expulsos de suas terras sem qualquer tipo de indenização e tiveram de recomeçar sua vida em outro lugar, mais ou menos como ocorreu com todos os meeiros, arrendatários ou posseiros das terras compradas pela CBA no início da década de 1990. Saiba mais sobre o passivo social de Tijuco Alto.
Os lavradores foram informados que o processo de Tijuco Alto continua sob análise do Ibama, e que ainda não há qualquer decisão a respeito da viabilidade ambiental do empreendimento, a qual virá depois da realização das audiências públicas, ainda sem data prevista para ocorrer. Isso significa que eles ainda podem se mobilizar e lutar, já que, ao contrário do que os compradores das terras propagam há mais de uma década, não há qualquer sinalização de que o empreendimento será aprovado.
"Só saio na hora em que a água estiver enchendo"
Sebastião Severiano Lins, morador do bairro do Lajeado Grande há mais de 50 anos, mostrava seu inconformismo com a idéia de construção da barragem. “Agora que a gente se arrumou, que tem transporte passando na porta de casa, que troquei a casa por uma nova, que a produção tá saindo, vem essa história de barragem. Só saio de minha terra na hora em que a água estiver enchendo”.
Sebastião diz que a vida está melhorando para os agricultores de Cerro Azul e não quer a barragem
Um dos pontos fortes do encontro foi a chegada de um ônibus, vindo de Eldorado (SP), repleto de lideranças quilombolas, que há quase vinte anos lutam contra a construção de barragens que inundariam suas terras no Médio Vale do Ribeira. Estavam ali para se juntar na resistência a Tijuco Alto. Os quilombolas relataram sua experiência, recitaram poesias, cantaram músicas de louvor ao Ribeira de Iguape. A reunião, que tivera momentos de grande emoção, terminou com a alegria de que a luta não terminou.
Ao final do encontro, os presentes aprovaram um moção endereçada ao Ibama e às autoridades municipais, estaduais e federais, afirmando que o Brasil precisa de dignidade no campo e não de mais geração de energia para produção de alumínio.
(ISA - Instituto Socioambiental, 20/02/06)