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hidreletricas do rio pelotas hidrelétrica de pai querê
2006-02-02
Quem achava que a usina de Barra Grande no rio Pelotas, divisa dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, tinha servido de lição para evitar problemas futuros, se enganou. O escândalo de um licenciamento fraudulento, tocado sem discussão pública e ignorado pela grande mídia está prestes a se repetir. E as semelhanças são tantas que já imprimem um ar quase kafkiano ao empreendimento, a hidrelétrica de Paiquerê.

O rio é o mesmo, e a nova barragem será construída a poucos quilômetros do lago de Barra Grande. A capacidade de geração e o investimento são parecidos (292 MW e R$ 630 milhões). Assim como o lago formado pela barragem, estimado em seis mil hectares de área inundada entre as cidades de Bom Jesus (RS), e São Joaquim (SC). Mas o mais incrível é que empreendedores (Alcoa, Votorantin e DME), financiadores (BNDES) e até a empresa responsável pelo Estudo de Impacto Ambiental (Engevix) também são os mesmos de Barra Grande.

O projeto vem sendo tratado discretamente pela imprensa. Pequenas notas de colunistas e releases volta e meia ressaltam o vulto da construção, que irá gerar 1,8 mil empregos diretos e o dobro disso em indiretos. Já o movimento ambientalista do Sul elegeu ele como um dos grandes temas para 2006.

Passivo ambiental
O temor dos ambientalistas tem no que se apoiar. O engenheiro florestal da Associação de Preservação do Meio Ambiente do Alto Vale do Itajaí (Apremavi), Philipp Stumpe, lembra um fato ocorrido durante o licenciamento de Barra Grande. Na época, foram contratados técnicos pelo Ministério do Meio Ambiente para verificar se a espécie de bromélia Dyckia distachia ocorria em outros lugares, além da área a ser inundada. Porém, antes que os estudos terminassem, o Ibama concedeu a Licença de Operação (LO). Detalhe: o MMA só ficou sabendo da LO através do anúncio da senadora Ideli Salvatti (PT/SC), comemorando a licença, o que foi divulgado pela imprensa. Depois, apurou-se que a espécie só existia em quatro lugares na natureza, e todos seriam inundados.

E ao que tudo indica o projeto de Paiquerê vai no mesmo caminho. No fim de agosto do ano passado, o biólogo e professor da Ufrgs, Paulo Brack, comandou uma expedição independente na região de Paiquerê. Com ele estavam as ONGs Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (Inga) e Núcleo Amigos da Terra (NAT). A equipe confirmou que o estudo fitossociológico – informações quantitativas de vegetação – do EIA-Rima da usina tinha falhas grotescas. Ele aponta somente 22 espécies de árvores, o que para uma Floresta Ombrófila Mista – ou Mata Araucária – é "absolutamente inverossímil".

Além disso, 16 destas espécies foram identificadas incorretamente: cinco não são identificadas e 11 são citadas apenas pelo gênero. “A identificação apenas pelo gênero, sem citar a espécie, não ajuda em nada os especialistas da botânica. Essa falta de detalhamento só prejudica”, afirma o doutorando de Ecologia da Ufrgs, Eduardo Forneck, que participou da viagem.

O EIA-Rima “pobre e tendencioso”, como classifica Brack, também omite danos à fauna. Além dos pumas às vezes vistos por moradores da região, há a chance de outros animais, como catetos (mais conhecidos como porcos do mato), jaguatiricas e urubus-rei terem escolhido o local para se refugiarem das águas de Barra Grande. “Se a usina for construída, esses animais serão extintos na região”, lamenta. Os peixes são ainda o caso mais problemático. Os ovos do dourado, presente nas águas do Pelotas, precisam de água corrente para se manter na superfície. “No momento em que a água pára, eles afundam e morrem”, esclarece o biólogo.

Brack alerta ainda que os EIA-Rimas são feitos por empresas paulistas e cariocas, orientados pelo Ibama, que se baseia na legislação federal, não levando em conta as listas estaduais de fauna e flora ameaçadas. “É uma desconexão total. Isso acontece porque ninguém está querendo se comprometer. Um exemplo é o Consema - Conselho Estadual do Meio Ambiente, que já declarou não se meter em obras interestaduais”, afirma.

Conforme o “Segundo Relatório Nacional para a Convenção sobre Diversidade Biológica”, datado de 2004, a área de Paiquerê é considerada um habitat importantíssimo, prioritário para a conservação da Mata Atlântica. O Rio Pelotas, da mesma forma, é área de extremo valor. “Estão querendo acabar com o último remanescente desse tipo de vegetação no Sul do Brasil. O local é único. É uma zona de transição entre dois tipos de floresta que fazem parte da Mata Atlântica, e nesses locais ocorre uma grande troca de genes, fundamental para a manutenção da diversidade. Destruíram Barra Grande. Paiquerê é a próxima etapa”, acredita Philipp Stumpe.

Contradição oficial
Pelo que apurou a reportagem do Ambiente JÁ, a forma como o processo de Paiquerê vem sendo conduzido justifica a preocupação dos ecologistas. O licenciamento da usina é federal, realizado pelo Instituto Brasileiro de Recursos Renováveis (Ibama), que pede os pareceres dos órgãos estaduais. A Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (Fatma) já deu sinal positivo, embora a decisão seja baseada em argumentos pouco esclarecidos. Os funcionários da Fatma alegam que somente uma pessoa em toda a autarquia sabe se houve ou não um parecer, e “nada foi encontrado nos arquivos da entidade”. O celular desse único funcionário estava desligado em diversas tentativas de contato.

Já a Fepam (RS) mostra-se contrária, baseada, em grande parte, no Comitê da Mata Atlântica (que afirma ser, ali, um corredor da biodiversidade). Um parecer técnico do órgão gaúcho alega ainda que a região tem uma baixa eficiência energética (potência/área), “se comparado com outros aproveitamentos do mesmo porte em regiões similares, como a UHE Castro Alves (130 Mw e 140 he) e Monte Claro (130 Mw e 140 he), todas projetadas para o Complexo Hidrelétrico Rio das Antas.

Crítica empreendedora
Os empreendedores mantém uma abordagem reservada do assunto. A única que aceitou dar uma entrevista sobre Paiquerê foi a DME Energética, sócia minoritária no projeto (4,5%). Seu diretor, Ronaldo Garcia, explica que parte da energia (o total de 8.397 Mw) será usada para abastecer a cidade de Poços de Caldas (MG). O excedente será vendido. Outras informações como postos de trabalho ou investimentos não são divulgados pela DME, pois o diretor entende que dados do tipo devem ser divulgados pela acionista majoritária, a Votorantim. “Ela que responda por essas questões”, afirma.

Sobre os possíveis erros encontrados no EIA-Rima, Garcia é enfático: “Somos suspeitos porque estamos do outro lado. Não sabemos das irregularidades, nem estamos a par disso porque ganhamos a energia de órgãos ambientais. Acreditamos que eles ajam com seriedade", frisa ele, aproveitando para criticar alguns ambientalistas. “Eles [ambientalistas] querem aparecer, estar na televisão. Disseram o mesmo sobre outros empreendimentos nossos e nunca provaram nada”, ataca.

A assessoria de imprensa da Alcoa, a CDI-Agência de Comunicação não quis responder nenhuma pergunta por telefone. Solicitou um e-mail explicando “exatamente o que se queria”. Na resposta “digital”, pediu maiores especificações sobre a matéria e, em outra ligação, se falaríamos com ambientalistas. Após uma semana aguardando retorno, a assessoria respondeu que a empresa não tinha como atender a reportagem e limitou-se a enviar uma mensagem com dados técnicos do empreendimento.

Mais ou menos o mesmo ocorreu com a Votorantim, sócia majoritária com 80,1% do empreendimento. A assessoria da empresa também limitou-se a pedir um e-mail para “averiguar” melhor quem poderia falar sobre a questão. Nunca houve resposta à pauta enviada no dia 26 de Janeiro. Após novo contato telefônico com a assessoria foi informado que o responsável, Otávio Carneiro de Rezende, diretor da Votorantim Energia (administradora do empreendimento) estava em viagem e que ninguém mais poderia falar sobre o assunto na empresa.

Processo em andamento
O diretor de contratos da Engevix, Silvano Custódio, afirmou que a empresa “nada tem a comentar sobre possíveis especulações” a respeito do EIA-Rima, já que o licenciamento encontra-se ainda em andamento. “Qualquer dúvida ou estudos adicionais sobre este processo que venha a ser solicitado pelos orgãos oficiais, a Engevix atenderá prontamente com os devidos esclarecimentos ou estudos complementares”, garante ele.

Atualmente o processo de licenciamento está dependendo do Ministério de Minas e Energia (MME). Segundo analistas só falta a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão do MME, terminar a Avaliação Ambiental Integrada da Bacia do Rio Uruguai para a hidrelétrica de Paiquerê começar a ser construída. O final da Avaliação, iniciada em dezembro de 2004 está previsto para julho deste ano.

A posição dos ambientalistas, nesse caso, não é fácil, como relata Vicente Medaglia, do Inga. “É complicado criticar esses empreendimentos, pois estamos criticando, na verdade, o modelo não apenas energético, mas econômico global. Somos um lado muito frágil”, afirma. O Inga está em uma campanha a fim de conseguir financiamento para outra expedição, já que acreditam haver outras espécies endêmicas. “Visitamos pontos bem específicos do lugar, mas precisaríamos fazer um levantamento ainda mais completo”, afirma o ecologista.

Os ambientalistas temem que o parecer da Fepam possa mudar, em função da pressão política imposta pelos governos estaduais. “Santa Catarina já conseguiu da Fatma (Fundação do Meio Ambiente) uma resposta positiva. O governo catarinense, inclusive, já enviou ofícios para o Rio Grande do Sul solicitando maior empenho dos gaúchos na obtenção de um parecer favorável da Fepam”, conta o professor da Ufrgs, Paulo Brack. Para ele, trata-se de um reflexo das governanças de hoje: muito preocupadas com a economia e de costas para o ambiente. “Estamos lidando com uma visão de mais de 30 anos, onde primeiro se deve criar desenvolvimento econômico e depois preservar a natureza, como se as coisas não andassem juntas”, lamenta.
Por Patrícia Benvenuti

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