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2006-02-02
Como se os anfíbios da mata atlântica já não tivessem problemas suficientes, o fungo que está sendo considerado um dos principais responsáveis pelo desaparecimento de muitas espécies do grupo acaba de ser identificado em várias áreas do ecossistema mais ameaçado do Brasil.

Os dados, levantados por pesquisadores do Brasil e da Costa Rica ao analisar exemplares de sapos, rãs e pererecas preservados em museus, indicam que pelo menos cinco espécies da mata atlântica já estão contaminadas pelo fungo parasita Batrachochytrium dendrobatidis.

Embora peça cautela ao interpretar os resultados, Ana Carolina Carnaval, pesquisadora da Universidade da Califórnia em Berkeley que coordena o estudo, diz que se trata de "um alerta, um sinal amarelo". A urgência pode ser ainda maior quando se leva em conta que parece haver uma correlação entre o aquecimento global e a expansão do fungo pelo mundo. "Os dados disponíveis no Brasil são condizentes com a idéia da interação fungo-clima levando a declínios populacionais, ainda que não a comprovem", diz ela.

Há outros motivos para preocupação além da mera presença do parasita, que só foi achado no país pela primeira vez no ano passado, em Camanducaia (MG). Os espécimes infectados vieram de lugares tão distantes quando Pernambuco e o litoral de São Paulo e dos mais variados relevos, do nível do mar até montanhas com 2.400 m de altura. Portanto, podem ser apenas a ponta do iceberg --e isso num ecossistema que já perdeu 93% da área original e no qual 60% das mais de 450 espécies de anfíbios são endêmicas, ou seja, só podem ser achadas ali.

Quem procura acha
Carnaval conta que os resultados não a surpreenderam. Até então faltava um esforço para identificar o fungo no país, mesmo porque ele é um tema relativamente novo de pesquisa. "No ano passado, um herpetólogo [especialista em anfíbios e répteis] equatoriano, Santiago Ron, usou as características climáticas dos locais onde havia o fungo para prever sua ocorrência em áreas até então não estudadas. E a probabilidade resultou alta para toda a mata atlântica. Esse trabalho foi o empurrão que faltava para a gente", diz.

A equipe, que inclui também Vanessa Verdade e Miguel Rodrigues, da USP, Oswaldo Peixoto, da Universidade Federal Rural do Rio, e Robert Puschendorf, da Universidade da Costa Rica, examinou a pele de 96 exemplares de museu, pertencentes a 25 espécies, em busca de anormalidades ligadas à infecção. O método é menos preciso do que uma análise de DNA, por exemplo, o que significa que mais animais poderiam estar contaminados.

Outro dado sombrio: o primeiro registro de contaminação entre os espécimes de museu, de 1981, coincide com as primeiras quedas populacionais entre anfíbios no Brasil, as quais também estão ligadas a anomalias climáticas. Ainda é cedo para dizer o que isso significa, segundo a pesquisadora.

J. Alan Pounds, pesquisador que apresentou há duas semanas indícios ligando o aquecimento global à expansão do fungo, comemorou a pesquisa de Carnaval e seus colegas. "É um trabalho muito bom", diz Pounds, da Reserva de Floresta Tropical de Altitude de Monteverde, na Costa Rica. Já Reuber Brandão, biólogo do Ibama, diz que os resultados preocupam. "Eles podem até representar uma mudança na postura com que o tema dos anfíbios ameaçados vinha sendo tratado pelos herpetólogos brasileiros."

Os cientistas, conta, andaram rebatendo estimativas altas de espécies sob risco no país. "Esse trabalho da Ana mostra que, embora não tenhamos certeza sobre riscos imediatos de declínio, os anfíbios brasileiros estão mais ameaçados do que se imaginava."

"É um motivo premente para investir em conservação e pesquisa", afirma Carnaval. "Como precaução, eu colocaria todas as minhas fichas na proteção do que resta da mata atlântica. Nossos resultados só reforçam essa mensagem e mostram que a situação pode ser mais complicada do que imaginávamos até agora", diz a pesquisadora de Berkeley.
(Folha de S.Paulo, 01/02) Pesquisadores e movimentos sociais alertam para risco ambiental de hidrelétricas no Rio Madeira Nove técnicos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) seguiram de Brasília para Porto Velho. Eles vão realizar vistorias de campo para análise do estudo de impacto ambiental e do relatório de impacto ambiental (EIA-Rima) da construção de duas usinas hidrelétricas no Rio Madeira.

A assessoria de imprensa do Ibama informou que o trabalho começou ontem (1º/02) e deve ir até sábado (04/01). Em Rondônia, os técnicos deverão ouvir queixas e alertas de pesquisadores e de representantes de organizações não-governamentais (ONGs) e movimentos sociais preocupados com as consequências socioambientais que as duas barragens e a viabilização da hidrovia do Rio Madeira trarão à região.

Segundo o professor da Universidade Federal de Rondônia Artur Moret, doutor em planejamento energético pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o Eia-Rima apresentado ao Ibama por Furnas Centrais Elétricas está incompleto. "Não está sendo considerada uma visão de bacia hidrográfica mais abrangente, que deveria pegar todo o estado de Rondônia e uma parte do Amazonas, além de outros países que também têm interferências no Rio Madeira", afirmou.

Moret explicou que quem faz o estudo de impacto ambiental é a empresa que propôs a obra – ao Ibama cabe analisar o estudo e conduzir o processo de participação da sociedade, por meio de consultas públicas. "Se depois outra empresa vencer a licitação, ela paga à empresa proponente os custos de realização do EIA-Rima", acrescentou.

As consultas públicas para discussão do empreendimento hidrelétrico no Rio Madeira estão previstas para abril. Para Moret, a data é "extremamente precipitada".

As duas usinas que deverão ser construídas no Rio Madeira já têm nome: Santo Antônio e Jirau. Elas distam, respectivamente, 6 e 130 quilômetros de Porto Velho. Terão potencial para gerar 6,45 mil megawatts de energia elétrica. Além disso, sua construção viabilizará a hidrovia do rio Madeira, que permitirá o escoamento da soja de Mato Grosso para a Bolívia e o Peru. As obras devem durar de oito a dez anos.

"A hidrovia vai trazer empresários da soja e da madeira para nosso corredor ecológico [mosaico de terras indígenas e unidades de conservação]", lamentou Ivaneide Cardozo, conselheira da associação Canindé, uma entidade ambientalista de Porto Velho. "Não adianta dizer que vai dar indenização e reassentar os ribeirinhos, porque o dinheiro acaba e eles dependem da pesca para viver", completou. Segundo estimativas do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), aproximadamente 2 mil famílias terão as terras alagadas pela construção das duas barragens.

Já o secretário estadual de Desenvolvimento Ambiental de Rondônia, Augustinho Pastores, classificou de "insignificantes" os impactos ambientais do empreendimento, em relação aos benefícios que trará para Rondônia. "Teremos oportunidade de atrair indústrias grandes e poderemos exportar energia", comentou.

Abastecimento dágua em Porto Velho pode ser afetado
A construção das usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, podem afetar o fornecimento de água tratada à capital de Rondônia, Porto Velho. "A captação de água potável é feita após as barragens. E o rio mais próximo, Candeiras, está contaminado pelo garimpo de Bom Futuro", afirmou na terça-feira o professor da Universidade Federal de Rondônia e doutor em Planejamento Energético pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Artur Moret.

"Os outros rios do entorno são menores e não têm fluxo suficiente durante o período de seca", disse ele. Segundo o coordenador técnico-operacional da Companhia de Águas e Esgotos de Rondônia, Vagner Zacarini, o reservatório que abastece Porto Velho fica no Rio Madeira, a menos de 500 metros do local onde deverá ser feita a barragem de Santo Antônio.

"Já formalizamos a Furnas [Furnas Centrais Elétricas, empresa proponente do empreendimento] o pedido de que financiem as obras necessárias para que a captação de água seja feita no próprio lago formado pela barragem", informou Zacarini.

De acordo com ele, a expectativa é que essa água seja mais pura, graças ao processo de decantação provocado pela barragem. "O Rio Madeira tem muito material em suspensão, que iria para o fundo, mas ainda é prematuro afirmar isso".

O reservatório em questão fornece água a 60% dos habitantes da capital – ou 228 mil pessoas, do total de 380 moradores estimados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). "É bom lembrar que a cidade de Porto Velho, que terá sua população aumentada em pelo menos 50%, com a vinda de trabalhadores atraídos pelos empregos gerados durante o período de construção das hidrelétricas", ressaltou Moret.
(Agência Brasil, 31/01/0)

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