Mercado de carbono deve movimentar US$ 30 bi por ano ate 2012
2006-02-02
Novidades como os mercados para negociação de créditos de carbono e os índices
que medem eficiência no quesito desenvolvimento sustentável têm levado as
maiores empresas do Brasil a incluir ações ambientais em seu planejamento
estratégico.
O mercado de carbono, filhote do Protocolo de Kyoto, deve movimentar US$ 30
bilhões por ano até 2012, e o Brasil já abocanhou uma fatia significativa
desse filão: 13% de todos os projetos negociados entre janeiro de 2004 e abril
de 2005 são do país, segundo o Banco Mundial.
Por meio dos chamados Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDLs), os países
desenvolvidos — que têm que reduzir em 5% as emissões de gases causadores do
efeito estufa até 2012 — podem comprar créditos de carbono de países do
chamado Anexo II (pobres e em desenvolvimento), que não têm metas de redução.
Esses créditos são debitados na conta das emissões a serem reduzidas pelos
países ricos.
Até o fim de 2005, o Brasil liderava a lista de países com projetos de MDL em
andamento. Agora, o país tem 86 propostas em fase de análise ou já aprovadas e
encaminhadas ao Conselho Executivo de MDL, em Bonn, na Alemanha. No total,
esses projetos prometem uma redução de 134,2 milhões de toneladas de gás
carbônico. Eles podem receber até US$ 1,207 bilhão, com o preço da tonelada de
carbono em torno de US$ 9. E a cotação está subindo: nos últimos três meses,
houve uma valorização de 28%. A tendência é de que as cifras continuem
crescendo.
“Esses contratos de crédito de reduções tendem a se valorizar, já que existe
um mercado especulativo que também vai procurar o lucro”, acredita o
economista Virgílio Gibbon, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro.
Gibbon foi um dos idealizadores do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões
(MBRE), e estima que ele possa movimentar US$ 1 bilhão por ano. O MBRE foi
criado pela Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F) e pelo Ministério do
Desenvolvimento.
André Leal, analista da Ecoinvest Carbon Brasil, uma firma que negocia
contratos de carbono, também prevê o crescimento da liquidez desse mercado. A
tendência, segundo ele, é a formação de um mercado secundário, com a entrada
de investidores interessados em adquirir créditos para trocar entre si, como
se faz com ações na bolsa de valores.
A emissão dos primeiros certificados de redução de emissões pelo Conselho
Executivo de MDL começou em outubro do ano passado. Com essas certificações,
os preços dos créditos tendem a se valorizar. Vários projetos já foram
registrados pelo Conselho Executivo, incluindo sete brasileiros. Por enquanto,
seis conseguiram o certificado, sendo um brasileiro. A certificação sai depois
que estudos comprovam que o projeto está de fato provocando a redução das
emissões de carbono.
Bom negócio
– De olho nesse potencial de valorização, algumas
empresas brasileiras esperam o momento certo para negociar a venda de créditos
para grupos e governos do exterior. O Projeto Bandeirantes, da Biogás Energia
Ambiental S.A ., já recebeu propostas de empresas do setor de energia do Japão,
Holanda e Inglaterra. Elas se interessaram em investir na geração de energia
elétrica a partir do gás metano emitido pelo Aterro Bandeirantes, em São Paulo,
um dos maiores do Brasil. Segundo Manoel Antônio Avelino, do Conselho de
Administração da Biogás, a empresa preferiu aguardar o registro no Conselho
Executivo, o que deve acontecer em fevereiro, para começar a negociar com as
empresas.
O Projeto Bandeirantes está em operação desde 2004, e já soma 1 milhão de
toneladas de carbono reduzidas. Avelino calcula negociar seus créditos por US$
13 a tonelada, mais do que a média atual. Com isso, a empresa pode faturar US$
13 milhões assim que entrar no mercado de carbono.
A gigante Petrobras também pretende movimentar esse mercado. A empresa está
fazendo um inventário de suas emissões de gases em toda a América do Sul, para
determinar em que áreas há maior potencial para reduzir os poluentes. Segundo
Luis César Stano, coordenador de Segurança, Meio Ambiente e Saúde, o mercado
de carbono movimenta valores relativamente pequenos para uma empresa do porte
da Petrobras, mas pode ser decisivo para a aprovação de projetos de
desenvolvimento sustentável. "Para projetos que ainda não passaram pelas
avaliações de retorno financeiro, esse lucro do carbono é essencial. Pode ser
a margem necessária para garantir sua viabilidade econômica", afirma.
O MBRE pretende atrair projetos de toda a América Latina. Por enquanto, apenas
um projeto e duas intenções de compra foram cadastrados no banco de dados.
Segundo a BM&F, vários pedidos de registro de projetos estão sendo analisados.
"O mercado vai passar a funcionar a pleno vapor ao longo do segundo trimestre
deste ano. A Bolsa tem a pretensão de ser um grande banco de dados para toda a
América Latina, e com a divulgação em toda a região o volume de negócios deve
aumentar muito", prevê Gibbon.
Europa e Estados Unidos – O sonho do mercado brasileiro é tornar-se
uma espécie de versão latina da Chicago Climate Exchange (CCX), bolsa de
créditos de carbono para empresas e governos cumprirem suas metas de emissão.
Em dezembro de 2003, treze empresas lideraram a formação do CCX, aderindo
voluntariamente à meta de 4% na redução de gases em relação à média de emissão
entre 1998 e 2001. Dois anos depois, já são 110 associados, entre eles algumas
administrações municipais. No ano passado, o Novo México tornou-se o primeiro
estado americano a integrar a CCX. É uma adesão de peso, considerando que o
Novo México é um grande produtor de energia. Entre as empresas que vendem
créditos na CCX estão as brasileiras Aracruz e Klabin.
O mercado de Chicago já negociou 4 milhões de toneladas de carbono. Sua irmã
européia, a European Climate Exchange (ECX), começou a operar no dia 22 de
abril de 2005 e já ultrapassou de longe a pioneira americana. Em nove meses de
operação, negociou 120 milhões de toneladas de carbono.
"Há muita pressão de investidores e da sociedade para que haja mais atenção à
área ambiental. E as corporações estão vendo que a participação em um mercado
organizado vai ajudá-las a ser mais transparentes. Participar de atividades
que envolvam mudanças climáticas pode ajudar suas ações a entrarem para um dos
muitos índices e fundos de sustentabilidade que existem agora", conta Rafael
Marques, vice-presidente da Chicago Climate Exchange.
Sustentabilidade – Índices como o Dow Jones Sustainability Indexes e o
FTSE4Good, da Bolsa de Londres, começam a despertar a cobiça das grandes
empresas. Um selo de sustentabilidade é um ativo importante na luta pelos
investimentos mais visados: os de longo prazo e altas cifras.
No dia 1° de dezembro, a Bolsa de São Paulo lançou seu próprio Índice de
Sustentabilidade Empresarial (ISE), o primeiro da América Latina. Começa com
uma carteira de 28 empresas.
"Para o investidor, é mais interessante investir em empresas sustentáveis no
longo prazo do que em uma que pode dar lucros altos agora, mas que daqui a
dois anos pode não estar mais de pé", afirma Rogério Marques, supervisor de
assistência ao mercado da Bovespa e um dos responsáveis pela criação do ISE.
As principais empresas dão sinais de que estão atentas à responsabilidade
socioambiental. A Ambev, por exemplo, busca compensar o impacto ambiental
causado pelas garrafas pets que são descartadas pelos consumidores e
eventualmente vão parar nos rios e no mar. Nos últimos quatro anos, a empresa
gastou R$ 210 milhões na área ambiental. Entre os principais projetos está a
redução no consumo de água para a fabricação de bebidas, por meio de estações
capazes de tratar cerca de 200 mil metros cúbicos de água por dia, o
equivalente ao consumo de 4,5 milhões de pessoas. Segundo Luiz Eduardo Osório,
gerente de Responsabilidade Corporativa da Ambev, essa medida proporciona uma
economia de R$ 16,6 milhões por ano nos gastos com água. "O que no passado era
problema, como o que fazer com esses resíduos, agora virou receita, virou
solução", conclui.
(Antônio Sampaio, O Eco, 28/01/06)
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