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2006-02-01
Transformar os raios solares em eletricidade continua sendo uma alternativa muito cara para disseminar-se como seria desejável, mas usá-la para aquecer a água é uma solução vantajosa que se expande em muitos países e pode ganhar forte impulso no Brasil. Duas iniciativas de ambientalistas e empresas interessadas aparecem como palanque para os aquecedores solares de água no País. Em São Paulo, só falta uma decisão do prefeito José Serra para que entre em vigor uma legislação que torna obrigatória a implantação do aquecedor nas novas edificações e nas grandes reformas de edifícios.

A proposta, apresentada há cinco meses pela organização não-governamental Vitae Civilis, e já aprovada pela Secretaria Municipal de Verde e Meio Ambiente de São Paulo, se inspirou na medida adotada em 2000 na cidade espanhola de Barcelona. A implementação do plano mais do que duplicou a quantidade de aquecedores de água desse tipo em três anos em Barcelona e seu exemplo repercutiu em toda a Espanha, destacou Delcio Rodrigues, especialista em energia da Vitae Civilis. Algo semelhante pode ocorrer com maior razão no Brasil, já que São Paulo é sua maior metrópole, com 11 milhões de habitantes, e excede forte influência sobre todo o país, com uma população de 187 milhões de pessoas, como seu principal centro econômico, observou.

Um projeto em Belo Horizonte abre novas perspectivas para a energia termosolar, ao inaugurar um modelo inovador de negócios. Uma Vila Olímpica, centro de esportes e educação, da Universidade Católica de Minas Gerais terá a água de sua piscina e dos chuveiros aquecidas pelo sol. Porém, a empresa de eletricidade local, a Centrais Elétricas de Minas Gerais (Cemig) cuidará do custo de implantação do sistema, cobrando pelo serviço de fornecer água quente, naturalmente a um preço muito inferior ao da energia elétrica.

É importante abrir alternativas desse tipo, porque um grande obstáculo à difusão dos aquecedores solares é seu investimento inicial relativamente alto, equivalente a US$ 600 para uma família de quatro pessoas, por exemplo, enquanto se pode comprar energia elétrica por pouco mais de US$ 10. Em dois ou três anos, entretanto, a economia de eletricidade superará a quantia investida e o sistema pode durar 20 anos ou mais, garantiu Antonio Placideli, gerente de Mercado da Soletrol, empresa líder na produção de aquecedores solares no Brasil.

Abrir formas de financiamento é, portanto, decisivo na disseminação do sistema, especialmente no Brasil onde são muito altas as taxas de juros para créditos bancários, em muitos casos superior aos 100% ao ano em termos reais, isto é, descontando a inflação. A alternativa energética tem uma importância singular no País, não só por se tratar de um país tropical. É que o Brasil adotou para o serviço de água quente no banheiro uma solução estimulada por um passado de energia elétrica barata, gerada em seus numerosos rios.

Os aparelhos elétricos aquecem a água em mais de dois terços das casas brasileiras. A Vitae Civilis estima que, somados os aquecedores de acúmulo de água (tanque) menos numerosos, respondem por 6% a 8% do total de eletricidade consumida no País. Além disso, seu consumo se concentra entre 18h e 21h, o horário de pico, quando sua participação sobe para 18% do total. Por isso, interessa inclusive às empresas distribuidoras de energia ampliar o uso dos aquecedores solares de água. Perdem em energia vendida, mas economizam em uma proporção maior ao reduzir a demanda nas horas de pico, que as obriga a um enorme desperdício.

Em conseqüência, a Cemig adotou uma política de estímulo ao uso do aquecedor solar, promovendo sua instalação em cem edifícios de Belo Horizonte e em um projeto social de casas populares. Hoje, esta cidade de 2,4 milhões de habitantes é a capital da energia termosolar do Brasil, com mil edifícios usando água aquecida pelo sol. O Brasil desenvolveu sua própria tecnologia e indústria de aquecedores nos últimos 30 anos, barateando o equipamento e passando, inclusive, a exportá-lo, segundo a Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Calefação (Abrava), que mantém um departamento de aquecedores de água solar (Dasol).

Hoje, o Dasol conta com 25 empresas industriais associadas, todas com seus produtos certificados pelo órgão estatal de controle de qualidade. Países como Brasil, seus vizinhos da América Latina e do Caribe são ideais para aproveitar a energia solar, mas ainda apresentam escassa difusão no que diz respeito a aquecedores, ao contrário de nações com menos horas de sol, como algumas européias, e também em Israel, onde é obrigatório instalar as placas de captação do calor solar em todas as edificações. O Brasil conta com radiação solar com potencial para gerar 15 bilhões de megawatts/hora, 50 mil vezes o consumo nacional de eletricidade, segundo a Vitae Civilis.

Falta um programa nacional, incentivado pelo próprio governo, divulgando as vantagens do sistema e oferecendo incentivos, afirmou Placidelli. Rodrigues e outros ambientalistas propõem a inclusão dessa alternativa no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo do Protocolo de Kyoto, para gerar certificados de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa, que poderiam obter renda como estímulo adicional à disseminação dos aquecedores de água.
(Por Mário Osava – IPS/Envolverde)

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