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2006-02-01
Medidas tomadas pela prefeitura de Porto Alegre para solucionar o problema dos alagamentos em um dos bairros mais nobres da capital gaúcha podem reduzir áreas de lazer do parque Moinhos de Ventos (Parcão), bem como alterar a vida de moradores e comerciantes da rua Quintino Bocaiúva. O projeto, conhecido como Conduto Forçado Álvaro Chaves-Goethe (CFAC) levará a água das chuvas de áreas altas da capital até o lago Guaíba, próximo ao maior ponto de captação de água de Porto Alegre, com risco de contaminação por esgotos. Com um custo estimado em R$ 43,1 milhões, compreende cerca de 15 mil metros de canalização pluvial e “deverá ser executado, entre outros locais do município, sobre a área do parque, interligando a rua Goethe e a Quintino na altura do número 777, sendo necessária a movimentação de terra sobre a área”, descreve o Processo de Licenciamento Ambiental, desenvolvido pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMAM).

Ainda, conforme um outro documento da Secretaria, três casas localizadas na Quintino a partir do edifício de esquina da rua Poty de Medeiros podem ser desapropriadas para permitir a reorganização do trânsito local, com uma área de acesso ao parque com maior amplidão. “Esta proposta devolverá ao parque a área subtraída pela retificação oferecendo à comunidade do entorno uma compensação das perdas”, propõe o texto.

Quem levantou a questão foi a diretora do Núcleo Amigos da Terra/Brasil (NAT), Kathia Vasconcellos Monteiro. Ela conta que a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) recebeu aprovação da Secretaria para retificar a Poty de Medeiros, onde estão localizadas atualmente as quadras de esportes do parque. De acordo com Kathia, a proposta “é aproveitar toda essa movimentação de terra e de trânsito que vai haver para a instalação do conduto forçado e fazer a retificação da Poty de Medeiros”. Os dados constam no Processo de Licenciamento e podem ser acessados pela população na SMAM. “É a velha tática de se fazer tudo por debaixo dos panos. Comer o parque pelas beiradas, afetando parte da população que usufrui essa área de lazer”, acusa.

Contradição
O Diretor de Trânsito e Circulação da EPTC, José Wilmar Govinatzki, confirmou a intenção da empresa de retificar a rua. “Dados de 2004 mostram que cerca de 12 mil veículos passam por dia no cruzamento. Queremos, além de uma conexão mais direta, aperfeiçoar o raio de giro dos veículos, principalmente das linhas de ônibus, que fazem o ingresso na Eudoro Berlink pela Poty de Medeiros”, explica. Ao ser questionado sobre se a SMAM já havia dado aval positivo para a concretização do projeto, Govinatzki afirmou que a Secretaria acatou a proposta da EPTC, com a ressalva de que sejam desapropriadas as três casas localizadas na Quintino Bocaiúva.

Já o titular da SMAM, Beto Moesch afirmou após reunião do Conselho Municipal do Meio Ambiente (COMAM), realizada no último dia 26 de janeiro, que desconhecia as informações. Moesch disse durante reunião do COMAM que a pasta não havia autorizado as obras para a retificação da Poty de Medeiros.

Porém, segundo e-mail enviado pela técnica da Secretaria Ana Maria Godinho Germani para Nara Ione Medina Schimitt, da Coordenadoria de Licenciamento Ambiental (CLA), a SMAM reconhece a necessidade das obras e propõe a desapropriação das três casas. “Essa retificação da Poty não consta no Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) e nem no Licenciamento, mas ela está sendo negociada entre a EPTC e algum outro órgão”, informa a diretora do NAT.

No número 777 da rua Quintino Bocaiúva, a secretária Lucimara Gonçalves da Silva informa que a prefeitura foi até o local, há cerca de dois anos atrás, para tomar conhecimento da área. “Disseram que iriam medir o terreno para futuras obras de encanamento”. Até hoje, segundo ela, não houve mais contato da prefeitura com os proprietários. Lucimara disse ter ficado surpresa ao saber do plano para desapropriar as residências. “O primeiro passo é consultar. Foi elaborado um projeto sem sequer ouvir a opinião dos responsáveis por estes locais”, opina.

Riscos à captação de água
O NAT ainda encaminhou à Promotoria do Meio Ambiente do Ministério Público Estadual e ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) – instituição responsável por cerca de 66% da verba destinada à obra – representação relatando as informações obtidas no processo de Licenciamento Ambiental. De acordo com a ONG o MP já marcou audiência para março, onde deverão estar presentes representantes do Departamento de Esgotos Pluviais (DEP) – responsável pela obra do Conduto –, da SMAM e do Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE). “Queremos que o parque seja mantido e que a sociedade seja informada sobre as intenções e ouvida pelos responsáveis”, reivindica a diretora do NAT .

Ofício enviado pelo DMAE ao DEP, há 40 dias, indica que o Conduto Forçado, além de provocar a diminuição do espaço físico do Parcão com a retificação da Poty de Medeiros, pode também comprometer o abastecimento de água da capital gaúcha. De acordo com o documento, “o empreendedor (DEP) deverá realizar estudo sobre o aporte de sedimentos, bem como o monitoramento da qualidade de água do Guaíba antes da obtenção da licença de instalação das redes”. Há uma preocupação quanto ao grande volume de esgoto pluvial e cloacal a ser lançado no Guaíba – a 200 metros do maior ponto de captação de água de Porto Alegre – após chuvas abundantes na capital.

Segundo Paulo Contreiras Dourado, superintendente de Desenvolvimento do DMAE, “o estudo solicitado, que ainda está sendo realizado por uma empresa contratada pelo DEP, propicia a possibilidade de se mudar o ponto de lançamento do conduto caso fique comprovado que ele irá interferir de maneira negativa nas nossas captações”.

A obra deverá ser concluída no primeiro semestre de 2007. Até lá, serão pelo menos mais 12 meses de buracos e grandes inconvenientes nas calçadas e ruas interrompidas. Espera-se, porém, que após a conclusão do Conduto Forçado, as cenas de Jet Ski e de grandes alagamentos em plena Goethe não sejam mais repetidas.
Por Tatiana Feldens

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