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2006-01-27
A cena ocorre com freqüência nos portos. O navio que chega com petróleo nos porões precisa levar de volta outra carga. Para não sujar o produto com o que sobrou do óleo, é preciso fazer uma lavagem. Por economia, a tripulação não usa os serviços em terra e providencia ela mesma a limpeza. Com isso, tudo o que restava de líquido no navio é lançado ao mar. Como esses procedimentos também ocorrem em alto-mar, a quantidade de óleo jogada nos oceanos é grande.

“Essa descarga ilegal, que ocorre a partir de vários tipos de embarcações, é um grande problema para os pingüins”, afirma a veterinária Valeria Ruoppolo, coordenadora da Rede Pingüim do Fundo Internacional para Proteção dos Animais e seu Hábitat (Ifaw, na sigla em inglês), organização não-governamental presente em 13 países.

Ao contrário do que a maioria pensa, não são os derramamentos de petróleo os maiores vilões para esse grupo de aves. “Os acidentes estão no último lugar na lista”, explica a pesquisadora brasileira, que acaba de publicar, ao lado de vários colegas, um artigo sobre o tema na revista científica internacional Marine Pollution Bulletin. As lavagens ilegais estão em primeiro.

Somadas todas as causas da impregnação marítima por óleo, estimativas feitas na década de 1990 davam conta de que, apenas no litoral da Argentina, 40 mil animais morriam todos os anos por esse motivo.

“Sempre no final do verão, os pingüins de Magalhães (Spheniscus magellanicus), que se reproduzem na costa patagônica da Argentina, começam a migrar em direção ao Brasil. Essas aves, que não viajam voando mas sim nadando, passam sete meses na água”, explica a veterinária. E é exatamente nesse deslocamento que o problema ocorre.

Ao cruzar com as manchas, os pingüins são contaminados. Com as penas encharcadas de óleo, a famosa proteção contra a água deixa de existir. Molhados, a temperatura corporal começa a cair. O metabolismo aumenta para tentar gerar calor. Mesmo comendo e providos de espessas capas de gordura, os animais não conseguem mais seguir viagem atrás dos peixes. Eles param de nadar e vão em direção ao litoral.

“A contaminação por óleo é fatal para os pingüins, que precisam ser tratados”, explica Valeria. Além de sujos e por causa do esforço metabólico eles chegam bastante magros na areia. “Parte do nosso trabalho é tratar desses animais e recolocá-los no ambiente”, diz.

Nos últimos cincos anos, a taxa de sucesso dessa reabilitação tem sido de 80%. “O problema é que temos acesso apenas à ponta do iceberg”, conta a pesquisadora. Por ano, são coletados nas praias sul-americanas cerca de 300 pingüins para tratamento. Ao longo dos 6,8 mil quilômetros entre Salvador, na Bahia, e San Antonio Oeste, na Argentina, existem 25 centros de reabilitação para as aves.

“Uma das medidas que precisam ser tomadas é o desenvolvimento de uma tecnologia de baixo custo que permita a lavagem dos navios sem que o lixo oleoso seja jogado no mar”, afirma Valeria. Parte do problema, que era causado pela troca da água de lastro das embarcações, já está sendo atacado. Mas quem causou essa mudança não foi o sofrimento das aves que migram nadando. Esse processo, antes comum, está sendo coibido porque as águas usadas como lastro, obtidas em outros países, trazem microrganismos nocivos para o contexto sul-americano.

“Além da costa do Brasil [a grande maioria dos pingüins migra até Santa Catarina, mas alguns jovens vão até a Bahia], do Uruguai e da Argentina, o mesmo problema existe na costa do Canadá e no mar do Norte, na Europa”, afirma Valeria.

Segundo a pesquisadora, a contaminação dos pingüins é conhecida nesse lado do continente, paradoxalmente, porque o litoral é habitado. “Ninguém sabe direito, por exemplo, o que ocorre no litoral sul do Chile”, diz.
(Por Eduardo Geraque - Agência FAPESP, 26/01/2006 )

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