Mineradora canadense diz que vai remover geleira entre Chile e Argentina apesar dos protestos
2006-01-25
O polêmico e multimilionário projeto aurífero Pascua Lama, na fronteira entre Chile e Argentina, que
exige a eliminação de geleiras de montanha, pode começar a ser construído este ano, mesmo com a
forte oposição de ambientalistas. Pascua Lama é uma das maiores fontes de ouro inexploradas do
mundo, com potencial para produzir 17,5 milhões de onças. A canadense Barrick Gold Corporation
possui a concessão para mineração em Pascua Lama e para três mil quilômetros quadrados da
região que a circunda. A companhia, que há pouco se converteu na maior produtora de ouro do
mundo, pretende iniciar o projeto de US$ 1,5 bilhão, apesar do protesto público dentro e fora do Chile.
“Esperamos completar o processo de habilitação e proceder com nosso atual calendário”, disse Vincent Borg, vice-presidente de Comunicações Corporativas da Barrick. Esse calendário
significa que a construção começaria em setembro de 2006 e a produção a partir de 2009, segundo
informes prévios. A Barrick reviu seu plano do projeto e necessitará remover apenas a metade,
aproximadamente, do gelo originalmente previsto, disse Borg. “As geleiras ou reservas de gelo a
serem afetadas representam apenas 0,4% da água que flui para o vale”, afirmou. O porta-voz disse não
ter comentários sobre as declarações da recém-eleita presidente do Chile, Michelle Bachelet, que
assegurou que protegerá as geleiras e proibirá sua remoção ou destruição.
“É simplesmente insano pensar que essas geleiras podem ser removidas e que não haverá nenhum
impacto”, disse Jamie Kneen, da organização não-governamental Alerta Mineração Canadá. “As
geleiras já são prejudicadas pelas estradas de exploração e perfurações de testes da Barrick”, disse
Kneen. Pascua Lama está localizado a 4,6 mil metros de altitude e se estende dos
dois lados da fronteira argentino-chilena, com 80% no Chile. O local para a enorme mina a céu aberto
está atualmente sob três geleiras conhecidas como Toro 1, Toro 2 e Esperança. Elas alimentam o
vale de Huasco, 660 quilômetros ao norte de Santiago, fornecendo água para irrigação a 70 mil
pequenos agricultores.
Originalmente, a Barrick planejava escavar e explodir cerca de 30 mil metros cúbicos de gelo em uma
superfície de 20 hectares das geleiras. Para minimizar o impacto ecológico e impedir que o gelo
derreta, este seria transportado para criar uma nova geleira maior perto dali. A remoção das geleiras
“prejudicará o fornecimento de água para os vales de Huasco, no Chile, e Jachal, na Argentina”, disse
Raúl Montenegro, diretor da ong argentina Fundação para a Defesa do Meio Ambiente. Segundo
Montenegro, o dano ambiental foi evidente em outro projeto da Barrick, que já eliminou camadas de
gelo: Veladero.
Ao sul de Pascua Lama, na Argentina, calcula-se que a mina possua 12,8 milhões de onças de ouro.
Embora 80% do projeto esteja no Chile, “o impacto ambiental mais sério acontecerá na Argentina,
pois ali estará o vertedouro de dejetos”, disse Montenegro. Em território argentino será construída
uma parte menor da mina a céu aberto, junto com um vertedouro de rochas residuais, uma fábrica
processadora, um tanque de dejetos, o acampamento de construção e o de operação para cerca de
5,5 mil pessoas. Em Pascua Lama, milhões de toneladas de minério de ouro serão processadas
usando uma solução de cianureto para recuperar o ouro e o metal. O minério de outro residual e a
água contaminada com cianureto terão de ser armazenados em tanques ou diques. As rupturas nos
tanques representam 75% dos acidentes ambientais envolvendo minas de ouro nas últimas três
décadas, segundo a Earthworks, uma ong com sede nos Estados Unidos.
A região de Pascua Lama também é propensa a terremotos e tremores, disse Kneen. “A oposição
pública a isto é enorme no Chile, a maior desde os protestos de 1973 (contra o ditador general
Augusto Pinochet)”, afirmou. “A maior parte das minas de ouro não recebem este nível de oposição
pública”, concordou Jason Goulden, diretor de Exploração Corporativa da Metals Economics Group,
empresa líder no mundo dedicada à informação e consultoria sobre minérios, com sede na cidade
canadense de Halifax.
Goulden reconheceu que as minas de ouro sempre têm um impacto sobre o meio ambiente, mas o
enorme tamanho da reserva de ouro e a capacidade de extrair minério a baixo custo significa que,
provavelmente, será uma operação economicamente “muito benéfica”. O preço do ouro subiu ao seu
nível mais alto em 25 anos, US$ 560 a onça. A demanda de ouro continuará sendo alta no futuro,
devido à sede por jóias de ouro na Índia – um país em pleno auge econômico – e à expectativa de que
os bancos centrais da China e da Rússia se distanciem da compra de dólares e se mostrem
interessados no ouro para suas reservas, disse. “Pascua Lama é um projeto importante para a
Barrick, porque produzirá muito dinheiro”, acrescentou.
(Terramérica, 24/01)