Praga avança pela Bacia do Guaíba
2006-01-23
Um pequeno molusco chinês que desafia as autoridades da Capital há mais de
cinco anos avança pela Bacia do Guaíba e deverá levar dor-de-cabeça aos
responsáveis pelo abastecimento em outras cidades no Estado. Trata-se do
mexilhão-dourado, invasor dos rios que forma colônias e pode danificar barcos
e obstruir os pontos de captação de água.
Impróprio para o consumo humano, o molusco subiu o Rio Taquari até o porto de
Estrela e, em breve, deverá chegar ao Rio Pardo pelo Jacuí. Na região, apenas
os rios Gravataí e Sinos não estão infestados pelo molusco devido à poluição,
de acordo com o monitoramento da Fundação Estadual de Proteção Ambiental
(Fepam), em outubro de 2005.
Pescadores e biólogos também estão preocupados com a proliferação do mexilhão
na Lagoa dos Patos e com a mortandade de plantas aquáticas nas encostas dos
rios, um indício de desequilíbrio ambiental.
Na Capital, há três anos a praga que entope canos e tubulações pôs em alerta
o Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae). Nos últimos 25 dias, uma
dupla de mergulhadores tem entrado nas canalizações para fazer a limpeza com
bombas especiais e impedir que a captação de água seja comprometida. O
emprego de mergulhadores contra o molusco começou há seis anos.
Das oito estações de Tratamento de Água (ETA) do Dmae, apenas os canos e as
grades de retenção de uma delas não estão infestados por colônias do mexilhão.
Em um dos problemas mais graves, metade de uma canalização de 1,4 metro de
diâmetro estava obstruída.
- É uma preocupação muito séria. Uma canalização entupida não agüenta um pico
de consumo-, afirma Renato Rossi, diretor da Divisão de Tratamento de Água do
Dmae.
Proliferação do bicho dificulta o trabalho dos mergulhadores
Antes, mergulhadores profissionais, munidos de cestas e espátulas, conseguiam
remover os mexilhões-dourados dos canos sem grandes esforços. Com a
proliferação, o método se tornou ineficaz. Os moluscos têm uma formação
calcária e produzem uma espécie de cola que, em pouco tempo, uma colônia da
praga se torna tão dura quanto uma rocha.
Em junho e novembro do ano passado, o Dmae comprou duas bombas aspiradoras,
de R$ 50 mil cada, para reforçar o trabalho dos mergulhadores. Em cada
operação, são retirados, em média, dois metros cúbicos do mexilhão,
suficiente para encher uma caçamba de tele-entulho.
- Gastamos mais de R$ 300 mil em 2005 para pagar mergulhadores-, declara
Rossi.
Invasor resiste a sal de lagoa
A facilidade de adaptação do molusco intriga pesquisadores. Apesar de a sua
origem ser a água doce, seu aparecimento, ainda que intermitente, na Lagoa
dos Patos, indica que ele consegue sobreviver em água salina, pois a lagoa
tem influência da água do mar.
Relatos de pescadores apontam que o mexilhão está se fixando nas plantas
aquáticas das encostas, local preferido do molusco por causa das águas mais
limpas. Depois de se afixar, ele asfixia as plantas.
- Esse também é o lugar onde os peixes desovam, ou seja, a presença do
mexilhão pode provocar uma alteração perigosa no ecossistema dos lagos porque
altera a cadeia alimentar dos peixes-, afirma a bióloga Vera Pitoni,
assessora técnica da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e integrante da
força-tarefa nacional de combate ao molusco.
Como não há predadores naturais nem peixes que consumam o mexilhão com a
mesma freqüência com que ele se reproduz - como a piava, por exemplo-, a
solução no momento é o controle da dispersão do invasor. Segundo a bióloga,
quem está em área infestada e pretende se deslocar com barcos ou lanchas para
zonas não contaminadas deve manter as embarcações 15 dias fora d água antes
da viagem para evitar a proliferação do molusco. A praga resiste até sete
dias longe do hábitat natural.
- Os mexilhões se espalham por meio da navegação, fixados nos cascos das
embarcações, mas morrem em mais de uma semana fora d água- explica a bióloga.
Corsan e Copesul se preocupam
A Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) e a Companhia Petroquímica do
Sul (Copesul) estão mobilizadas para barrar o avanço do mexilhão-dourado. Na
captação do Arroio das Garças, em Canoas, o sistema de bombeamento teve de
ser parado durante quatro horas para a remoção das colônias.
- Essas limpezas constantes provocam danos aos revestimentos internos das
bombas, o que nos obrigará a trocá-las em breve - diz Marinho Emilio Graff,
superintendente de tratamento de água da Corsan.
A Copesul deve iniciar neste semestre um projeto de combate às larvas do
molusco com dióxido de cloro junto à captação no Rio Caí, que supre todo o
Pólo Petroquímico. (ZH, 20/01)