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2006-01-23
Falta pouco para o eletrotécnico alemão Hans Dieter Rahn, de 77 anos, realizar o sonho da implantação da energia eólica no Brasil. Embora não goste de aparecer, ele certamente estará na primeira fila da inauguração do Parque Eólico de Osório, que deve acontecer mais ou menos na virada de 2006 para 2007. “É emocionante ver esses grandes cata-ventos funcionando”, diz ele, referindo-se aos geradores pioneiros montados no Nordeste e no Sul. Em sua mesa, ele mantém à vista um brinquedo trazido recentemente da Alemanha: a miniatura de um gerador eólico.

Chegado ao Brasil em 1951, esse precavido alemão-gaúcho foi talvez o primeiro habitante de Porto Alegre a antenar-se para as possibilidades das energias renováveis, especialmente a solar e a eólica. Hoje, em caso de apagão ou blecaute, ele com certeza não ficará no escuro. Desde o início dos anos 90, mantém no telhado do prédio de sua empresa, IEM (Intercâmbio Eletro Mecânico) — quatro pavimentos na esquina das avenidas Amazonas e Polônia, no bairro São Geraldo — um conjunto de medidores da direção e da velocidade dos ventos, além de 40 metros quadrados de placas de captação de energia solar para auto-abastecimento.

Declara-se o único consumidor nacional de eletricidade com autorização especial para produzir energia solar fotovoltaica. Graças a esse privilégio, conquistado em décadas de um trabalho pioneiro e silencioso no campo energético, mantém com a estatal gaúcha CEEE um intercâmbio pelo qual fornece 3 kWh de energia solar à rede pública, abatendo assim em cerca de 20% o valor da sua conta mensal de eletricidade, hoje no valor de 800 reais.

A firma é estável e ele vive bem, mas não ficou rico. “Como todo negócio pioneiro, a energia renovável gratifica mas não dá dinheiro”, diz ele. Com 12 funcionários, a IEM é gerida por seu filho Ralph, brasileiro de 49 anos.

Hans Dieter Rahn nasceu em 1928 em Greifswald, no norte da Alemanha, e veio para Porto Alegre a fim de ajudar o sogro Heinrich Karl Bredemeier numa loja de material elétrico fundada em 1942. Nos primeiros anos, dedicou-se a difundir a automação industrial entre a clientela. Após o choque do petróleo, em meados dos anos 70 (Bredemeier faleceu em 1972), passou a explorar a energia solar, fabricando placas solares. Em 1992, entrou no campo da energia eólica.

O primeiro cliente nessa área foi Carlos Nascimento, um arrozeiro de Santa Vitória do Palmar disposto a implantar em sua fazenda um sistema energético baseado no aproveitamento dos ventos, intensos por ali, no extremo sul do Rio Grande. Para escolher as máquinas adequadas a equipar a fazenda, ambos visitaram a Feira de Hannover. O governo alemão oferecia então um subsídio de 70% à compra de equipamentos de energia solar, mas a importação foi vetada pelo governo brasileiro, sem que se pudesse aproveitar o subsídio, afinal suspenso no final de 1992. Àquela altura, o engajamento na idéia da sustentabilidade econômica mediante o emprego de energias renováveis já havia colocado a Alemanha na vanguarda do desenvolvimento da tecnologia da energia eólica, cuja corrida fora iniciada nos anos 80 pela Dinamarca. Um dos objetivos alemães era reduzir o uso da energia nuclear. Atualmente, a Alemanha lidera a produção mundial de energia eólica, com mais de 10 mil turbinas em operação – as maiores, de 4 MW. Também são importantes produtores os Estados Unidos, a Espanha, a Dinamarca, a India e a Holanda.

O negócio com o fazendeiro de Santa Vitória do Palmar não prosperou, mas a viagem a Hannover foi providencial, pois permitiu a Rahn mergulhar fundo na nova realidade energética européia. Nomeado representante no Brasil dos anemômetros Ammonit, ele qualificou-se para receber encomendas de universidades, concessionárias de energia elétrica e empresas interessadas em medir o potencial dos ventos do Brasil.

Hoje, mais de dez anos depois de iniciar o trabalho de prospecção da qualidade dos ventos brasileiros, Rahn mantém ativas no território nacional 100 torres de medição eólica por conta de instituições públicas e privadas. Vinte delas operam a serviço da Petrobras e cinco para a Ventos do Sul, empresa responsável pela implantação da primeira grande fazenda eólica do Brasil, com 75 cata-ventos de 2 MW.

Osório na frente
Formada pela associação dos brasileiros Telmo Magadan e Alberto Martins da Costa Pinto com os espanhóis da Elecnor/Enerfin e os alemães da Enercon/Wobben Windpower, a Ventos do Sul escolheu Osório para implantar uma usina com capacidade de gerar 150 MWh (pouco mais de 1% da geração da Hidrelétrica de Itaipu). Nesse município de 40 mil habitantes, as medições feitas por Rahn no início do século XXI encontraram ventos com velocidade média de 7 m/s a 50 metros do chão e de 7,5 m/s a 100 metros.

Foi graças a esses dados que os empresários do vento de Osório resolveram apostar em geradores de 2 MW instalados em torres de 98 metros de altura – inicialmente, eles haviam planejado geradores de 1 MW a 50 metros do chão. Assim, o Brasil prepara-se para dar um salto na exploração da energia eólica. Até agora, existem no país sete usinas eólicas que geram um total 27,1 MWh, com geradores de 500 e 600 kW (ver tabela I). A maior concentração de geradores eólicos está no litoral do Ceará, cujos ventos são constantes, enquanto no litoral gaúcho predominam as rajadas.

“Com oito mil quilômetros de costa, o Brasil tem seis mil quilômetros com ventos muito bons”, afirma Rahn, lembrando que são úteis para fins energéticos os ventos acima de 6 metros por segundo e abaixo de 21 m/s.

O litoral gaúcho é a região gaúcha mais rica em ventos, mas no Atlas Eólico do Rio Grande do Sul, produzido pela Secretaria de Energia, Minas e Comunicação do Estado, constam como potencialmente produtivas outras quatro áreas:

A - o Escudo Rio-Grandense, na zona de Canguçu a Bagé;
B - a região de Santana do Livramento;
C - a zona serrana de São Francisco de Paula;
D - a alta região missioneira, no noroeste.

Além disso, o Atlas registra que as lagoas dos Patos, Mirim e Mangueira são potencialmente adequadas às instalação de usinas eólicas, pois são bastante rasas; a profundidade máxima da Lagoa dos Patos não vai além de sete metros na sua margem ocidental.

Atlas Eólico
Lançado em setembro de 2002, o Atlas Eólico do RS é um livro resultante de esforços iniciados em 1999 por Dilma Roussef, secretária de Minas, Energia e Comunicação do governo de Olívio Dutra. Em solo firme, no litoral e nas quatro áreas acima, o Atlas identificou o potencial de gerar 15640 MW com fator de capacidade de 30%, isto é, com aproveitamento constante de 30% dos ventos acima de 7 m/s a 50 metros do chão.

Se todo essse potencial for capturado, a produção pode chegar a pelo menos 4,7 mil MWh, mas sem continuidade porque os geradores deixam de produzir quando o vento pára de soprar. Se não fosse uma energia aleatória e que não pode ser represada, a eletricidade produzida a partir dos ventos do Rio Grande seria suficiente para atender toda a demanda média do Estado, hoje situada na faixa de 4,5 mil MWh.

Por isso se diz que a energia eólica tem um caráter meramente complementar na matriz energética. No Brasil a maior virtude das usinas tocadas pelo vento será reforçar a carga do sistema elétrico, propiciando a economia de água nos reservatórios das centrais hidrelétricas. Nesse aspecto, a complementaridade da energia eólica passa a ser essencial para a segurança do sistema elétrico brasileiro, baseado (60%) no aproveitamento da energia hidráulica. Aqui, como lembra o veterano Hans Rahn, “quando chove pouco, venta muito”.

Usinas eólicas em operação no Brasil

Nome – Potência
Prainha (CE) – 10 MW
Taiba (CE) - 5 MW
Mucuripe (CE) - 2,4 MW
Macau (RN) - 1,8 MW
Palmas (PR) - 2,5 MW
Horizonte (SC) - 4,8 MW
Bom Jardim (SC) - 0,6 MW

Usinas eólicas aprovadas pela Aneel no Rio Grande do Sul
Com 3,3% da área do Brasil, o RS acumula 15% do potencial eólico nacional

Nome: Osório (em execução)
Potência (MW): 150
Município: Osório
Responsável: Elecnor

Nome: Palmares
Potência (MW): 7,2
Município: Palmares
Responsável: Elecnor

Nome: S. Vitória I
Potência (MW): 126
Município: S. Vitória
Responsável: Elebrás

Nome: Mostardas I
Potência (MW): 72
Município: Mostardas
Responsável: Elebrás

Nome: Cidreiras I
Potência (MW): 72
Município: Cidreiras
Responsável: Elebrás

Nome: Marmeleiro I
Potência (MW): 50
Município: S. Vitória
Responsável: ERB

Nome: F. da Solidão
Potência (MW): 50
Município: Mostardas
Responsável: ERB

Nome: Tainhas I
Potência (MW): 50
Município: S.F. de Paula
Responsável: ERB

Nome: Jaguarão
Potência (MW): 50
Município: Jaguarão
Responsável: Gamesa

Nome: Cassino
Potência (MW): 80,75
Município: Rio Grande
Responsável: Gamesa

Nome: Serra do Antunes
Potência (MW): 98,60
Município: Piratini
Responsável: Gamesa

Nome: Tainhas
Potência (MW): 99,45
Município: S. F. De Paula
Responsável: Gamesa


Nome: Jiribatu
Potência (MW): 85
Município: S. Vitória
Responsável: Gamesa

Nome: Livramento
Potência (MW): 149,60
Município: Livramento
Responsável: Gamesa

Por Geraldo Hasse, de Osório para O Diário dos Ventos, série exclusiva do Ambiente Já e Jornal Já – www.jornalja.com.br

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