Degradação: borracha depositada em Desvio Machado virou mistério
2006-01-23
Restos de pneus e retalhos de borracha de diferentes formatos tomam uma área de aproximadamente 40 por 80 metros a céu aberto, numa área privada, em Desvio Machado, na região de Carlos Barbosa. A degradação ambiental ocorre num local cercado de eucaliptos, não muito distante da estrada que liga Desvio Machado a Mundo Novo, no interior de Farroupilha.
O solo é composto basicamente por rocha, lajes de basalto, embora tenha uma pequena camada de terra. A empresa responsável se comprometeu com a retirada da borracha.
Na tarde de quarta-feira (18/1), quando o jornal Contexto esteve no local, foi constatado que ainda havia muito lixo, incluindo até material que aparenta ter sido depositado recentemente. No mês de setembro de 2005, a fiscal sanitarista e de meio ambiente da Prefeitura de Carlos Barbosa, Gabriela Giacobbo, descobriu o depósito de borracha por acaso. Ela foi averiguar a denúncia de um morador de que alguém estava despejando uma substância suspeita num riacho.
A fiscal emitiu um auto de infração, mas só conseguiu entregar aos diretores da empresa Rinaldi S.A. Indústria de Pneumáticos, de Bento Gonçalves, supostamente responsável pela colocação dos detritos no local, em dezembro de 2005.
Foi quando iniciou um processo administrativo que tramita no setor jurídico e na seção de meio ambiente da Prefeitura Municipal. "Eu entrei em contato logo depois de fazer as fotos, a empresa começou a me enrolar, tentei entregar o auto de infração em mãos, mas os proprietários da empresa não foram localizados. Então mandei por correio, não tinha outra saída. Em dezembro eles finalmente receberam", disse Gabriela.
A legislação ambiental é bem clara quanto à proibição de depósito de pneus, pneumáticos e borrachas no meio ambiente. A Resolução 258/99, em vigor desde 26 de agosto de 1999, estabelece a proibição em seu artigo 9º: "A partir da data de publicação desta Resolução, fica proibida a destinação final inadequada de pneumáticos, tais como a disposição em aterros sanitários, mar, rios, lagos ou riachos, terrenos baldios ou alagadiços, e queima a céu aberto".
Pneus e borrachas depositados podem afetar o meio ambiente de diferentes maneiras. Conforme a bióloga Diana Blum Künzel, que assessora a Prefeitura Municipal, até mesmo a fauna pode ser atingida. "A borracha a céu aberto, em contato com o sol, água e solo, pode lixiviar [extrair o componente solúvel de uma estrutura sólida], liberando produtos químicos. Também pode contaminar a fauna, além da degradação da paisagem", disse Diana, que também alertou que a decomposição (reintegração ao meio ambiente) deste tipo de material pode "levar séculos".
De acordo com o Decreto Federal 3.179/99 (que regulamenta a lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998), a multa por poluição pode chegar R$ 50 milhões, dependendo do crime ambiental. Neste caso, a multa aplicada é de R$ 6 mil, cabendo 80% (R$ 4,8 mil) à fonte geradora da poluição, e 20% (R$1,2 mil) ao responsável pelas terras onde foi colocado o material.
Se os responsáveis adotaram medidas para corrigir a degradação ambiental causada, a multa pode ser reduzida em até 90%, o que deixaria o valor em R$ 600. No entanto, a retirada da borracha deve ser feita independentemente de qualquer penalidade. Neste caso, cabe a aplicação de uma multa de R$ 100,00 por dia em que o resíduo permanecer no local.
O proprietário da área de terra, Clóvis Basso, também foi notificado. Cada parte fez as alegações cabíveis em sua defesa. Agora, a assessoria jurídica da Prefeitura analisa o caso, que poderá gerar uma ação na Justiça contra os responsáveis.
Para o prefeito em exercício, Valmir Danieli, a lei deve ser cumprida: "Não temos outra alternativa a não ser fazer cumprir a lei. A assessoria jurídica está analisando o processo. Se for necessário, será acionada a Justiça".
Os pneus e restos de borracha inservíveis (termo usado na lei) podem ser reciclados e usados como energia calorífica, bastante utilizada em fábricas de cimento, e em mistura asfáltica. Nos Estados Unidos, segundo dados da Associação Brasileira de Cimento Portland, anualmente são queimados 100 milhões de carcaças de pneus pela indústria do cimento. No Brasil, esta prática começa a ser utilizada.
Outra alternativa para destino final de pneus é a mistura asfáltica. Isso não é uma tecnologia nova, tendo sido desenvolvida há 40 anos nos Estados Unidos. Charles Mac’Dowell registrou a patente após dez anos de experiências. O asfalto normal tem vida útil de 10 anos, mas aquele misturado com borracha, chamado de asfalto ecológico, pode durar entre 25 e 30 anos. Para tanto, o pneu deve ser reciclado e triturado até se transformar em borracha granulada, ficando pronta para ser misturada ao asfalto. (Jornal Contexto, 22/1)