Canadá pode abandonar Protocolo de Kyoto após eleições nacionais
2006-01-20
Vários brasileiros estão alarmados e perplexos com as notícias que vêm do
Canadá dizendo que o país poderia abandonar o Protocolo de Kyoto, dependendo
do resultado das próximas eleições federais. O Partido Conservador
(Conservative Party) daquele país, que está com 12 pontos percentuais de
vantagem nas pesquisas prévias e parece ter a maior possibilidade de formar
o próximo governo depois das eleições federais marcadas para o próximo dia
23 de janeiro, anunciou na semana passada que, uma vez eleito, daria as
costas para o Protocolo de Kyoto.
Estas notícias acenderam no Brasil o alarme nos círculos governamentais,
ambientais e também no mundo dos negócios, principalmente entre aqueles
preocupados com as possíveis mudanças climáticas e os emergentes mercados de
carbono. "O Canadá ganhou o respeito do mundo pela competência e liderança
que mostrou ao presidir as negociações climáticas que ocorreram em dezembro
de 2005 em Montreal, que acabaram por construir um processo para o
aprofundamento e o aumento da abrangência da participação global no regime
internacional do clima sob o Protocolo de Quioto e a Convenção sobre Mudança
do Clima", disse o astrofísico e professor visitante do Instituto de Estudos
Avançados da USP, Luiz Gylvan Meira Filho. "Esta decisão teria um efeito
mais negativo sobre a reputação internacional do Canadá do que a decisão
inicial dos EUA e da Austrália de não assinarem o Protocolo", continuou
Gylvan.
O Professor Gylvan observou também que a comunidade científica do Canadá
conta com uma elevada reputação mundial nos assuntos do clima, e por boas
razões. "É inevitável que depois de uma mudança de posição tão dramática,
surja a percepção que o governo do Canadá, baseado em conclusões de seus
cientistas, concluiu que o aquecimento global não é um problema - uma
posição que não é abraçada por nenhum outro governo, nem mesmo por aqueles
dos EUA, da Austrália e da Rússia", disse o professor Gylvan.
"Os acontecimentos de Montreal mostraram que o governo Bush estava na
contramão da comunidade internacional e também defasado das ações que
acontecem dentro de seu próprio território. A comunidade internacional
claramente quer avançar no enfrentamento das perigosas mudanças climáticas
fortalecendo o regime global do clima, e nós esperamos que o Canadá continue
a ser parte deste esforço. Na reunião das partes do Protocolo de Kyoto que
aconteceu em Montreal, o Canadá resistiu ombro a ombro com o resto do mundo
às tentativas do governo Bush de minar as negociações. Mudar de lado agora
teria um custo enorme para o prestigio internacional de Canadá", disse o
professor Luiz Pinguelli Rosa, Secretário Executivo do Fórum Brasileiro de
Mudanças Climáticas do governo brasileiro.
O Brasil tem sido um importante participante da Convenção do Clima e do
Protocolo de Kyoto, e tem tomado algumas medidas para reduzir as emissões de
gases estufa do país. O setor energético brasileiro tem um dos menores
níveis de emissões de gases estufa do mundo, e o extenso uso de etanol como
combustível para o transporte é amplamente reconhecido como um marco na
redução da dependência de combustíveis fósseis.
"A comunidade empresarial tanto no Brasil quanto no Canadá tem apoiado
fortemente o mercado emergente de carbono construído pelo Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo, criado pelo Protocolo de Quioto. Milhões de dólares
estão sendo investidos em projetos, e o sucesso destes depende da
continuidade dos mercados de carbono. Se o Canadá der as costas para este
processo, fortes dúvidas serão lançadas quanto à credibilidade do país como
um parceiro de negócios", disse Fernando Almeida, presidente executivo do
Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável.
Para o pesquisador associado ao Instituto Vitae Civilis, Mark Lutes, um
canadense que vive e trabalha no Brasil há 10 anos, a perspectiva do Canadá
abandonar o Protocolo de Kyoto seria um desastre para a reputação
internacional do país, e para o seu papel na prevenção de mudanças
climáticas globais perigosas. "Eu sei da importância que o povo do Canadá e
do Brasil dão ao Kyoto. O Protocolo ofereceu a oportunidade de construção
de uma parceira global concreta, e representa a melhor chance para a
prevenção de mudanças climáticas catastróficas. Eu sinceramente espero que
qualquer novo governo canadense continue a refletir as esperanças dos
cidadãos canadenses, e não somente os interesses da industrial petroleira da
província de Alberta e do governo Bush", disse Lutes.
O Protocolo de Kyoto da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do
Clima (UNFCCC na sigla em inglês) foi assinado em 1997 e entrou em vigor em
16 de fevereiro de 2005, depois de ter sido ratificado por 156 países. O
Protocolo é o único acordo mundial que contém metas quantitativas de redução
de emissões de gases de efeito estufa para os países industrializados,
incluindo metas para o Canadá, de acordo com o princípio das
responsabilidades comuns, porém diferenciadas, estabelecido pela UNFCCC. Na
Conferência da UNFCCC realizada em Montreal, em dezembro de 2005, a primeira
que reuniu os membros do Protocolo de Kyoto desde a sua entrada em vigor,
foram iniciadas as negociações sobre o segundo período de compromissos do
Protocolo, que começará em 2012.
(Informações de Vitae Civilis - Instituto para o Desenvolvimento, Meio Ambiente e Paz,
17/01/06 - www.vitaecivilis.org.br)