Aumentam os protestos contra desapropriação de terras e poluição na China
2006-01-19
Uma semana de protestos de aldeões no coração industrial do sul da China pela desapropriação de terras por parte do governo explodiu em violência no fim de semana, com milhares de policiais empunhando armas automáticas e bastões elétricos, buscando reprimir as manifestações, disseram moradores da aldeia na segunda-feira (16/01).
A rápida expansão do país é apontada como causa comum de protestos de aldeões e de acidentes como a contaminação do rio Hu, em dezembro
Os moradores da aldeia, Panlong, na província de Guangdong, disseram que até 60 pessoas ficaram feridas e que pelo menos uma pessoa, uma menina de 13 anos, foi morta pelas forças de segurança. A polícia negou qualquer responsabilidade, dizendo que a garota morreu de ataque cardíaco.
Os aldeões disseram que a polícia perseguiu e bateu tanto nos manifestantes quanto nos espectadores, e que os aldeões retalharam destruindo os carros da polícia e atirando pedras contra as forças de segurança em ataques seguidos de fuga. Os moradores disseram na segunda-feira (16/01) que a aldeia foi isolada, com a polícia monitorando as estradas que conduzem à área para checar identidades e impedir o acesso de forasteiros. Notícias da violência parecem ter sido censuradas na China.
Os moradores de Panlong disseram que sua revolta foi provocada por um programa de aquisição de terras do governo, que disseram tê-los induzido, em 2003, a acreditar que fazia parte de um projeto para construção de uma superestrada ligando a cidade próxima de Zhunai a Pequim. Posteriormente, os aldeões souberam que a terra estava sendo revendida para a criação de uma zona industrial especial para têxteis e produtos químicos.
O confronto em Panlong é a segunda vez em pouco mais de um mês no qual um grande número de forças de segurança chinesas, incluindo tropas paramilitares, é empregado para pôr fim a uma manifestação local. O protesto anterior, a 385 quilômetros ao norte, na aldeia de Dongzhou em 6 de dezembro, em torno da construção de uma usina de força, foi um dos muitos recentes na China motivados pelo meio ambiente e uso das terras, impulsionados pela impossibilidade de se recorrer ao sistema legal do país.
Os protestos coincidiram com relatos de que o reservado líder norte-coreano, Kim Jong Il, estava visitando a província para ver o boom da região industrial do país. A visita, apesar de não confirmada publicamente por Pequim, é um segredo mal guardado, e alguns moradores disseram que sua presença na área no fim de semana pode ter contribuído para o nervosismo das forças de segurança.
Em Panlong no sábado (15/01), o sexto dia de protestos, "a polícia chegou às 20 horas e então começou a bater nas pessoas às 21 horas, tentando dispersar a multidão", disse um professor escolar que falou da aldeia por telefone, dizendo apenas se chamar Yang. "Quando isto aconteceu, a multidão ficou muito furiosa e muitas pessoas pegaram pedras no chão e começaram a atirá-las contra os policiais. Após serem atacados, os policiais ficaram furiosos e começaram a bater em todos usando seus bastões."
Mortes
Os aldeões disseram que as manifestações começaram com as pessoas sentadas em silêncio, mas se tornaram mais tumultuosas a cada dia, à medida que mais pessoas se juntavam. No final, eles disseram, até 10 mil policiais foram dispostos, quase o dobro do número de manifestantes no auge do protesto, segundo algumas estimativas.
Em dezembro, no protesto em Dongzhou, os moradores disseram que até 30 pessoas morreram quando as forças de segurança abriram fogo contra a multidão de aldeões reunida na manifestação contra a construção de uma usina de força movida a carvão em seu meio. Autoridades provinciais reconheceram três mortes, mas culparam os aldeões de terem atacado a polícia. Enquanto isso, as autoridades chinesas restringiram o acesso à aldeia e aparentemente ordenaram às agências de notícias que limitassem sua cobertura do incidente.
Diferente dos eventos em Dongzhou, uma aldeia de pescadores fora do caminho, o mais recente confronto foi em um enclave rural no meio de uma das maiores cidades industriais e que mais crescem na China. A região que cerca Panlong está entre as mais industrializadas do país. Ela foi o laboratório e plataforma de lançamento para as reformas econômicas implementadas pelo líder chinês Deng Xiaoping, responsáveis por reviver a China e transformá-la em uma potência econômica global no espaço de uma geração.
Poluição
Panlong fica a uma curta distância de carro de Shenzhen, Dongguan e Zhuhai -todas cidades grandes e prósperas virtualmente criadas a partir do zero como parte das amplas mudanças econômicas do país. Também não fica distante de Guangzhou, a capital da província, ou de Hong Kong, cujos investimentos ajudaram a alimentar a ascensão da área. A região é cenário não apenas de alguns dos setores que mais crescem na China, incluindo manufatura de alta tecnologia, têxteis e móveis, produtos em grande parte exportados para os Estados Unidos, mas também de parte da pior poluição no país.
Por grande parte do ano a visibilidade nas planícies de cerrado da área é tão ruim que, além de algumas poucas centenas de metros, todos os detalhes são encobertos por uma espessa cortina cinza de névoa que irrita os olhos. O abastecimento de água na área está igualmente ameaçado pela poluição. A situação se tornou tão ruim que mesmo moradores de Hong Kong, cuja economia é totalmente dependente do crescimento da região adjacente, se arrependem do monstro ambiental que ajudaram a criar.
Cada vez mais, a ambivalência deles é compartilhada pelos moradores rurais da região, apesar de terem sido as primeiras pessoas a se beneficiarem com a abertura do país ao investimento estrangeiro e privado. "Nós temos muitas zonas especiais nesta área e cada uma delas atrai investimento", disse um homem que vive em uma aldeia adjacente a Panlong, que foi entrevistado por telefone e disse se chamar Hou. "Os acordos econômicos fechados no passado não foram favoráveis, e muitas zonas já apresentaram protestos menores, mas as pessoas não eram unidas."
"Agora", ele continuou, "há levantes em toda parte".(Reuters, 17/01/06)