Estudo aponta os riscos dos poços de água
2006-01-12
Um dos mitos da cultura gaúcha, o de que água de poços escavados é sempre
cristalina e potável, não condiz com a realidade. Riqueza natural do Rio
Grande do Sul, o sistema de aqüíferos subterrâneos está ameaçado pela
exploração clandestina, pela poluição e pelo falta de saneamento.
O risco de contaminação irreversível foi diagnosticado em um estudo realizado
pelo Estado e pelo governo federal em 6 mil poços perfurados no Estado. A
contaminação pode causar diarréia, hepatite B e fluorose, entre outras
doenças.
As conclusões fazem parte do Mapa Hidrogeológico do Rio Grande do Sul,
produzido pelo Departamento de Recursos Hídricos (DRH), ligado à Secretaria
Estadual de Meio-Ambiente, e pelo Ministério de Minas e Energia. O panorama
das águas subterrâneas do Estado será lançado na segunda-feira (16/01),
depois de três anos de trabalho, e apontará a extensão, a qualidade e a
profundidade dos mananciais, além de revelar os problemas decorrentes da
exploração da água.
Qualidade é comprometida por perfurações indiscriminadas
O diagnóstico indica que os aqüíferos são, de modo geral, de boa qualidade.
Mas há problemas graves e riscos à saúde pública. Exemplo é a abertura
indiscriminada de poços. No Litoral Norte, onde a qualidade da água é boa, as
perfurações sem critérios técnicos - realizadas junto a fossas de esgoto
domésticos ou a depósitos de lixo - estão levando à contaminação dos
mananciais. A poluição da água por coliformes fecais é a causa de grande
parte dos casos de diarréia e hepatite B na região.
- O gaúcho criou o mito de que a água subterrânea é sempre pura. Isso nem
sempre é verdade-, alerta Rogério Dewes, diretor do DRH.
O Planalto é outra região onde a exploração descontrolada é origem de
problemas de saúde pública. Na região, o Aqüífero Guarani tem altíssimo teor
de sais e alta temperatura - ideal para uso em termas, mas imprópria para o
consumo humano. O resultado é a incidência de fluorose, a corrosão dentária
causada pelo excesso de flúor na água.
O quadro atual
Algumas constatações do Mapa Hidrogeológico por região do Rio Grande do Sul:
Norte
Municípios com alta incidência de "poços de fundo de quintal", abertos a
menos de cinco metros de fossas caseiras. Apresentam alto risco de
contaminação por coliformes fecais
Água subterrânea de boa qualidade, mas de baixa quantidade, em função da
cobertura basáltica do manancial
Oeste
Menor camada de basalto recobrindo o manancial, em especial nas imediações de
Livramento e Itaqui
Aqüíferos menores, mas com água de boa qualidade e em boa quantidade
Centro-Leste
No entorno de Erechim e Nova Prata, aqüíferos de grande profundidade - até
800 metros
Água com alta concentração de sais e de alta temperatura, ideal para
exploração por termas, mas imprópria para o consumo humano
Centro
As redondezas de São Sepé e Caçapava do Sul são marcadas pela pobreza em
mananciais de água subterrânea. Exploração, de modo geral, não redunda em
poços de boa qualidade
Litoral
Água subterrânea de boa qualidade e de acesso relativamente fácil, graças ao
solo arenoso
Alto risco de contaminação por falta de redes de esgotos e pela proximidade
dos poços já abertos às fossas residenciais. O excesso de coliformes fecais é
razão de casos de hepatite e de diarréia.
Aqüífero não é 100% potável
A água explorada de forma irresponsável que causa o desgaste prematuro e
acentuado da arcada dentária de crianças do Planalto é extraída do Aqüífero
Guarani.
A constatação desmente a idéia corrente entre pesquisadores de que o
principal manancial de água subterrânea do Estado seja um rio de água doce,
cristalina e pura.
O Aqüífero Guarani é, na realidade, um sistema gigante de aqüíferos que
confluem no subsolo do Rio Grande do Sul. O levantamento confirma a tese do
geólogo José Luiz Flores Machado, membro da equipe da CPRM e um dos
coordenadores do mapa. Em diferentes regiões, o Guarani apresenta graus
diversos de pureza e não é uma fonte inconteste de água potável.
- O Aqüífero Guarani não é um lago ou um rio subterrâneo, como se imaginava.
É um sistema, com qualidade de água melhor ou pior-, afirma Douglas Trainini,
chefe do projeto. (ZH, 12/01)