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2006-01-10
O projeto de lei de Gestão de Florestas Públicas divide opiniões no Brasil, mas é a grande aposta para reduzir o desmatamento feita pelo Ministério do Meio Ambiente e pela maioria dos ambientalistas que lutam por sua rápida aprovação no Senado. É um instrumento-chave para consolidar a tendência conseguida este ano de redução no corte de árvores na Amazônia, segundo a ministra Maria Silva, que propôs a nova legislação em fevereiro passado e após um longo processo de debates e consultas com todos os setores interessados, pesquisadores e ecologistas.

O projeto, já aprovado na Câmara Federal, permite a concessão de áreas públicas para a exploração sustentável por parte de empresas privadas, organizações não-governamentais e comunidades locais por até 40 anos. Porém, os opositores afirmam que seu sucesso é improvável. Experiências semelhantes em países da África e Ásia não impediram a devastação de florestas nem melhoraram a vida das populações locais, segundo Niro Higuchi, especialista em manejo florestal do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).

É que o projeto legal não terá viabilidade econômica, diante da competição com a madeira produzida ilegalmente, sempre mais barata, e da grande diversidade vegetal amazônica que encarece as árvores aproveitáveis em extensas áreas, argumentam outros, como o jornalista Washington Novaes, ex-secretário de Meio Ambiente do Distrito Federal. Além disso, duvida-se da aplicação de uma nova lei na vasta região amazônica, a exemplo do que ocorre com as legislações em vigor que não conseguem conter atividades ilegais como a extração depredadora de madeira, o desmatamento total de imensas áreas e os incêndios.

Porém, muitas empresas do setor não pensam assim. “A indústria de base florestal que quiser respeitar a legislação precisa dessa lei para poder competir em condições de igualdade com os que operam na ilegalidade ou na informalidade”, afirma um manifesto que associações empresariais assinaram, juntamente com ambientalistas, indígenas e movimentos sociais, no dia 14 de dezembro. Em uma aliança inédita, associações das indústrias de madeira, papel e celulose, e de exportadores de madeira se uniram a ONGs e movimentos sociais para divulgar o manifesto conjunto e pedir ao Senado urgência na aprovação da lei.

A economia de base florestal necessita de “condições estáveis” e garantias de larguíssimo prazo para seus investimentos, que exigem décadas de amadurecimento, explicou à IPS Adalberto Veríssimo, um agrônomo que há duas décadas acompanha a atividade madeireira como pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). A lei de Gestão de Florestas Públicas terá como principal fruto a regularização da propriedade da terra de grande parte da Amazônia, “o começo correto e a base legal que é ponto de partida para desenvolver uma economia florestal sustentável”, afirmou.

A viabilidade econômica e técnica de extração sustentável de madeira na Amazônia já estão comprovadas por muitos estudos e experiências práticas de manejo florestal, afirmou Guilherme de Carvalho, engenheiro florestal e diretor técnico da Associação das Indústrias Exportadoras de Madeira do Estado do Pará (Aimex). Inventários feitos com seriedade apontaram a disponibilidade de 15 a 40 metros cúbicos de madeira por hectare, um volume suficiente para tornar viável a atividade, assegurou. O setor apenas necessita de “estabilidade na legislação que lhe permita trabalhar com vistas ao futuro”, superando a insegurança atual, para ampliar sua oferta de madeira certificada e assim contribuir para reduzir o corte ilegal, acrescentou.

Com relação às experiências estrangeiras fracassadas, Carvalho disse que a realidade mundial mudou, com os consumidores mais conscientes das exigências ambientais, e, além disso, o Brasil tem características distintas, como “a legislação ambiental mais rigorosa do mundo”. Na Amazônia brasileira, 76% são terras públicas e apenas 29% já estão protegidos como áreas de conservação ou territórios indígenas, destacou a ministra ao justificar o projeto de lei. Os 47% restantes são áreas à mercê de constantes invasões por grileiros, que as desmatam rapidamente para garantir a posse, muitas vezes com violência e assassinatos expulsando populações tradicionais.

Nesse sentido, a proposta pretende evitar a privatização dessas terras públicas e não o contrário, como acusam os críticos. Trata-se de o Estado “reassumir o controle sobre um patrimônio público”, por fim ao caos e reduzir a violência, segundo os ambientalistas. Os deputados alteraram a proposta original do ministério, baixando de 60 para 40 anos o período máximo de concessão e excluindo empresas e ONGs estrangeiras das concessões, mas não suas filiais instaladas de acordo com as leis nacionais e com sede no País. Para efetivar a inspeção e aplicação mais rigorosa da nova lei será criado o Sistema Florestal Brasileiro e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal, que disporá de parte da renda gerada pelas concessões de florestas públicas para exploração com manejo sustentável.

“Dizer que nenhuma atividade legal pode competir com a ilegal é uma comparação equivocada”, afirmou Veríssimo, apontando dificuldades econômicas na idéia. No Brasil, quase todos os setores convivem com a competição ilegal ou informal, mas não deixam de ser viáveis. Atualmente, cerca de metade da madeira extraída da Amazônia é ilegal, mas sua participação tenderá a diminuir se a lei for aprovada, e será “residual dentro de 10 anos”, ressaltou. Além disso, as concessões não se limitarão à exploração de madeira, mas de outros produtos florestais, como frutas, substâncias medicinais e cosméticas, resinas, alimentos e óleos que exigem a manutenção das florestas em pé.
(Mário Osava - IPS/Envolverde, 09/01/2006)

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