Guia contra bombas nucleares do governo americano desperta críticas
2006-01-06
Um ataque terrorista com uso de dispositivo nuclear – a chamada bomba suja – poderia contaminar pessoas de um prédio a muitas quadras dali, deixando uma vasta área não habitada. Pois agora o governo dos Estados Unidos lançou um guia de limpeza que, na avaliação de alguns críticos, traz procedimentos que poderiam expor pessoas a elevado risco de câncer no caso de voltarem às áreas já descontaminadas.
O guia, lançado nesta terça-feira (03/01) pelo Departamento de Segurança Interna, determina padrões de limpeza que, em alguns casos, são menos exigentes do que o requerido para os chamados sítios do Superfund, bem como para plantas nucleares comerciais e para áreas de aterro de resíduos nucleares.
A exposição à radiação em longo prazo com o uso de alguns padrões de limpeza designados no guia poderia ser maior do que 10 mil milirems por ano, o equivalente a mais de 1,6 mil raios-X do peito, ou 30 vezes a média de radiação de fontes naturais.
Comparativamente, a Comissão Regulatória Nuclear limita a exposição pública das unidades que licencia a não mais de 100 milirems por ano. O limite de exposição à radiação do futuro sítio nuclear de Yucca Mountain, que abrigará resíduos desta natureza, é de 15 milirems por ano.
A exposição permitida pelas novas diretrizes do guia de Segurança Interna “poderia causar câncer em uma entre quatro pessoas” se elas retornassem ao sítio que foi atacado, afirma Diane D Arrigo, do Serviço de Recursos de Informações Nucleares, um grupo observador que tem lutado por requerimentos federais mais rigorosos nesta área. A Agência de Proteção Ambiental (EPA) limita o risco de câncer adicional a 1 em cada 10 mil nos sítios tóxicos nucleares, quando são saneados de acordo com as normas do Superfund.
O guia, elaborado durante vários anos, é destinado a ajudar funcionários locais, estaduais e federais a planejarem como eles poderão lidar com uma situação de ataque terrorista no local onde foi liberada radioatividade. Um ataque usando os chamados dispositivos nucleares crus que produz uma detonação nuclear poderia contaminar quadras a muitas milhas. Uma bomba suja – mistura de explosivo convencional com uma fonte de radiação, tal como o Césio 137, usado em tratamentos médicos – provavelmente teria um impacto mais confinado, talvez em um prédio ou em vários blocos, afirma o guia.
Abordagem Flexível
Donald Tighe, porta-voz do Escritório de Ciência e Tecnologia da Casa Branca, disse que os guias especificamente evitaram o estabelecimento de um padrão numérico de limpeza, pois existe uma ampla gama de potenciais cenários de descontaminação.
Em longo prazo, uma comunidade teria que “ter uma avaliação não apenas de saúde pública, mas da saúde da comunidade", afirmou Tighe. "É este o retorno que temos tido dos agentes locais e estaduais. Eles querem uma abordagem flexível", acrescentou.
Desta forma, o guia apresenta vários benchmarks (valores de referência) usados por outras agências, bem como por organizações internacionais. Um dos valores de referência que poderia ser utilizado é o padrão estabelecido pela Comissão Internacional de Proteção Radioativa, um grupo com sede em Londres, que mantém uma liberação de 10 mil milirems por ano como um valor aceitável para exposição padrão após a descontaminação.
Daniel Hirsch, presidente de um grupo observador de uma ONG local, disse que há uma força-tarefa claramente em favor desse padrão. Hirsch acusou o Departamento de Segurança Interna de "propor um Katrina nuclear, uma política formal de permitir a exposição pública a massivas doses de radiação a partir de uma bomba suja, enquanto o governo não faz nada para proteger as pessoas". (Fonte: Chicago Tribune, 4/1)