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2006-01-02
O arquipélago de Fernando de Noronha enfrenta um prolongado período de seca e se prepara para a falta de água em plena alta temporada. O açude do Xaréu, que capta água de chuva e é a principal fonte de abastecimento local, está com menos de 5% da sua capacidade por causa das poucas chuvas neste ano. Paraíso ecológico e patrimônio mundial natural, Noronha tem 17 quilômetros quadrados e abriga 4,5 mil pessoas, incluindo turistas e visitantes.

Um dessalinizador foi instalado pelo governo de Pernambuco - Estado ao qual pertence o arquipélago - e começou a funcionar neste ano, utilizando água do mar. Mas não é suficiente. Carros-pipa reforçam o abastecimento, buscando água em um poço da Aeronáutica. Na semana passada, com as pousadas lotadas, o dessalinizador quebrou. Mas voltou à carga anteontem.

Os donos de pousadas - há mais de cem pequenos estabelecimentos em Noronha - não escondiam o desespero. Os cerca de mil turistas não chegaram a perceber a batalha travada nos bastidores pelos proprietários para não faltar água para as necessidades básicas.

Em qualquer tempo do ano, os hóspedes são instados a racionar o uso da água. "Por favor, tome um só banho por dia", "feche o chuveiro enquanto usa o sabonete e o xampu" e "não deixe a torneira aberta enquanto escova os dentes" são alguns dos pedidos feitos pelos donos das pousadas. Diariamente, a emissora de TV local, a TV Golfinho, informa os locais onde haverá distribuição de água no dia seguinte. Os moradores estocam água em baldes e nas suas caixas até a próxima distribuição.

Nos últimos sete dias, considerados críticos, inserções nos intervalos comerciais na TV e na rádio FM Noronha reforçaram a necessidade de não desperdiçar água. Imagens do Xaréu, quase seco, são mostradas. A campanha está mantida mesmo com o conserto do dessalinizador.

"Todo ano é a mesma coisa, só muda a intensidade", conta André Sampaio, dono da Pousada da Morena, cansado de conviver com o que qualifica de "política do apaga-incêndio". "O problema é histórico. Não tem por que não haver planejamento, com soluções em vez de paliativos". Ele diz que acorda estressado todos os dias, temendo "o caos". Um dos seus 17 funcionários tem a missão exclusiva de buscar água. "Com o equipamento consertado, o fantasma da crise passou. Mas o alívio é temporário. Esse é o nosso do dia-a-dia."

Ex-funcionário da administração de Noronha, ele explica que, em relação a 1990, a população dobrou e o número de pousadas triplicou, reduzindo, conseqüentemente, a oferta de água. O consumo médio de água da população, de acordo com a administração local, varia de 450 a 800 metros cúbicos por dia.

Segundo o administrador de Fernando de Noronha, Edrise Aires, uma série de imprevistos e contratempos provocaram a atual crise. Quando a bomba de captação de água do dessalinizador quebrou, há uma semana, foi substituída pela bomba reserva, que também pifou. Um mecânico viajou do Recife, a 545 quilômetros dali, na noite da terça-feira levando o equipamento para o conserto da bomba. Sua bagagem, assim como a de todos os passageiros que viajaram no mesmo avião, foi parar em Aracaju.

Três caminhões-pipa passaram a fornecer um mínimo de água para a população. Diante da grande demanda, um carro do Corpo de Bombeiros foi integrado à tarefa. O freio do veículo quebrou e prejudicou a programação.

O administrador aceita as queixas da população. Esclarece, no entanto, que as providências estão sendo tomadas e que a partir de 2006 os que moram em Noronha vão ter mais segurança no abastecimento de água. O dessalinizador, que fornece 380 metros cúbicos de água por dia, terá vazão ampliada. Passará a produzir 580 metros cúbicos por dia em janeiro. Assim, a água das chuvas poderá ser economizada, permitindo que o açude do Xaréu volte a encher.

CARROS-PIPA

A Pousada Zé Maria, a maior e uma das mais sofisticadas da ilha, está com sua capacidade total de 42 hóspedes. Apesar do privilégio de ter carro-pipa próprio, há dois meses passou a pedir a seus funcionários que não mais tomassem banho na pousada. Há 15 dias, segundo o gerente Expedido Elias, os funcionários tiveram de começar a usar pratos e talheres descartáveis em suas refeições. "Os clientes não foram afetados."

"Para receber água do carro-pipa, a gente tem de se inscrever na companhia de água e saneamento. Se a fila de solicitantes for grande, é um horror, porque demora muito", afirma Lourival Armando da Silva, dono da Pousada Atalaia, de dez leitos. Ele pega água do poço da Aeronáutica usando carro, carroça e buggy. "A gente recebe água um dia sim, em horário específico, e dois dias não. Quando o dessalinizador não funciona, a precariedade é total."

Moradora do arquipélago, Geísa Poliana preencheu uma ficha na companhia de saneamento para receber água no início da semana. "Até que tive sorte. O carro chegou depois de dois dias e encheu a caixa de mil litros, que estava seca." (O Estado de S. Paulo, 30/12)

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