A natureza saqueada
2005-12-28
Campeão mundial em biodiversidade, o Brasil segue sua sina de vítima da biopirataria
internacional, iniciada no Descobrimento, quando florestas da planta que deu nome
ao país foram decepadas por mercadores portugueses.
Hoje, o pau-brasil é uma árvore rara até em jardins botânicos, e os exploradores
da natureza têm um novo alvo: o sapo verde nativo da selva acreana, cuja secreção
tem poderes medicinais.
Cobiçado pela indústria internacional de fármacos por suas propriedades medicinais,
o batráquio Phyllomedusa bicolor , popularmente conhecido como Kampô, tem
sido motivo de expedições de traficantes de animais na Floresta Amazônica e virou
símbolo da batalha contra a biopirataria no Brasil.
O Kampô é apenas o caso mais notório. Dono de 20% de todo o estoque de espécies
e da maior floresta tropical do planeta, o país atrai exploradores que estão
dilapidando um patrimônio genético estimado em R$ 4,5 trilhões pelo Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada. Disfarçados como turistas, cientistas e até
missionários, mercadores de jalecos brancos ou com bíblia na mão se apropriam de
substâncias e dos conhecimentos dos nativos.
Da Amazônia, da Mata Atlântica e do Pantanal, levam para o exterior ovo de aranha,
veneno de cobra, secreção de sapo, plantas, essências e até sangue de índio.
Sapo que vale como príncipe
A partir de meados de 2006, um exército de cientistas, médicos, bioquímicos e
biólogos de duas dezenas de importantes instituições de pesquisas públicas e
privadas do país vai desembarcar no Acre, no norte brasileiro.
O grupo faz parte do Projeto Kampô, idealizado pelo Ministério do Meio Ambiente,
para identificar propriedades medicinais apontadas por tribos indígenas e estancar
o desvio para o exterior do Phyllomedusa bicolor , popularmente conhecido
como kampô.
Ao se sentir ameaçado, o batráquio produz uma secreção cutânea venenosa a seus
predadores, usada a tempos como vacina contra picada de cobra pelos índios das
tribos katukina, yawanawá e kaxinawá. Curandeiros da selva garantem que a vacina
também elimina úlceras, gastrites e problemas de intestino e estômago, além de
propiciar aos índios sucesso com a caça e com as mulheres.
Conforme o advogado Eugênio Pantoja, coordenador da ONG Amazonlink, que lidera
uma campanha contra a biopirataria no Acre, existem pelo menos 10 patentes
internacionais com princípios ativos originários da secreção do kampô.
Além de analgésico e medicamento contra doenças do coração e derrames, material
genético do sapo também é estudado por conter propriedades antibióticas para
fortalecimento do sistema imunológico e para tratamento do Mal de Parkinson e
de câncer. (ZH, 27/12)