Reaproveitamento de água ganha força
2005-12-22
Sem que percebamos, temos um enorme gasto com a água. Essa fonte de vida é usada
para suprir desde necessidades básicas até ações de maior demanda, como lavar
carros, calçadas e moradias. Em uma medida muito maior, as empresas gastam
diariamente uma enorme quantidade de água como matéria-prima e em atividades de
limpeza e manutenção. Percebendo que esse uso, apesar de necessário, afeta
diretamente o meio ambiente, crescem iniciativas para estimular o
reaproveitamento de água.
O Instituto de Pesquisa Hidráulicas (IPH), da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS) está desenvolvendo pesquisas no sentido de verificar o
processamento e reuso de águas de efluentes para utilização agrícola.
O professor Luiz Monteggia, à frente do projeto, destaca que as águas
provenientes de esgoto podem ser tratadas e reutilizadas na irrigação de
culturas de aveia e milho, por exemplo, porque essas águas apresentam muitos dos
nutrientes encontrados nas águas residuais, principalmente nitrogênio e fósforo.
Monteggia ressalta que as águas tratadas de efluentes poderiam ser reutilizadas
também em vários outros setores, como em refrigeração de torres de usinas
termoelétrica, torres de ar-condicionado central das grandes empresas, no
combate a incêndios, lavagem de pátios e veículos.
Segundo Monteggia, a pesquisa está focada em definir os níveis de qualidade
adequada para o reuso em atividade agrícola e estudar o impacto que esse
reaproveitamento pode provocar nas áreas irrigadas com essa água.
O sistema desenvolvido pelo IPH é constituído por um reator anaeróbio seguido de
um conjunto de lagoas de estabilização que estão instalados junto à estação de
tratamento de efluentes do bairro São Geraldo. Através de um processo
físico-químico de depuração é possível processar dois metros cúbicos por hora.
Além da pesquisa acadêmica, que tem como preocupação a preservação deste bem tão
valioso que é a água, postos de gasolina e empresas de transporte coletivo, que
geralmente gastam uma enorme quantidade de água para lavar veículos e realizar
manutenções, também estão pensando em minimizar os desperdícios e preservar o
meio ambiente. Em Porto Alegre a Empresa de Transportes Trevo já implantou um
sistema para o reuso da água. O processo é extremamente simples e eficiente do
ponto de vista ambiental e, ao mesmo tempo, possibilita uma grande economia de
custos para a empresa.
O gerente de manutenção da empresa, Alaor Vargas, de 44 anos, desenvolveu um
sistema de recuperação de água por decantação e filtragem. A água da lavagem dos
ônibus passa primeiramente por uma caixa separadora de óleo e lama (CSOL) e,
posteriormente, por um sistema básico de decantação, onde também é filtrada ao
passar por estruturas metálicas revestidas com feltro existente em duas caixas
menores. A seguir, é depositada em um reservatório maior e, depois desse
processamento, a água está pronta para o reuso.
Este sistema permite a reutilização de 80% da água utilizada pela empresa na
lavagem dos ônibus e, segundo Vargas, a implantação atende tanto aos interesses
pela conscientização ambiental, quanto aos de ordem econômica. Com o início da
operação do sistema, a empresa registrou uma redução de custos com água da rede
pública em torno de R$ 8 mil. O gerente de manutenção aponta como um grande
benefício o menor consumo de água dos poços artesianos que a empresa dispõe.
Aos poucos, as pessoas estão seguindo o exemplo e também realizando ações em
prol do meio ambiente. Focada no reaproveitamento de água e na economia, a
arquiteta Cláudia Jahnel pretende implementar medidas de reaproveitamento e
captação de água na construção de sua casa. Julgando ser muito mais simples
implantar tais processos durante a construção, Cláudia pretende instalar uma
cisterna e se inspirar em outras iniciativas para criar sistemas onde, por
exemplo, a água do chuveiro é reaproveitada para ser usada no vaso sanitário.
Assim como Cláudia, Suzette Angeli também é uma das adeptas da cisterna. Com a
água captada da chuva, a procuradora aposentada rega sua horta e, futuramente,
quer qualificar o uso desse líquido valioso, reaproveitando-o também no banheiro.
Adepta da técnica da permacultura, Suzette cultiva legumes, verduras e frutas
sem o uso de agrotóxicos e procura reduzir a água, evitando o desperdício. – É
muito importante ter essa preocupação com a natureza-, constata, dizendo que a
economia no bolso se reflete diretamente na consciência de que está contribuindo
para melhorar o meio ambiente.
Quando o assunto é o reuso da água, a professora da UFRGS e ambientalista da ONG
IGRÉ- Amigos da água, Georgina Buckup é enfática ao afirmar que o processo é
essencialmente técnico e envolve várias facetas, uma vez que apresenta uma
metodologia específica para cada finalidade, já que o reuso para consumo humano
requer uma tecnologia e um custo que são diferenciados do emprego industrial e
agrícola.
A ambientalista se mostra preocupada com a questão, principalmente porque a água
tratada para o reuso conserva todos os patógenos e pode causar doenças ao ser
humano, por isso é contra o reuso para consumo humano. Para ela a questão tem
que ser encarada com bastante seriedade. Georgina lembra também que o brasileiro
não tem a cultura de economizar água e, muitas vezes, a utiliza de forma
indiscriminada lavando calcadas, pisos equipamentos industriais.
Felizmente, diante de um tema extremamente importante, tem surgido alternativas
inovadoras na área da pesquisa. O Laboratório de Tecnologia Mineral e Ambiental
(LTM) da Escola de Engenharia da UFRGS desenvolveu em 2003 um sistema compacto
para tratamento e reuso da água proveniente da lavagem de veículos e de
efluentes similares.
Na época foi criada, por pesquisadores do LTM-UFRGS a empresa Aquaflop, para
realizar a transferência desta tecnologia às empresas interessadas na sua
utilização.
O sistema desenvolvido pelo LTM-UFRGS e operacionalizado pela Aquaflop consiste
na aplicação das técnicas de floculação e flotação para a remoção de óleos,
sólidos e outros poluentes. A Estação Compacta de Tratamento e Reuso de Água
operacionalizada pela Aquaflop está baseada no emprego de Flotação por Ar
Dissolvido (FAD) para separação dos resíduos presentes na água da lavagem de
veículos. Durante o processo são adicionados, sob agitação, produtos químicos
específicos como neutralizantes, coagulantes e floculantes para promover a
aglomeração dos resíduos dispersos no efluente. Por fim, a injeção de um fluxo
controlado de água pressurizada formará pequenas bolhas de ar no fluxo de
efluente que, ao entrarem em contato com os flocos de sujeira, promovem o
fenômeno de formação de flocos aerados que ascendem à superfície do tanque e são
removidos por raspagem.
Atualmente uma empresa de transporte coletivo e um posto de lavagem de veículos
de Porto Alegre, uma empresa de transporte coletivo de Viamão e uma empresa de
transporte e logística de Lajeado reusam água através do sistema criado pelo
LTM-UFRGS. Somente uma das empresas de transporte coletivo lava em média 90
ônibus por dia com água processada pela estação de tratamento comercializada
pela Aquaflop e obtém redução de 70% no consumo da água distribuída pela rede
pública. O custo da estação de tratamento fica em torno de R$ 35.000,00 e, no
ano de 2004, a empresa Aquaflop já exportou a tecnologia, instalando uma estação
de tratamento na cidade de Dubai, nos Emirados Árabes. (Revista Oca, Ufrgs,
15/12)