Na rota do milho transgênico
2005-12-19
Seduzidos pelos bons resultados com a soja transgênica e movidos pela
curiosidade, produtores gaúchos recorreram este ano à Argentina na busca pelo
milho transgênico.
O interesse despertado pelos agricultores também aguçou os contrabandistas
rurais, que trazem irregularmente ao Brasil a semente para quem não pôde ou não
quis se arriscar em cruzar a fronteira.
No dia 3 de dezembro, Zero Hora mostrou que o plantio à margem da lei está
ocorrendo no Estado. Como no Brasil a Lei de Biossegurança, regulamentada em
novembro, proíbe a comercialização e o plantio do milho transgênico, todas as
sementes plantadas no Estado são contrabandeadas, provavelmente da Argentina,
onde a transgenia do produto é autorizada.
Foi no território vizinho que produtores e contrabandistas buscaram os grãos
certificados pela Monsanto e sem registro, vendidos em sacos brancos. Zero Hora
cruzou a fronteira para conferir como é o comércio do produto na Argentina e
como o milho entra no Brasil. Uma das principais rotas de ingresso, conforme os
próprios produtores, é por Porto Xavier, município que faz fronteira com a
argentina San Javier.
Jorge Truquin, proprietário de uma agropecuária de San Javier, confirmou ter
recebido em seu negócio dezenas de agricultores gaúchos em busca do produto.
Com receio de falar para a imprensa, disse não ter feito a venda, mas que
poderia conseguir até a semente não-certificado em cidades próximas.
- Muitos brasileiros me pedem milho transgênico. Querem cruzar o rio-, contou
Truquin.
Agricultor de Pontão semeou cinco hectares
A 70 quilômetros dali, em Oberá, na província de Misiones, o milho transgênico
é vendido com facilidade nas agropecuárias. Exposto em sacos plásticos, o grão
da marca Dekalb, da Monsanto, é negociado em quilo ou em sacas de 20 quilos. Os
comerciantes argentinos evitam falar porque sabem que o grão é contrabandeado
para o Brasil.
Em uma propriedade do município de Pontão, no norte do Rio Grande do Sul, um
produtor de 39 anos investiu no milho transgênico, mas está preocupado com o
desenvolvimento da lavoura.
Ele utilizou semente geneticamente modificada não-certificada em cinco dos 15
hectares da propriedade, adquiridas em Carazinho, a R$ 240 a saca. O que restou
está bem guardado no galpão, sem que ninguém saiba. A dúvida é se realmente vai
usá-las no próximo ano.
Na área onde está o produto transgênico é visível a disparidade. Há plantas com
dois metros de altura e já com espiga formada e outras com menos de 30
centímetros, ainda no desenvolvimento vegetativo. (ZH, 18/12)
Sem saber que estava sendo gravado, o vendedor de uma agropecuária de Oberá, na
Argentina, admitiu à reportagem ter vendido milho transgênico para brasileiros.
Mais tarde, ele e seu chefe negaram negociar o produto a brasileiros. Veja
trechos da conversa.
A gravação
Zero Hora - Tem milho transgênico?
Vendedor - Tem sim.
ZH - É o certificado pela Monsanto?
Vendedor - É da Monsanto. É 26 pesos (R$ 23,92) o quilo.
ZH - Não tem transgênico não-certificado, da sacola branca?
Vendedor - Não temos. É que nós não podemos trabalhar. Temos que pensar que no
ano que vem tu vai vir comprar de novo.
ZH - Os brasileiros estão comprando bastante desse aqui para levar?
Vendedor - Compram muito.
ZH - O transgênico no Brasil é proibido, né?
Vendedor - Tudo que é proibido o Brasil gosta, brasileiro gosta de comprar.
ZH - Mas levam para distribuir?
Vendedor - Claro. Compram 20 ou 30 bolsas, passam para Porto Xavier, e os tipos
vêm e levam. (ZH, 18/12)