Poluição compromete o sustento dos pescadores
2005-12-16
Os pescadores da Ilha da Pintada, em Porto Alegre, conservam os hábitos
repassados de geração em geração, como a elaboração do peixe na taquara, o
artesanato e a lida da pesca no Lago Guaíba. Os problemas ambientais gerados
pela extração indevida de areia nas margens, pelo lixo e plásticos que acabam
indo para a água e ainda pela substituição da mata nativa pelo cultivo de
eucalipto estão comprometendo o sustento das famílias com a pesca. São
justamente esses problemas que estão mobilizando as lideranças da Colônia de
Pescadores Z-5 para despertar os moradores da Ilha para a preservação desse
patrimônio histórico, cultural e turístico.
A colônia de pescadores Z-5 é uma entidade sem fins lucrativos que visa a
defender o pescador e foi criada em 1924 na Ilha da Pintada. Na época, a
fiscalização da Marinha e a falta de representatividade dos pescadores motivaram
a criação de colônias no Rio Grande do Sul. Atualmente existem 21 colônias e 3
sindicatos do estado. Com a necessidade de criar uma alternativa de produção de
renda para o trabalho dos pescadores da colônia, foi fundada em 1999 a
Cooperativa de Pescadores da Colônia Z-5 (Coopeixe), que se constitui em um
braço da colônia. A cooperativa, através de parcerias técnicas e de crédito
com o Sebrae, a Smic, a Secretaria de Aqüicultura e Pesca ligada ao Governo
Federal, a Emater/RS-Ascar e a Conab, consegue financiamento para compra de
equipamentos de pesca.
Aos poucos, a cooperativa foi conquistando espaço e entrou no mercado, abrindo
um ponto de comercialização de peixes no Mercado Público de Porto Alegre. Os
moradores da Ilha da Pintada também descobriram no turismo uma forma de gerar
renda e atrair visitantes para conhecerem um pouco da cultura e da gastronomia
dos pescadores. A sede abriga um restaurante que serve o famoso peixe na taquara
e dependendo da época, é possível saborear o Biru, o Pintado, a Tainha, o Bagre
e a Piava. Para se chegar lá, pode-se ir de barco, com a saída do cais do porto,
ou então de carro, atravessando a ponte do Guaíba.
Além disso, a cooperativa se preocupa com a conscientização das famílias para a
conservação do meio ambiente, principalmente da água, que é de onde sai o
sustento do pescador.
O trabalho ainda é lento e carece de mais parcerias na área de educação
ambiental. Esse projeto pode ser desenvolvido também, com estudantes
universitários das áreas de biologia, educação e comunicação. Para falar mais
sobre a importância da conscientização do uso da água, a revista OCA conversou
com o Presidente da Colônia Z5, Valdir Coelho.
OCA: Quais os cuidados que o pescador deve ter com o meio ambiente?
Valdir Coelho: Nós deveríamos ter em todo e qualquer projeto, em qualquer local,
como assunto principal, o meio ambiente. Especialmente a preservação da água,
até porque a gente tira o sustento dali. Uma coisa que está se agravando muito,
mas ainda não é alarmante é a poluição gerada pelo plástico. Tu passas pela
margem do rio e percebes que até a natureza já se adaptou. Tu olhas tudo
verdezinho e, em cima daquele verde, é tudo plástico, garrafas, pneus. Então tu
pões uma rede e tu não consegues puxá-la por causa dos plásticos. Além da
própria extração de areia indevidamente nas margens dos rios, que é um outro
problema ambiental que está ocorrendo muito.
OCA: Então a culpa da poluição é mais da população ribeirinha ou das grandes
empresas?
Valdir Coelho: Todos nós temos uma parcela de culpa. O alarmante mesmo são as
reciclagens de lixo nas ilhas. É preciso construir um lugar adequado. Nas cheias
vai todo lixo pro rio. Está horrível! Eu que nasci na ilha, acho que daqui uns
30 anos não vai mais se possível colocar uma rede. Hoje, debaixo do rio, quando
se larga uma garrateia vem lixo de todos os lados. Pros lados de Guaíba existiam
as matas nativas, araçá, butiá, coquinho, tambuim... hoje não existe mais nada,
é só eucalipto. Morreu tudo. E Aracruz ainda diz que é tudo em nome da geração
de emprego. Mas isso é uma violência, eles colocam veneno nas mudas e isso vai
direto para o rio e mata tudo.
OCA: E a responsabilidade de fiscalização do poder público?
Valdir Coelho: O governo tem uma grande responsabilidade, mas cada um de nós
também tem. Só o poder público não vai conseguir frear esse processo. É
necessária uma conscientização geral.
OCA: E como conscientizar as pessoas?
Valdir Coelho: Nós temos que fazer nossa parte pra despertar. Acho que tem que
ter uma parceria com as escolas. Existem pessoas com idade avançada que atiram
saco de lixo no rio. Tem que trabalhar e começar pelas crianças para que elas
conscientizem os adultos. É um trabalho que está parado. Tem mais de 7 mil
habitantes na Ilha. As crianças moram e estudam aqui, são ligadas aos pescadores,
essa iniciativa seria um despertar. (Revista Oca/UFRGS, 15/10