Artigo: Plantações Florestais no RS - Desafios e Oportunidades ou Empreendimentos Destruidores do Pampa?
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2005-12-12
Uma seqüência de discursos absurdos e falsos que não podiam ser questionados. Parece uma boa definição para este encontro de um dia ocorrido no auditório da FFFCMPA. A proposição de um encontro para debate conforme divulgado na imprensa ficou só no papel. O papel aceita tudo. E o data show também.
Para se ter uma idéia de cerca das 6 horas de Seminário, 35 minutos foram destinados aos ambientalistas por eles convidados: 25 minutos para Prof. Buckup da UFRGS e 10 minutos para Kathia do Núcleo de Amigos da Terra. Houve também uma colocação no início do Seminário pela Lara da Fundação Gaia, que não estava na programação.
Um pequeno espaço de tempo foi dado as perguntas escritas. As perguntas foram selecionadas descaradamente pelo facilitador da mesa. Respostas as perguntas da mesa da manhã foram cortadas, com a desculpa da falta de tempo, ficando a promessa que seriam retomadas pela tarde. Só teve uso do microfone os painelistas da mesa. Como um claro demonstrativo de domínio do poder. Belo debate este.
Mas tantas mentiras descaradas geram reações distintas nas pessoas, alguns se iludem, a outros causa náudeas, revolta no estômago. Outros contestam na hora. Escutar o Diretor da Aracruz falar que quer o bem da população e blá, blá, sabendo que a Aracruz invadiu terras indígenas, quilombolas, terras que iriam para reforma agrária com suas monoculturas de árvores para exportação. Que esta empresa neste exato minuto persegue e mata pessoas, não respeita os direitos de seus trabalhadores, trabalhadores muitos deles mutilados, é demais. Da platéia uma contestação. Inesperada pelo diretor. Uma única contestação foi suficiente neste momento, para mostrar que NÃO está tudo bem.
Falsas impressões estão sendo passadas para o público. Especialmente quando se fala em conservação da natureza. Para as pessoas leigas fica a idéia de que as empresas conservam áreas naturais porque elas são boas, competentes e cuidam da natureza.. Estas áreas que as empresas conservam são na verdade as Areas de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal, uma obrigação por lei. O poder público, através da Secretaria Estadual do Meio Ambiente é aliado em propagar esta idéia errônea para a população. Disponibilizando inclusive seus técnicos e funcionários para auxílio na recuperação das matas ciliares nas áreas das empresas, um serviço que não é disponibilizado para o cidadão comum..
As APPs dizem respeito a conservação de nascentes, olhos dágua, beira de arroios e córregos, banhados e áreas de reprodução de fauna o que é hoje uma imposição do Código Florestal e obrigação de todo proprietário de terra. Além destas áreas, para o pampa, uma percentagem de 20% da área total da propriedade deve ser averbado junto ao órgão competente, como Reserva Legal. Inserir na legislação a preservação destas áreas foi uma batalha e deve agora ser consolidada pelas pessoas que se importam o mínimo com a conservação da natureza.
Para os desenvolvimentistas lhes falta critérios e a conservação da natureza aparece como um entrave. Para os desenvolvimentistas explorar madeira no RS, tendo com isto reduzido a Mata Atlântica aos atuais índices de menos de 3% no estado, não representa problema algum. Foi o que alavancouo RS. O mesmo raciocínio que permite a exploração da Amazônia. A insanidade é tanta que transformam a Amazônia em terra para gado e as terras do sul, onde há gado, em monoculturas de árvores. Baseiam-se na ingenuidade, e porque não dizer ignorância do povo que ainda acha que floresta é que é ambiente rico e o pampa não tem ecossistema e expandem os plantios de árvores exóticas por todo o estado. Com o plano de transformar o RS no quintal das transnacionais.
Desrespeitam o código ambiental como se fosse um entrave ao desenvolvimento
Substimam a nossa capacidade intelectual acusando-nos de portadores de achismos. Como se a sua ciência fosse a verdade absoluta. Chegam ao cúmulo de dizer que as Unidades de Conservação deveriam ser entregues para empresas, que teriam capacidade de melhor gerenciamento. Substimam nossos conhecimentos técnicos. Para eles preservação é fazer nada, deixar de produzir. A natureza é vista como inútil. Sugerem a preservação dos areais, onde não deve ter gado, nem árvores, segundo eles. Pois bem, preservemos os areais do RS e destruamos o restante para que daqui um tempo só aja areia por estas parajens. Um leigo que assistisse a apresentação da Stora Enso certamente seria candidato a fazer parte do projeto. É a solução para o Brasil! Para o Mundo todo! Aumenta a biodiversidade, regula o ciclo hidríco, gera empregos e PIB para o estado, um negócio da China.
Da platéia um pecuarista desabafa, mais ou menos assim: Vendo quilo do boi vivo a 1,35 reais. Meu gasto é superior a isto. Quem paga o prejuízo? Que mal faz plantar uns eucaliptos para compensar as perdas. Um discurso que entristece. Entristece ver um pecuarista, que certamente gosta da sua atividade em pecuária falar assim. Seu comentário poderia ser no sentido de lutar pelos subsídios que lhe cabem, pelo auxílio técnico, pelas melhorias da situação no campo. Mas o marketing fala mais alto. Lembra a época da Revolução Verde, onde semente casava com veneno, com auxílio técnico e marketing. De lá pra cá muito solo se converteu em areal no oeste do estado e muita gente perdeu suas terras e migrou para os bolsões de miséria da cidade grande. Hoje o programa Pró-Flora da EMATER, financia projetos para plantio das três árvores exóticas- pinus, acacia e eucalipto- junto com o veneno para plantação, dessecante também para não dar trabalho com a capina, auxílio técnico. A SEMA e secretarias de desenvolvimento faz o marketing governamental. O BNDE dá o dinheiro, e depois dita as regras dentro do estado. A FEPAM não consegue fiscalizar, nem licenciar todos os plantios, portanto não cobra efetivamente as leis ambientais.
Será que saímos daquela época, da Revolução Verde?
O plantio de monoculturas de árvores exóticas foi apresentado como um processo natural de evolução cultural. Depois das charqueadas, dos tropeiros, das monoculturas de alimentos, é hora de descer do cavalo foi dito. Não penso que seja um processo natural muito menos que seja a alternativa para o desenvolvimento na região. É pena que aquele pecuarista, e tantos outros, só enxergue como alternativa para sua melhoria econômica a introdução de árvores exóticas. Talvez desconheçam os sérios danos ao seu solo, água e vida.
O plantio de árvores exótica tem sido a única alternativa apresentada. É pena. Pena que não se fala em agroindústrias familiar para metade sul. Comparam o PIB dos municípios mais pobres do estado com o alto PIB gerado na serra, que é em grande parte gerado pela agroindústria familiar. Mas não falam em fomentar este setor na metade sul, em capacitar a população. É difícil pensar em um desenvolvimento que se baseia exclusivamente no setor primário, deixando o processamento, que é o que agrega valor aos produtos, para outras regiões.
Muitas palmas na platéia foram dadas para as monoculturas. Algumas poucas contestaram. Dia será quando se ouvirem várias contestações de todos os lados, de todos os cantos. Contestações que venham antes do dano estar instituído. Antes de todo o pampa estar convertido em árvores para exportação. Antes da hidrelétrica estar construída, antes do lago estar sendo enchido. As empresas trabalham rápido, elas tem dinheiro. E assim compram suas certificações florestais, mesmo não sendo florestas, ISO 14000, como se estivessem em dia com sua função social e ambiental. Fazem suas reuniões e audiências públicas fraudulentas. Constroem novas hidrelétricas para as novas fábricas de celulose. Vendem créditos de carbono embora liberem o carbono retido em sete anos, ou no papel que apodrede nos lixões europeus. Nossa lógica não é do lucro imediato, mas deve ser da Crise, que necessita de resposta imediata. Nosso empecilho não é exclusivamente falta dinheiro, mas empoderamento das pessoas, informação e organização. Depois do dano consolidado não adianta gritar. Depois que o lago está cheio a gente se afoga.
Por Ana Paula Fagundes, bióloga
Este artigo foi publicado originalmente no nos grupos de discussão Rede 3setor http://br.groups.yahoo.com/group/3setor/ e RETRANS
www.ipetrans.hpg.ig.com.br. Ao seu final, o texto traz um abaixo-assinado contra os plantios de árvores exóticas no Pampa:
O PAMPA CORRE PERIGO
O Bioma Pampa, no Brasil, só existe no estado do Rio Grande do Sul. É composto na sua maioria por campos naturais férteis, muitas plantas, animais e uma biodiversidade associada tão rica quanto uma floresta tropical. Está sobre o maior manancial de água doce subterrânea do mundo, o Aqüífero Guarani.
O Pampa abriga a cultura multissecular do gaúcho, que trespassa fronteiras internacionais no Conesul, sendo uma das mais antigas culturas americanas.
Toda essa diversidade corre o risco de acabar. Empresas transnacionais estão implantando no Pampa grandes plantações de árvores exóticas, como eucaliptos, acácia e pinus. Estima-se que em uma década, mais de 1 milhão de hectares de terras gaúchas, em sua maior parte formadas por campos, estarão convertidas em monoculturas de árvores exóticas! Tudo isto com a diminuição do número de empregos nessas terras ocupadas, para que grandes empresas lucrem muito.
O lucro vai embora mas o estrago fica aqui! A expansão das monoculturas de árvores exóticas causará a extinção de inúmeras espécies de animais e plantas da região. Também reduzirá o abastecimento de água, e transformará os solos gaúchos um imenso areal. Aumentará o número de insetos, ratos e cobras, comprometendo a saúde da população a exemplo de danos no Espírito Santo e no Uruguai.
Nós, abaixo-assinados requeremos que: se zele pela conservação do Pampa; que novos plantios de árvores exóticas só sejam licenciados após estudo de impacto ambiental e zoneamento econômico-ambiental, realizado de forma participativa com a população; novos plantios só sejam permitidos em municípios que já tem construída sua Agenda 21; novos plantios para abastecimento do mercado internos sejam feitos com bases ecológicas e descentralizadas; sejam incentivadas formas de geração de renda que respeitem as características ambientais como agropecuária, agroecologia e agroindústria familiar.
P.S.: Após o abaixo-assinado circular até o final do mês de dezembro (lembramos que não há necessidade de reenviar para o
e-mail ou o grupo de quem se recebeu para evitar assinaturas repetidas) solicitamos reenviar para o seguinte e-mail:
sorriam@hotmail.com