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2005-12-09
Americanos e chineses estão competindo pelo controle das grandes reservas de petróleo da África. A crescente base industrial da China também está em busca de cobre, manganês e madeira tropical para alimentar seu apetite voraz. Mas os ditadores são os vencedores.

Dokubo-Asari, que deu a si mesmo o primeiro nome aterrador de Mujahid, não tinha como prever sua prisão iminente. O robusto líder rebelde mergulhou seus dedos grossos em sua tigela, pescou um pedaço gordo de frango em meio ao molho e enfiou na boca, deixando uma trilha vermelha respingada na túnica branca. Lambendo os lábio, ele deu início às histórias de seus feitos.

O Delta de Níger não podia ser comparado à Bósnia, pelo menos ainda não, ele expôs com um toque de orgulho. Afinal, ele já podia mobilizar mais de 100 mil soldados. Se o governo continuasse o traindo, ele lançaria esta força contra os bandidos do governador, as companhias de petróleo e todos os estrangeiros.

Das aproximadamente 130 gangues, cujos nomes variam de Os Vikings, Os Islandeses, Aliança Nacional dos Aventureiros e Machado Preto, Dokubo-Asari, 41 anos, pode muito bem comandar a mais feroz: um bando de guerreiros da tribo Ijaw que vive no delta. Suspeita-se que sua milícia roube regularmente dos oleodutos da Shell, seqüestre ou mate seus funcionários e promova tiroteios com rivais nas ruas. A BBC estima que Dokubo-Asari tenha cerca de 2 mil criminosos sob seu controle. Ele batizou seus guerrilheiros com o título ostentoso de –Força Voluntária do Povo do Delta do Níger–. O caos que estes renegados podem provocar é familiar demais para a Royal Dutch Shell, que extrai cerca de um milhão de barris de petróleo por dia na Nigéria. Segundo seu relatório anual, em média 50 mil barris por dia foram roubados em 2004, uma prejuízo de quase US$ 1 bilhão.

No mesmo período, uma dúzia de trabalhadores foram mortos, entre 50 e 70 seqüestrados e um total de 314 incidentes criminosos foram registrados. A extração teve que ser suspensa 176 vezes. Um petroleiro, o African Pride, desapareceu e nunca mais foi visto novamente!

–O roubo de petróleo está nos matando–, queixou-se o porta-voz da empresa, Larry Ossai, na capital da Nigéria, Abuja. Para a empresa de segurança WAC Global Services, as condições no Delta do Níger podem até lembrar a Tchetchênia. Há vários meses, as autoridades nigerianas decidiram que era hora de um basta. Dokubo-Asari foi preso sob a acusação de planejar um golpe. De lá para cá, o conflito tem ameaçado sair de controle.

Uma centena de simpatizantes altamente armados de Dokubo tomaram uma plataforma de petróleo operada pela Chevron. Como precaução, a companhia de petróleo americana fechou uma segunda plataforma.

A Shell também retirou funcionários --apesar de nenhum outro lugar no mundo estar atualmente descobrindo reservas de petróleo tão rapidamente quanto na terra incógnita da África. Cerca de 8 milhões de barris já estão sendo extraídos diariamente. Óleo cru de alta qualidade, leve e pobre em enxofre. Facilmente processado em gasolina, o petróleo africano está em alta demanda.

Apenas nas últimas três décadas, o combustível fóssil já trouxe mais de US$ 280 bilhões para a Nigéria. Grande parte disto desapareceu nos bolsos de políticos corruptos. A revista The Economist se referiu a um recém concluído programa de alívio de dívida para o país rico em recursos como –risível–. Há todo indício de que o dinheiro continuará fluindo. Os predadores da indústria do petróleo têm circulado nos países caóticos localizados no Golfo da Guiné em números cada vez maiores --não apenas em conseqüência do aumento estratosférico dos preços do petróleo e das reservas cada vez menores no outro Golfo.

Imagina-se que até 100 bilhões de barris estejam escondidos, principalmente além da costa da África Ocidental --aproximadamente o equivalente às reservas do Iraque. O congressista americano William Jefferson anunciou alegremente em 2004: –No ano passado, 8 bilhões de barris de petróleo foram descobertos ao redor do mundo, e sete bilhões deles estão além da costa da África Ocidental–. O tesouro está lá para ser tomado.

Os Estados Unidos têm um interesse particular nestas reservas: a Nigéria é seu quinto maior fornecedor de petróleo, com a África Central e Ocidental correspondendo a até 15% de suas importações de petróleo. Tal número atingirá em breve 20%. Taxas de crescimento atordoantes são projetadas para países como Nigéria e Angola, onde a corrupção é endêmica. No futuro não muito distante, eles poderão até mesmo dobrar sua produção. O afluxo de dinheiro deverá atingir proporções gigantescas por todo o Golfo da Guiné: no Gabão, Congo (Brazzaville), Guiné Equatorial, São Tomé e Príncipe. Os campos de petróleo se estendem por centenas de quilômetros continente adentro.

Oleodutos imensos já estão canalizando o petróleo do Chade para a costa ocidental. De lá, um petroleiro pode chegar ao Texas na metade do tempo que levaria do Golfo Pérsico. O próximo país na agenda de exploração é Camarões.

–Nos próximos cinco anos, a região adicionará de dois a três milhões de barris por dia ao mercado mundial–, previu o Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais, –o que representará 20% de nova capacidade de produção mundial–. Os especialistas prevêem que os oito maiores produtores de petróleo na África ganharão US$ 35 bilhões apenas em 2005.

O geólogo Tom Windle, que monitora as reservas de petróleo na África ocidental para a Amoco, acredita que a África Oriental tenha mais potencial: –Se alguém me procurasse e dissesse, – –aqui está um bilhão de dólares; eu quero que você abra uma nova fronteira–, eu diria, –certo, a margem oriental africana– –.

Exxon Mobil, Woodside Petroleum e Tullow Oil já estão trabalhando no leste do continente. Na Somália, a caça foi suspensa em 1991 pela guerra civil devastadora no país. Mas com um novo governo eleito no outono de 2004, os representantes das companhias de petróleo têm voado em peso para a capital provisória, em Jowhar.

Um imenso campo de petróleo pan africano se estende de Porto Sudão a Porto Harcourt --com um atrativo especial: com a exceção da Nigéria, nenhum país africano ao sul do Saara é membro da Opep. E a própria Nigéria continua nutrindo a idéia de deixar o cartel, o que lhe permitiria aumentar a produção para 4 milhões de barris por dia em 2010.

A força africana seria assim a única forma de aliviar o controle do mundo árabe sobre os preços. Não é de se estranhar que Washington considere a África Ocidental como uma das fontes que mais crescem de petróleo e gás para o mercado americano. Isto, finalmente, é uma boa notícia para um continente mais conhecido pelo seu sofrimento. E a notícia fica ainda melhor: a China também descobriu o potencial da África como fornecedora. A superpotência econômica emergente necessita desesperadamente de recursos naturais para manter sua taxa de crescimento anual de 9%.

Nunca antes os Estados Unidos e a China estiveram tão concentrados na África, e o interesse deles apenas crescerá. A batalha pelo ouro negro já começou. –A África está com todos os ases–, disse a revista Africa Today. Os chineses evidentemente têm poucos escrúpulos. Depois que os Estados Unidos declararam o Sudão, de governo islâmico, como um Estado não amistoso por dar santuário a Osama Bin Laden, forçando as empresas americanas a abandonarem seu lucrativo comércio do petróleo do país, a China ficou contente em preencher o vácuo.

Hoje, a China é uma grande investidora na terra de Mahdi. Em troca, o Sudão envia 60% de seu petróleo para a potência asiática --não exatamente pouca coisa, dada sua produção diária de 340 mil barris. Assim que o campo de petróleo de Melut entrar em operação no futuro próximo, o total poderá atingir 800 mil barris por dia.

Os chineses consideram seu compromisso com o Sudão como uma parceria de longo prazo. Recentemente, um exército de trabalhadores chineses iniciou a construção de um segundo oleoduto, de 1.500 quilômetros, de seus campos de petróleo no sul até Porto Sudão, no Mar Vermelho. No acordo, o governo de Umar Al Bashir --que investe quase dois terços de sua receita de petróleo em suas forças armadas-- receberá armas da República Popular: armamentos de que necessita desesperadamente para travar guerra em suas províncias do leste e contra os rebeldes em Darfur. (Der Spiegel, 8/12)

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