A riqueza da Rota do Sol
2005-12-08
As riquezas não trafegam pelos 749,5 quilômetros da Rota do Sol apenas sobre os
caminhões. No trecho de 54 quilômetros entre São Francisco de Paula e Terra de
Areia, na RST-453 e na RS-486, elas brotam às margens da estrada. São milhares
de hectares, do topo ao pé da serra, cobertos pela vegetação e cortados por arroios e riachos.
A fortuna verde que se abriga sob a sombra das árvores que cobrem os Campos de
Cima da Serra e o Litoral leva o nome de diversidade. As duas regiões, que
formam três diferentes ambientes, contribuem para que a Mata Atlântica tenha,
proporcionalmente, oito vezes mais espécies de animais e plantas do que a Floresta Amazônica.
- A Mata Atlântica abriga uma grande quantidade de espécies que só ela tem-,
reforça a bióloga Paola Stumpf, técnica da Secretaria Estadual do Meio Ambiente.
É essa riqueza que ambientalistas se esforçam em preservar com instrumentos como
as unidades de conservação - reservas que recebem maior vigilância por sua
importância ecológica. A rodovia cruza por três delas, que procuram evitar a
degradação em cinco municípios.
Esse grupo de cidades abriga 8% da mata ainda remanescente no Estado. São quase
2 mil quilômetros quadrados de florestas - o equivalente aos territórios de Caxias do Sul e Flores da Cunha juntos.
As três áreas integram um conjunto de 11 unidades de conservação, que receberá
10,5 milhões de euros (R$ 27,4 milhões) do governo gaúcho e do banco KfW -
instituição alemã equivalente ao brasileiro Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES). O investimento, cuja liberação de recursos começou
no ano passado e termina em 2007, busca reforçar o propósito das reservas de
preservar a natureza. Mas também está de olho no avanço de um setor econômico.
- A idéia é estimular o turismo e a visitação a essas áreas. Buscamos o
desenvolvimento harmônico e sustentável-, afirma o secretário estadual do Meio
Ambiente, Mauro Sparta.
Impasse ecológico
Harmonia nem sempre foi a palavra de ordem na Rota do Sol, que viu florescer uma
polêmica de sete anos. Em 1990, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental
(Fepam) impediu que o Estado mantivesse a construção do asfalto no trecho,
porque temia a derrubada de vegetação.
O impasse só terminou em 1997, quando o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) impôs um calhamaço com centenas de
páginas de condições para a retomada da pavimentação - como a construção de
túneis e de passagens subterrâneas para animais e o monitoramento periódico do
impacto da estrada na natureza.
- A Rota é percursora no cuidado ambiental-, avalia a engenheira Käthe Sofia
Schmidt, que sobe e desce a Serra do Pinto pelo menos duas vezes por semana para
fiscalizar e supervisionar as empreiteiras.
O ineditismo custa - e muito. O atendimento às exigências ambientais encarece a
conclusão da rodovia em dezenas de milhões de reais. Mas, segundo os
ambientalistas, é um preço justo. Trata-se da sobrevivência de um tesouro.
Reservas de exuberância
A Rota do Sol corta três unidades de conservação, criadas pelo governo do Estado
como estratégia para reforçar o zelo por regiões ambientais importantes. As
áreas - listadas neste quadro - ocupam terras de cinco municípios, que têm 36%
de sua extensão coberta pela Mata Atlântica, como mostra o mapa.
Nos cinco municípios, a cobertura atingia 100% antes da ocupação humana.
Área de Proteção Ambiental Rota do Sol
Criada em 11 de abril de 1997, tem uma área de 52,355 mil hectares e abrange
cinco municípios: São Francisco de Paula, Cambará do Sul, Três Forquilhas, Itati
e Maquiné. Terras públicas e privadas compõem a unidade de conservação,
permitindo a ocupação humana e o uso de recursos naturais. A área busca
preservar os recursos hídricos na região, como as nascentes dos rios Tainhas e
Três Forquilhas e pretende conservar os espaços caracterizados como savana
gramíneo-lenhosa (campo com gramas) e florestas da encosta. Na flora, a área
conserva gramíneas (gramas ou capins), orquídeas e bromélias, além de
corticeira-da-serra e araucárias. A gralha azul, o papagaio-charão, o puma e a
jaguatirica ajudam a formar a fauna da unidade de conservação, a exemplo da rã
das cachoeiras.
Estação Ecológica Estadual de Aratinga
Foi criada em 11 de abril de 1997 e conta com 6 mil hectares, que integram a
Área de Proteção Ambiental da Rota do Sol, abrangendo dois municípios: São
Francisco de Paula e Itati. É formada por área pública, e só são permitidas a
pesquisa científica e a visitação com finalidade educacional. Como a Área de
Proteção Ambiental da Rota do Sol, também busca preservar nascentes e conservar
os campos de savana gramíneo-lenhosa. Araucária, pinho-bravo,
ipê-amarelo-da-serra e canelas são espécies que formam a flora da estação
ecológica, a exemplo das gramídeas, orquídeas e bromélias. Os cobiçados palmito
e xaxim também estão presentes. A fauna também tem seus destaques: leão-baio,
bugio, veado-campeiro, paca, quati e tamanduá-mirim
Reserva Biológica Estadual Mata Paludosa
Criada em 23 de outubro em 1998 e conta com 113 hectares, em Itati. Busca
proteger exemplares da fauna e flora das florestas de planície e encosta do
município, preservando palmeiras, como o palmito; árvores, como a figueira, que
chega a atingir o centenário, como o exemplar de Itati; flores como a caeté e
outras. A fauna também é variada: tem espécies de peixes, como o lambari-azul;
anfíbios, como a perereca-leiteira; cobras, como a jiboinha; aves, como o
surucuá-de-barriga-amarela; e mamíferos, como a jaguatirica. (Pioneiro, 07/12)