Portugal é dos mais países mais ineficazes na utilização energética, diz ex-ministro
2005-12-08
O presidente do Fórum para a Competitividade de Portugal, Luís Mira Amaral, alertou, nesta semana, para o fato de o país ser um dos membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) mais ineficazes na utilização de energia. O ex-ministro da Indústria e Energia nos governos de Aníbal Cavaco Silva apresentou a sua posição durante uma intervenção no debate sobre política energética organizado pela Sedes (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social) e pelo Fórum para a Competitividade, terça-feira (6/12) à noite, na Ordem dos Engenheiros.
A ineficácia é agravada pela elevada dependência do petróleo, acrescentou. Para Mira Amaral, –o problema energético português não se reduz à questão da Galp ou à EDP ter ou não o gás natural–, referindo-se a empresas do setor. Pelo contrário, –as questões-chave para o nosso futuro coletivo– são as de saber –quais as políticas do lado da oferta e da procura para minimizar a nossa grave questão energética, ajudando a competitividade das nossas empresas–.
Do lado da oferta, Mira Amaral assinalou as energias renováveis, o nuclear, os biocombustíveis e a evolução tecnológica nos transportes, que está permitindo o aparecimento dos motores híbridos, movidos a combustível e eletricidade. Em relação às energias renováveis, Mira Amaral particularizou a eólica, o solar térmico e fotovoltaico e a energia das ondas.
Mira Amaral considerou o nuclear –uma questão problemática–, rejeitando a tese de que a produção de energia deste tipo reduziria a dependência portuguesa face ao petróleo, porque já não se gasta petróleo na produção de energia eléctrica.
De acordo com Mira Amaral, o petróleo é gasto, isso sim, nos transportes, –pelo que enquanto tivermos uma frota movida a petróleo, o nuclear não resolve esse problema–. Só quando os motores automóveis passarem a eléctricos e forem abastecidos por eletricidade produzida em centrais nucleares é que se poderia dizer que estas centrais reduziriam a dependência portuguesa face ao petróleo. Em todo o caso, para Mira Amaral, o tema da indústria nuclear deve ser discutido em Portugal.
A propósito dos biocombustíveis perguntou se –não seria estrategicamente melhor a Comissão Européia apoiar os agricultores na [sua] produção em vez de estar a apoiar a produção de produtos agrícolas em excesso?–.
Ao abordar a lógica da procura, Mira Amaral afirmou que se gasta energia de forma irracional, particularizando os casos da construção civil e dos transportes. Privilegiar uma lógica de transporte público de qualidade e mudar o transporte de mercadorias da rodovia para a ferrovia e a via marítima foram as sugestões deixadas pelo ex-ministro da Indústria e Energia.
O presidente do Fórum para a Competitividade salientou ainda que o Governo deve ter por preocupação –ver em que medida pode desenhar um sistema energético para que as empresas portuguesas não sejam esmagadas pelas espanholas–.
Para o antigo gestor público, –se a EDP fosse esmagada pela concorrência–, através da Iberdrola e da Endesa, sozinha ou comprada pela Gás Natural, –em vez de ficarmos dependentes de uma empresa portuguesa ficaríamos dependentes de um duopólio espanhol–.
O ex-ministro manifestou, a propósito, que não percebe como é que a Comissão Européia reprova a ligação da EDP ao gás natural, quando em Espanha os operadores Gás Natural, que lançou uma oferta pública de aquisição da elétrica Endesa, e Iberdrola se estão a posicionar como empresas de eletricidade e gás natural.
Mira Amaral criticou igualmente a Comissão Européia, presidida por Durão Barroso, ex-primeiro-ministro português responsável pelo desencadeamento do processo, pela sua decisão de reprovar a união entre a GDP e a EDP, –ao mesmo tempo que assobia para o lado numa operação idêntica na Espanha–.
Sobre a relação de Portugal com Espanha, a propósito do mercado ibérico de eletricidade (Mibel), Mira Amaral previu que –enquanto não houver convergência nas políticas de regulação, concorrência e formação de preços para os consumidores–, este –não será um verdadeiro mercado único ibérico–.
Em todo o caso, o ex-ministro alertou que –sempre foi do interesse português enquadrar o relacionamento com Espanha no contexto mais vasto da integração européia– e interrogou –que sentido teria para Portugal fazer um Mibel sem desenvolver as interligações Espanha-França e as relações com outros operadores europeus?–.
Ao comentar o atual conflito em torno da Galp, Mira Amaral manifestou-se surpreendido pelo facto de –só agora alguns se preocuparem– com a situação.
O ex-ministro recordou que –quando o governo convidou a Petrocontrol a vender à Eni e fez um acordo parasocial com a Eni, o qual dava a esta a possibilidade de controlar a Galp, pouca gente – entre os quais eu, o Dr. João Salgueiro e o Sr. Henrique Neto – chamou a atenção e criticou vivamente a situação.
Mira Amaral acrescentou que –os governos seguintes assobiaram para o lado e é agora este Governo que tem de enfrentar o problema–.
O processo de privatização da Petrogal passou pela venda, em 17 de janeiro de 2000, da posição dos accionistas privados portugueses, agrupados na Petrocontrol, presidida por Diogo Freitas do Amaral, e da entrada dos italianos da Eni no capital da Galp com uma posição de 33,34 %, era então Pina Moura ministro das Finanças e da Economia no Governo de António Guterres. (Ecosfera, 7/12)