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2005-12-06
O I Simpósio Brasileiro de Incineração, que se realiza em Porto Alegre até amanhã (7/12), trouxe, já em seu primeiro dia (05/12), uma série de polêmicas a respeito do processo. As formas de se lidar com a poluição e as novas tecnologias empregadas em tais processos foram temas centrais dos painéis.

– A poluição ambiental atmosférica pode ser considerada a menos conhecida das pessoas-, afirmou o professor e engenheiro agrônomo da UFRGS, Darci Camponi. Ele acredita que os poluentes da água e do solo lideram as pesquisas dos especialistas. Em contrapartida, sobre o ar não se tem o mesmo conhecimento, o que gera a necessidade de discussões.

Camponi adotou um discurso filosófico, em sua própria definição, para resumir os malefícios da incineração. Ele explica que o ciclo do carbono é um sistema fechado, diferente da radiação solar, que permite troca de massa e energia com outros sistemas. – O princípio da vida, pois, é o ciclo de carbono, que faz com que os átomos permaneçam unidos e dêem forma às coisas. Largando essas partículas na atmosfera por meio dos incineradores, estamos quebrando esse ciclo. O resultado é o efeito estufa e o aquecimento global, que acabam com qualquer chance de sustentabilidade.

Perigos da incineração para a saúde
O geneticista Flávio Lowgoy, por sua vez, apresentou dados da ecogenética – ciência que trata da predisposição genética aos fármacos, alimentos e agentes ambientais em geral – para mostrar os perigos da incineração sobre a saúde. – Meio ambiente e saúde pública estão interligados, e a escolha das tecnologias interfere na vida das pessoas e causa custos sociais-, salienta o médico, que também é sócio fundador da Agapan (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural).

A relação entre os fatores foi demonstrada por meio de um dos princípios da ecogenética, a fragilidade . – A grosso modo, existem três tipos de pessoas: as geneticamente suscetíveis, as normais e as congenitamente resistentes -, explica. Os suscetíveis abrangem os idosos, as crianças e os que nascem com problemas respiratórios, cardíacos ou circulatórios, na maior parte das vezes, correspondendo a cerca de 15% da população. Já os normais equivalem a uma média de 85%, e ganham o nome simplesmente por estarem entre o grupo anterior e o próximo, o dos congenitamente resistentes – aproximadamente 0,17% –, que têm uma estrutura genética mais forte. – O panorama mostra que, quando uma tecnologia é implantada, os seres humanos reagem de forma diferente às influências. Quem está no grupo de risco , por exemplo, sofre mais com os resultados da poluição -, observa. Nesse chamado grupo de risco , o especialista coloca também as camadas mais pobres, que vivem em condições precárias de habitação e saneamento.

Lowgoy afirma conhecer os novos métodos empregados nos incineradores, e destaca que são justamente esses recursos que tornam os equipamentos modernos ainda mais prejudiciais. – Os incineradores atuais transformam os resíduos em grãos de uma dimensão minúscula, praticamente os abate. Isso facilita a inalação dessas partículas -, esclarece. Uma vez dentro do corpo humano, podem atingir os pulmões, o coração e outros órgãos vitais.

Nos últimos 50 anos, mais de 800 mil produtos químicos entraram no mercado, e cerca de mil são adicionados a cada ano. – Essas estatísticas se referem aos Estados Unidos, mas sabemos que logo eles chegam ao Brasil-, salientou o ambientalista. O assombroso número demonstra, segundo ele, a quantidade de produtos químicos que circulam no ambiente hoje, pondo em risco a saúde pública. – A incineração faz com que substâncias tóxicas sejam levadas para a atmosfera em um primeiro momento e depois para os próprios alimentos que consumimos -, completa.

Consumismo na raiz dos problemas
A posição de Lewgoy foi reiterada pelo químico e diretor-presidente da ACPO (Associação de Combate aos Poluentes), Márcio Mariano. – Se formos a um lixão, teremos a convicção de que não sabemos bem o que entra em um incinerador, quanto mais o que pode sair dele-, destaca. De acordo com o palestrante, no interior das máquinas os elementos químicos recombinam-se, podendo dar origem até mesmo a ácidos corrosivos e dioxinas - formadas pela combinação de moléculas de cloro e matéria orgânica em altas temperaturas. – Muitos têm a certeza do resultado desse processo de combustão, mas é impossível prever-, assegura.

O químico enumerou uma série de efeitos nocivos da queima de combustíveis fósseis, como a dispersão de metais pesados, a formação de compostos oxidados, a recombinação de hidrocarbonetos, a emissão de particulados impregnados e cloretos que podem favorecer a formação de organoclorados, compostos que se caracterizam por persistência ambiental, bioacumulação e alta toxicidade. Somente as dioxinas são responsáveis por tumores, redução da fertilidade e transtornos hormonais.

Um dado preocupante, ressalta, é a conscientização da Europa sobre os impactos da incineração. Embora pareça não haver razão para o temor, o técnico considera possível que o Brasil se torne um importador de lixo para ser destruído . – O país, aliás, está se tornando um quebrador de protocolos internacionais-, em uma alusão ao Tratado de Kyoto, que prevê a redução das emissões de carbono na atmosfera.

A solução mais racional nesse momento, segundo Mariano, seria a redução dos resíduos e um novo padrão de consumo. – O mundo não suporta mais a quantidade de lixo produzida e o consumismo atual. Precisamos pensar em outras formas de combate a esse problema, como a reciclagem. A incineração só agrava os problemas-, conclui.

Professor apresenta outra visão
Contrariando todos os argumentos até então expostos, o engenheiro químico e professor da Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro Abraham Zakon fez questão de mostrar os aspectos positivos da incineração. Baseado em estudos da instituição carioca, o especialista destacou que o grande obstáculo a ser superado hoje é o preconceito relativo ao processo de termodestruição, expressão utilizada para esse tipo de combustão. – Se fosse pela poluição, todas as fábricas, até mesmo as pizzarias que tivessem uma chaminé seriam fechadas-, alega.

A segurança da termodestruição, conforme o professor, é viabilizada por meio dos atuais recursos da engenharia química, as chamadas novas tecnologias . Os resíduos industriais e hospitalares – os mais perigosos – seriam incinerados de forma adequada, tomando-se o cuidado necessário.

Boa parte de sua explanação resumiu-se a mostrar as deficiências dos lixões e aterros sanitários como destino final do lixo, bem como a dificuldade de manter um aterro com as normas estabelecidas – existência de células para resíduos e monitoramentos ambiental, topográfico e geotécnico. Além desses requisitos, também há risco para os materiais que formam as camadas de disposição, frágeis demais na visão do especialista para evitar a contaminação do meio ambiente. A maior restrição, contudo, encontra-se na demanda por grandes áreas operacionais, que acabam gerando um alto custo econômico.

Ao contrário dos palestrantes anteriores, Zakon declarou que o CO2 e as cinzas são passíveis de aproveitamento industrial, e que produtos preocupantes como o enxofre, proveniente das queimas, podem ser tratados para diminuir seus malefícios à atmosfera. Entre outros pontos defendidos estão a geração de energia elétrica – termoeletricidade – e a produção de cerâmica a partir de cinzas, hipótese comprovada pela UFRJ.

O professor ainda destacou a incineração como forma de eliminar seres vivos patogênicos e evitar a propagação de doenças. Acrescentou que os aterros e lixões sofrem combustão e oxidação espontânea, liberando CH4 e CO2, e as usinas de compostagem, embora bem recebidas pela sociedade, causam odores desagradáveis. – Estou convicto de que a incineração polui menos é uma excelente alternativa, mas precisamos acabar com os preconceitos que a cercam-, finaliza.
Por Patrícia Benvenuti

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