Usina de álcool já polui o Pantanal, diz laudo do governo
2005-11-28
Estudo de um órgão do próprio governo de Mato Grosso do Sul diz que uma usina de álcool em Sidrolândia já polui a bacia do Alto Paraguai, onde fica o Pantanal. O documento foi mostrado ontem pelo ambientalista Alcides Faria na Câmara dos Deputados, Brasília, sobre o projeto que visa liberar usinas de álcool no entorno da planície pantaneira.
A audiência foi acompanhada por Iracema Sampaio, 67, viúva do ambientalista Francisco Anselmo de Barros, 65, o Franselmo, que morreu no dia 13 após ter ateado fogo ao corpo em protesto contra o projeto. A viúva, em uma cadeira de rodas, chorou no evento.
A proposta é do governador José Orcírio dos Santos, o Zeca do PT, que não vê risco de poluição da área preservada. Ele diz que as usinas ficarão no planalto, longe dos rios. Sua assessoria disse que ele não conhece e buscará informações sobre o laudo -feito pela Sema (Secretaria do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul).
Faria mostrou dois relatórios. Um diz que resíduos de uma grande usina de álcool e açúcar são lançados no córrego Canastrão, que deságua no rio Cachoeirão.
— Uns 30 km estão poluídos.
Ele exibiu fotos de peixes mortos na região. O Cachoeirão deságua no rio Aquidauana, um dos mais importantes do Pantanal.
Segundo o ambientalista, a poluição foi causada pela usina Santa Olinda, instalada em 1977. Desde 1982, lei estadual proíbe destilarias de álcool na bacia do Alto Paraguai, mas as unidades anteriores à medida podem operar.
A direção da usina diz não haver contaminação porque os resíduos são usados para irrigar e fertilizar a cana. Diz ainda que a qualidade da água, incluindo a do subsolo, é monitorada. A usina afirma estranhar não ter sido procurada por Faria para discutir o estudo.
O projeto do governo deve ser votado na Assembléia na quarta. O ramo que mais contribuiu para campanha de reeleição do petista, em 2002, foi o sucroalcooleiro. Três usinas doaram, juntas, R$ 956.780 à campanha.
Zeca arrecadou R$ 6,52 milhões ao todo -ou seja, 14,6% de sua verba de campanha veio das usinas. As doações foram legais.
Outro lado: Governador diz não conhecer estudo, mas nega danos
A assessoria de imprensa do governador de Mato Grosso do Sul, José Orcírio Miranda dos Santos, o Zeca do PT, afirmou que ele desconhece o estudo elaborado por um órgão de seu governo, a Sema (Secretaria de Estado do Meio Ambiente). A assessoria disse, porém, que o petista vai buscar informações a respeito do laudo.
Em relação ao projeto que libera a instalação de usinas de álcool no entorno da planície do Pantanal, Zeca vai esperar a decisão da Assembléia Legislativa, que deve sair na próxima quarta.
O projeto de lei foi apresentado em agosto deste ano pelo governador. Zeca do PT defende os empreendimentos sob a argumentação de que não haverá poluição no Pantanal, pois as usinas ficarão na área de planalto, longe dos rios que formam a área preservada.
Ele afirma também que a tecnologia atual e as restrições impostas pela lei, se acabar aprovada, afastarão riscos ao ambiente. É a terceira tentativa de Zeca do PT, em dois anos, de modificar a legislação ambiental no Estado. Em setembro de 2003, o governador baixou um decreto com esse intuito -o 11.409. Diante da repercussão negativa da iniciativa, voltou atrás e revogou a decisão.
A segunda investida ocorreu em março deste ano. Zeca do PT enviou o secretário Nogueira Filho à Assembléia Legislativa sul-mato-grossense para discutir um projeto de lei nesse sentido. Em maio, por causa da reação dos deputados estaduais, recuou novamente.
Em agosto deste ano, o governador encaminhou o projeto de lei que agora é alvo de polêmica. (Folha de S.Paulo, 25/11)