Tapes é desafiada a proteger butiazal
2005-11-21
Como gigantes de troncos hirtos e recurvados, as longas cabeleiras vegetais desgrenhadas ao vento, centenas de pés de butiás resistem à destruição às margens da Lagoa dos Patos. Concentradas numa área de 800 hectares, entre Tapes e Barra do Ribeiro, as árvores formam a última reserva de butiazal no Rio Grande do Sul.
Há um esforço para salvar o santuário de butiás. Desde os anos 1990, ambientalistas como Júlio Cesar Wandam Martins, do grupo Os Verdes, de Tapes, alertam para as ameaças. O avanço das lavouras de arroz, o cerco asfixiante das florestas de pinus e a criação de gado podem liquidar a reserva. Vacas comem os brotos das palmeiras e pisoteiam as recém-nascidas.
Os alertas chegaram ao Ministério do Meio Ambiente, em Brasília. Em 2003, a Fundação Zoobotânica do Estado (FZB) começou um inventário, a ficar pronto no final do ano. O coordenador técnico do projeto, Fernando Becker, destaca a biodiversidade. Foram pesquisadas 385 espécies de plantas, 220 de aves, 30 de répteis e 425 de cascudos.
Os biólogos da Zoobotânica encontraram um lagarto - o Cercosaura ocellata petersi - não observado havia 50 anos. Julgava-se que o bichinho (cerca de um palmo) fora extinto. Os butiazais já foram abundantes no Estado. A botânica Maria de Lourdes Abruzzi de Oliveira, pesquisadora do Museu de Ciências Naturais da FZB, ressalta que a de Tapes é a última área contínua remanescente deste tipo de ecossistema.
O butiazal de Tapes, da espécie Butia capitata, remonta a uma época de clima mais seco e frio. O butiá está associado a outras duas espécies também raras e ameaçadas de extinção: a orquídea Catasetum atratum e o cactus Parodia ottonis.
Extração de fibra vegetal pode ajudar a preservar
O reduto de butiás pode ser transformado em Área de Preservação Ambiental (APA) ou ficar como está, sob a guarda dos atuais donos, mas com sugestões de cuidados. O prefeito de Tapes, Sylvio Tejada Xavier (PDT), diz que pretende preservá-lo.
Xavier acha que a exploração auto-sustentável ajudará a manter a floresta. O raciocínio: se as árvores derem lucro, haverá mais interesse em conservá-las. De 1927 até a década de 1950, Tapes destacou-se na produção de crinas vegetais para forrar colchões, extraídas dos butiás. Com as recentes notícias de que montadoras da Europa voltaram a utilizar fibras para acolchoar os assentos de automóveis, o prefeito planeja retomar o ciclo da extração.
Outra possibilidade é aproveitar o fruto do butiá. A polpa e as amêndoas rendem doces e licores.
Alheio à discussão, o peão Aldoir Mariano dos Passos, 35 anos, acha difícil tanger os bois entre as palmeiras de troncos que mais parecem armaduras medievais. Ele não sabe que as patas dos cavalos estão matando as novas plantas de butiás, impedindo que a floresta se renove. (ZH, 21/11)