Vítimas do amianto reivindicam agilidade na proibição do produto
2005-11-16
Um projeto de lei, do vereador Cristóvão Ferreira Júnior (PDT), proibindo o uso de materiais e equipamentos da construção civil constituídos de amianto continua tramitando na Câmara Municipal de Salvador. A principal consideração do projeto é que a inalação do pó liberado pela fibra mineral traz várias complicações aos pulmões, podendo causar câncer e levar à morte. O presidente da Associação Baiana de Expostos ao Amianto (Abea), Belmiro Silva dos Santos, que esteve reunido com a direção da entidade, ontem, para discutir em que situação está o projeto da Câmara e o que tramita na Assembléia Legislativa, desde 18 de dezembro de 2003, quer agilidade no processo.
— Precisamos de qualquer lei, seja ela nacional, estadual ou municipal. Só não podemos continuar sem normas, deixando a Eternit utilizar o material e prejudicando muita gente - disse.
Enquanto os projetos de lei não são aprovados, a empresa Eternit, de Simões Filho, continua utilizando o amianto e alegando que o pó extraído da fibra mineral não faz nenhum mal para saúde. De acordo com o presidente da Abae, a indústria tem uma estrutura pronta para trabalhar com outras fibras alternativas, mas ainda não substituiu o amianto por se tratar de um produto mais barato e que ainda não é proibido no Brasil.
— Não iria causar prejuízos, desemprego e não iria colocar em risco a vida dos funcionários. Mas, se não tiver lei proibindo, ela (a Eternit) vai continuar usando o amianto, que é bem mais barato. Para a empresa é conveniente empurrar com a barriga - assinalou Belmiro.
Dos 2,5 mil ex-trabalhadores da empresa, aproximadamente 400 já foram identificados e localizados. Até agora, apenas 180 concluíram os exames necessários, 23 apresentam placas pleurais e sete têm asbestose, patologia crônica e incurável, que provoca fibrose pulmonar. Um dos ex-funcionários morreu de asbestose e outras cem pessoas ainda realizam os exames. O aposentado Ivanilton Correa Monteiro, 73 anos, é uma das 23 pessoas que apresentam placas pleurais (a pleura é a membrana que reveste o pulmão). Ele conta que perdeu a visão parcialmente e respira com dificuldade.
— Acordo durante à noite com falta de ar. Fico com medo - revela.
O presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa do estado da Bahia, deputado Zilton Rocha, é autor do projeto de lei 13.769/03 que proíbe a extração, a comercialização e o uso do amianto no estado. O projeto, que tramita desde 18 de dezembro de 2003, e até agora não foi aprovado, segue a prática já adotada nos estados do Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, além de 15 municípios, 13 dos quais em São Paulo. Os municípios do Rio de Janeiro e Recife também já baniram o amianto. Nos estados, onde não há legislação específica, aplica-se a legislação federal que disciplina o uso do amianto (Lei 9.055/95) regulamentada pelo Decreto presidencial 2.350/97.
Não foi possível checar com os autores dos projetos de lei como está o andamento das medidas. O vereador Cristóvão Ferreira Júnior não foi encontrado pela equipe de reportagem através do telefone para comentar o assunto. O mesmo aconteceu com o deputado Zilton Rocha, que não foi localizado. O celular da promotora pública de Simões Filho, Hortência Gomes, que está à frente do caso, também estava desligado.
Primeiros casos surgiram em 1906
As primeiras notícias de doenças causadas pelo amianto datam de 1906. No final da década de 70, a conceituada Agência Internacional de Pesquisa do Câncer, sediada em Lyon, anunciou que o amianto causava câncer. De acordo com estimativas oficiais, 50 mil operários brasileiros foram expostos ao amianto desde os anos 60. Na Europa, a Saint Gobain e a Eternit envolveram médicos e cientistas importantes na tentativa de retardar o banimento e conseguiram esticar este prazo por 20 anos. a Saint Gobain tem pago caro, de fato, pois ficou com a imagem arranhada diante da opinião pública e tem sido condenada pelos tribunais franceses a honrar indenizações milionárias.
A mesma história se repete em terras brasileiras, encabeçada apenas pela Eternit - a Brasilit desistiu da queda-de-braço para continuar a fabricar o amianto e atualmente desenvolve projetos para a elaboração de materiais similares e não-ofensivos ao homem e à natureza. A empresa já gastou R$100 milhões para desenvolver uma fibra alternativa, feita a partir de polipropileno, e aposta alto numa mudança na legislação.
Histórico
Conhecido desde a Antigüidade pelo homem primitivo, que o misturava com barro para conferir propriedades de refratariedade aos utensílios domésticos, o amianto é um minério que ocorre naturalmente na crosta terrestre e possui propriedades de isolante acústico e térmico. Diversos prédios da Europa e nos Estados Unidos foram jateados com o amianto, em função do Inverno rigoroso que predomina em várias regiões européias e americanas. (Correio da Bahia, 15/11)