MMA é contra, e aponta incostitucionalidade na implantação de usinas no Pantanal
2005-11-16
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, atacou segunda-feira (14) o projeto de lei do governo de Mato Grosso do Sul que busca permitir a instalação de usinas de álcool e cana-de-açúcar no entorno do Pantanal. Em protesto contra a tentativa do governador Zeca do PT de mexer na legislação estadual, o ambientalista Francisco Anselmo Gomes de Barros, 65, morreu no domingo (13), depois de ter ateado fogo ao próprio corpo. Franselmo, como era conhecido, foi enterrado no mesmo dia no cemitério Santo Amaro, em Campo Grande (MS).
- O Ministério do Meio Ambiente lamenta a morte do ambientalista Francisco Anselmo de Barros. Esclarece, também, que é contra a implantação de agroindústrias de exploração de cana-de-açúcar e seus derivados em áreas limítrofes ao Pantanal sul-mato-grossense -, registra a primeira parte da nota, divulgada um dia depois da morte do ambientalista. - O ministério entende que a preservação da planície pode não se concretizar, apesar dos limites geográficos e físicos propostos pelo projeto de lei, uma vez que existe a possibilidade de contaminação dos rios que correm do planalto para o pantanal -.
O ministério cita também a resolução 001 do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), de março de 1985, que determina a suspensão de novas concessões para a instalação de usinas nas bacias hidrográficas do Pantanal. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Assembléia de Mato Grosso do Sul, deputado Onevan de Matos (PDT), disse que a tendência é que a comissão considere o projeto de lei do governo inconstitucional. - Eu, particularmente, sou contrário e entendo que é inconstitucional. O entendimento que eu sinto na maioria da comissão, e não a totalidade, é pela inconstitucionalidade, pois esse projeto de lei não pode ferir a resolução do Conama, declarou Matos.
Segundo Matos, existe também a disposição pelo arquivamento do projeto pelo plenário da Assembléia. - Ainda mais com esse fato novo [a morte de Franselmo].-
Nacionalização do debate
O secretário-executivo da coalizão de ONGs Rios Vivos, Alcides Faria, defende a nacionalização do debate. - O Pantanal é declarado pela Constituição brasileira [de 1988] patrimônio nacional. Então, qualquer coisa que atinja o Pantanal, não pode ser competência de um ou outro governo estadual ou municipal, que seja. Legalmente, nós temos de ter a presença do Ministério [do Meio Ambiente] -, disse Faria.
O secretário-executivo da FBOMBS (fórum de ONGs ambientalistas), Temístocles Marcelos, disse que haverá uma reunião das organizações no final do mês para discutir a necessidade de intervenção do governo federal na discussão. - Esse debate não pode ficar somente sobre o ponto de vista do desenvolvimentismo que caracteriza o governo Zeca do PT -, declarou Marcelos. Na opinião dele, a atitude de Franselmo mostra que há falta de diálogo entre ambientalistas, empresários e governo sobre o projeto. - Se houvesse disposição de diálogo, isso [morte de Franselmo] não teria acontecido -.
A partir do mesmo argumento sobre constitucionalidade, o deputado Fernando Gabeira (PV) disse que pretende antecipar uma audiência pública na Câmara dos Deputados, marcada para o início do ano que vem, que vai tratar do assunto. E que vai comandar um bloco de oposição na Casa ao projeto do governo sul-mato-grossense.
Outro lado
A reportagem não conseguiu localizar ontem nenhum representante do governo de Mato Grosso do Sul para falar sobre as críticas ao seu projeto de lei. Anteriormente, o governador Zeca do PT havia dito que há confusão sobre a finalidade do projeto. Segundo o governador, as destilarias não vão ser instaladas no Pantanal, mas na área de planalto. Zeca diz ainda que não há riscos de acidentes nem ameaça para os rios. - É preciso ficar claro que não se está propondo a instalação de usinas no Pantanal, como se quer fazer parecer. A lei, se aprovada pela Assembléia, vai autorizar a construção de usinas apenas no altiplano, com todos os recursos tecnológicos atuais, que reduzem riscos de poluição -, afirmou à Folha em agosto, quando o projeto foi enviado à Assembléia.
Em nota divulgada anteontem, o governo do Estado disse lamentar - profundamente o trágico desfecho do gesto do ambientalista Francisco Anselmo de Barros, expressando condolências a seus familiares e companheiros -. O próprio governador, quando era deputado estadual, foi contra a concessão de licenças para a instalação de novas usinas.
- Fui contra pelo local e pela falta de tecnologia. Hoje, vocês, mais que eu, sabem que há tecnologia para o aproveitamento racional do vinhoto e bagaço para a produção de fertilizantes e energia -, declarou numa reunião que teve com prefeitos para apresentar o projeto de lei.
É a terceira tentativa de Zeca, em dois anos, de mudar a legislação ambiental. Em setembro de 2003, o governador baixou o decreto 11.409. A segunda investida ocorreu em março deste ano. Em agosto, o governo enviou o projeto de lei que agora é alvo de polêmica. (Agência Folha 14/11)