Autoridades federais tentam conciliação com assentados em Poço das Antas
2005-11-14
De um lado, um dos últimos resquícios de Mata Atlântica de baixada no Rio de Janeiro - a Reserva Biológica de Poço das Antas, em Silva Jardim (RJ). De outro, mais de 130 famílias assentadas no entorno da unidade, há cerca de uma década. Para que a questão social não esbarre na ambiental, o Incra e o Ministério Público assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), no último mês de agosto. O acordo prevê a contenção do desmatamento na área - que é reduto de animais em extinção, como o mico-leão-dourado - sem que, necessariamente, os assentados tenham que sair de lá. O embate entre a preservação ambiental e o problema social na região já dura mais de uma década. As famílias foram assentadas pelo Incra no início dos anos 90, mas, depois da ocupação, o Ibama e organizações não-governamentais entraram com ações contra o órgão, argumentando que os assentados estariam provocando danos ao ecossistema da região.
Enquanto alguns apontam no assentamento a causa do aumento do desmatamento, outros relacionam a destruição à industrialização e à ocupação de fazendeiros, que na década de 1970 teriam feito uso abusivo de agrotóxicos.
— Havia três grileiros na área que queimaram e destruíram muita coisa por lá - afirma o ambientalista Sérgio Ricardo.
— Com a canalização do Rio São João, na década de 70, o sistema de baixada da região ficou muito alterado - complementa Mônica Cox, do Grupo de Trabalho Ecosocial da UFF, que realizou estudos no local.
Mas agora, de acordo com o TAC assinado pelos órgãos, o Incra precisa da licença ambiental para que os assentados permaneçam na área. O Ministério Público deu até o dia 8 de dezembro para que o instituto inicie o processo.
Processo tem sido pacífico
Embora a situação não esteja totalmente definida - é preciso que o Incra consiga a licença ambiental para os assentamentos - as negociações no entorno da Reserva Biológica de Poço das Antas já se tornaram referência nacional. É o que aponta o superintendente do Incra no Rio de Janeiro, Mario Lúcio Machado.
— É a primeira vez que essas negociações são feitas por convicção, e não por obrigação. É um movimento bonito e, por isso, estou convencido que as licenças sairão e tudo dará certo. O Rolf Hackbart (presidente do Incra) disse que não tem conhecimento de outro processo tão pacífico em todo o país - explica Mario, que reconhece a falta de atenção para com a ecologia no passado:
— Agora o Incra entende que é preciso repensar os assentamentos de acordo com a questão do meio ambiente. Da mesma forma, o Ibama leva em consideração os problemas sociais - resume.
Em 2002, os ministérios do Desenvolvimento Agrário e do Meio Ambiente, o Incra e o Ibama assinaram um acordo que concluiu que seria possível conciliar a permanência dos assentamentos com a política ambiental.
Reserva de Mata Atlântica
Um reduto de micos-leões dourados, resquício de Mata Atlântica de baixada e paraíso ambiental de 5 mil hectares entre o litoral e a serra. Assim é a Reserva Biológica de Poço das Antas, que fica no município de Silva Jardim e faz limite com Araruama e Casimiro de Abreu, entre o Noroeste fluminense e a Região dos Lagos. Cortada pelo Rio São João, a unidade de preservação foi criada em 1974 para conter a extinção de micos-leões dourados. A área faz parte de terras desapropriadas pelo Instituto Nacional da Reforma Agrária (Incra) na década de 1970. Além de lutar contra a extinção de micos-leões-dourados, a unidade de conservação foi criada para preservar uma amostra da Mata Atlântica costeira e os ecossistemas existentes na região.
Segundo Mônica Cox, do Grupo de Trabalho Ecosocial da UFF, a região é propícia à proliferação da espécie em extinção e 40% da área já foram desmatados. Por ser uma unidade de preservação mais restritiva, a reserva não é aberta à visitação turística. (Jornal do Brasil, 13/11)