Florestas: é hora de contabilizar os lucros
2005-11-07
As notícias sobre florestas costumam focar a contabilidade do prejuízo: um dia é a
taxa de desmatamento, outro dia a fumaça dos incêndios que leva estados inteiros à
calamidade pública. Recentemente a tendência se agravou, com fenômenos que agora
atingem a dimensão produtiva do campo e são explicados pelos cientistas. A origem está
na alteração no regime de chuva na faixa crítica do sul da Amazônia: isso contribuiu
para a seca que assolou este ano a agricultura do Rio Grande do Sul e, agora, para a
paralisação da hidrovia do Madeira - que transporta os grãos destinados à exportação -
em decorrência da forte redução de seu calado. O círculo vicioso de conversão de
florestas e prejuízos oriundos da própria conversão parece, em suma, irreversível.
Tudo indica que o grau de referida irreversibilidade depende, em boa parte, da medida
em que as notícias sobre florestas passarem a focar também a contabilidade do lucro.
Me explico: a mera consciência dos danos gerados pela perda do patrimônio verde não é
suficiente para reverter a dinâmica de sua destruição, pois eles tendem a ser
socializados, difusos ou atingem alvos que não tomam decisões imediatamente relevantes.
Já quando se focar a contabilidade do lucro originado pelas florestas o cenário muda
nitidamente.
A variedade e qualidade de nossos produtos de base florestal, aliadas a adequados e
necessários investimentos em tecnologia, se transformam em vantagem competitiva
imbatível. Se, por exemplo, as grandes empresas do mercado globalizado correm para
oferecer diferenciadores de valor como certificação, eis aqui o Brasil que oferece a
primeira certificação do mundo até para um produto de enorme consumo como o papel. O
mesmo acontece com os mercados de nicho: se as grandes empresas da alimentação ou da
cosmética procuram construir uma identidade a partir de extratos, como os flavonóides
do cacau, eis aqui o Brasil que guarda a versão nativa e originária desta planta nas
várzeas amazônicas.
Madeiras e derivados, óleos, fibras, mel, palmitos, castanhas, frutas, artesanato,
carnes e pescados, turismo, bioprospecção, carbono e muitos outros produtos e serviços
oferecidos por Mata Atlântica, Floresta Amazônica, Cerrado, Caatinga e florestas
plantadas. É irônico constatar que até hoje nossa única Indicação Geográfica de origem,
qualificando um produto em relação a seu território, diz respeito a cepas de uvas
viníferas exóticas, sem protegermos e valorizarmos nossa peculiaridade e unicidade.
O lucro de origem florestal apresenta algumas vantagens não triviais. A diversidade de
produtos, se devidamente explorada, proporciona condições de segurança incomum frente
aos mercados globalizados. O lucro florestal é também originado por cadeias altamente
empregadoras e agregadoras de valor, seja nos serviços, seja nos produtos. Ele tende
também a contribuir para fixar a população no campo. Finalmente, ele gera um lucro
adicional a ser distribuído para a sociedade, sob forma de serviços ambientais como
água doce, estabilização do clima, prevenção da erosão e muitos outros.
A partir de amanhã tem início uma oportunidade sem precedentes para que a contabilidade
do lucro florestal vire manchete. Parece incrível, mas o país das florestas não tinha
até hoje uma feira da economia florestal. Agora, tem. A riqueza e diversidade de nossos
biomas se tornarão luxuosa vitrine do Brasil no Mercado Floresta, em plena Oca do
Ibirapuera, em São Paulo, entre 5 e 8 de novembro. Porque é a hora do lucro florestal.
E porque nunca foi mais verdadeiro que o Brasil não conhece o Brasil. (Mercado
Floresta, 04/11)