Um roteiro para a transposição
2005-11-04
Ao longo das últimas semanas, foi levantado um grande acervo de trabalhos sobre a transposição do São Francisco -estudos de órgãos ambientais, organismos multilaterais, ministérios, instituições de pesquisa, especialistas independentes, até a posição de governadores de Estado e autoridades federais. Esse material está todo disponível no endereço www.projetobr.com.br. O texto Entenda a polêmica sobre a integração do São Francisco é uma espécie de roteiro para caminhar pelos diversos trabalhos.
A idéia central da transposição é acabar com os efeitos da seca no semi-árido nordestino, região que abrange 11 Estados e 25 milhões de pessoas. Percebe-se uma ampla falta de consenso sobre dados básicos -valores do investimento, custo operacional, população atendida, relação custo/benefício. Pontos principais de discordância:
Disponibilidade hídrica - O projeto prevê o bombeamento fixo e contínuo de 26,4 m³/s do rio São Francisco para as bacias do Nordeste setentrional. Segundo o governo federal, o volume representa 1,4% do total que o rio despeja no mar (1.850 m³/s) e, portanto, a obra não prejudicaria a fluência das águas. Já os opositores do projeto alegam que o volume retirado deve ser comparado com os 360 m³/s outorgáveis (máximo permitido para ser retirado do rio incluindo outros projetos), e não com os 1.850 m³/s.
Aproveitamento das águas - De acordo com a outorga da ANA, o volume bombeado pode chegar a 127 m³/s apenas quando o reservatório de Sobradinho estiver acima do normal, o que, segundo estudos, acontece em 40% do tempo. Para os opositores, isso representa um desperdício de dinheiro público, uma vez que a obra ficará 60% do tempo subutilizada.
População beneficiada - Em artigo publicado no site, o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, afirma que o objetivo da integração é oferecer segurança hídrica a 12 milhões de pessoas que vivem nas pequenas, médias e grandes cidades dos Estados de Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte e do Ceará. Estudos de Ricardo Feijó e Sergio Torggler, especialistas da Faculdade de Economia e Administração de Ribeirão Preto, estimam em apenas 4 milhões os possíveis beneficiários -cujo consumo corresponderia a só 14,6% da capacidade do projeto.
Custo operacional - O Ministério da Integração Nacional estima em R$ 0,12 o m³ de água. Estudos da FEA-RB chegam a US$ 0,155 a US$ 0,312 por m³, dependendo de o ano ser úmido ou seco.
Custo ao consumidor final - O ministério estima um subsídio correspondente a 4% de alta na conta do consumidor residencial. Outros estudos indicam impacto de três a nove vezes maior.
Alternativas de investimento - O Ministério do Planejamento sustenta que não há alternativa melhor. O estudo dos professores da FEA de Ribeirão procura demonstrar ganhos muito maiores em investimento na própria bacia do São Francisco.
Impacto ambiental - O Rima (Relatório de Impacto Ambiental), que avaliou os possíveis riscos ao ambiente, exigiu 36 planos ambientais. O Ministério da Integração Nacional já encaminhou, mas ainda não obteve a aprovação do órgão.
Todos os estudos estão disponíveis para que os leitores possam acessar, estudar e tomar posição de forma abalizada. (Folha on-line/Luis Nassif, 04/11)