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2005-11-01
Na época dos grandes descobrimentos marítimos as autoridades lusitanas tiveram a preocupação humanitária com os náufragos, cada vez encontrados em maior número nas ilhas desertas. Começaram a distribuir caprinos para servir de alimentos àqueles.

É possível vislumbrar em muitas ilhas a grande devastação provocada pela superpopulação de animais, que depois também morriam de fome. Mas, é bem possível que, em uma ilha determinada, o manejo dos caprinos organizado pelos náufragos em função da quantidade de alimento e seu desfrute, tenham levado o cientista norte-americano professor Hardin Garrett, a elaborar a dedução da Tragédia das Áreas Comuns. Seu artigo, publicado em 1968, na revista Science, 162, pg. 1243-1248, foi importante para se entender impactos ambientais e seus correspondentes aspectos político e sociais, principalmente na agricultura, em nosso caso, a pequena propriedade familiar.

Nele, o autor expõe que em uma área de uso comum com pastagens, onde cada usuário tem o direito de participar sem alterar o equilíbrio ambiental (ecossistema), ou seja, respeitando os ciclos naturais, usufruindo ao longo do tempo, desde que manejando o número de animais conforme as benesses ou restrições devidas às alterações metereológicas e climáticas. Este tipo de manejo é muito comum nos rebanhos na América indígena, África e regiões da Ásia. Quem imagina que isso é atraso, é feito na Grande Pradera (praires) pelo governo dos EUA. Na atualidade é comum nas comunidades de agricultores do Altiplano Boliviano-peruano, nos países africanos e asiáticos e desde o Século VII no manejo da água pelos árabes, na Espanha.

Nestas áreas comuns, o autor considera que população e natureza estão equilibradas, pois os primeiros morrem ou migram buscando outras condições e os segundos se transformam, sem acúmulos.

A tragédia das áreas comuns inicia quando um dos usuários resolve aumentar seu aproveitamento. Isto provoca desequilíbrio no ambiente e a lenta degradação do valor de cada um, embora aquele tenha uma vantagem inicial.

Ao final de um tempo esta área estará degrada. A comunidade de usuários entra em colapso. Entretanto, não é fácil perceber ou alterar, quando percebido, o destino da área ao existirem outros interesses extra-área.

Para melhor esclarecer isso, voltemos à ilha. Ela é a área comum. A natureza alimento dos caprinos e a reprodução destes a sobrevivência dos náufragos. Nestes elementos integrados temos o crescimento da natureza, controlado pelo caprino, e os náufragos controlando os animais em função da oferta da natureza e suas necessidades e sustentabilidade insular. Ao considerarmos uma pequena propriedade familiar, como uma ilha, fica fácil perceber o significado do agricultor no contexto, da mesma forma que o náufrago na ilha.

Em uma sociedade menos evoluída , com diversas populações tradicionais, com seus tempos peculiares e usos comunitários, é fácil se entender esta questão. Da mesma forma que na agricultura familiar, onde há muitos valores remanescentes da vida comunitária dessas populações tradicionais.

Em uma sociedade mais evoluída onde existe a propriedade privada e a sociedade industrial, devemos exemplificar o conceito de Garret Hardin com alguns elementos ambientais, como erosão do solo, agrotóxicos, água e devastação da natureza, para avaliar a depleção, pois já não é mais possível avaliar o colapso do sistema, pois todos elas (as depleções) são trabalhadas como impactos negativos da tecnologia empregada, fazem parte do sistema até seu aperfeiçoamento e substituição.

Em uma sociedade industrial periférica, sem governo autônomo ou com governo heteronômico, além da depleção há uma diferença entre o valor (utilização) e o preço (aquisição) que torna mais difícil de perceber a tragédia das áreas comuns. Os países industrializados hegemônicos, unificam valor e preço nos produtos agrícolas, através de subsídios, políticas públicas protetoras, o que não é permitidos nos periféricos.

Para poder compreender a diferença entre valor e preço , o exemplo do leite materno é claro. Ele tem altíssimo valor, mas não tem preço. Entretanto, para a Nestlé, sua utilização é concorrência desleal, pois o leite em pó tem custos, impostos. É por isso que a propaganda do leite em pó procura diminuir a utilização do leite materno, retirando o seu valor e dando comodidade, satisfação e fantasia ao usuário de seu produto industrial, que tem preço.

Fora convencer o consumidor, a empresa precisa ter o apoio e cumplicidade das autoridades de saúde, economia, ciência e tecnologia. Para isso, usa argumentos políticos, econômicos contextualizados, denunciando toda contrariedade às suas metas. Isso polariza a discussão de forma maniqueísta entre os pró-progresso, tecnologia, desenvolvimento e os contra.

A questão muitas vezes, má enfocada, é que na polarização se procura tirar o valor do leite em pó e não comparar o seu preço com o preço do leite materno e depois quanto este vale.

O outro aspecto é que, o problema não é enfrentar a natureza do leite materno com o produto industrial e sim, que o leite em pó necessita de água pura, de qualidade, que na casa de muitos não há. Daí sua conseqüência na desidratação e diarréias, como epidemias de mortalidade infantil não divulgada pelas autoridades .

A figura do leite materno serve para demonstrar porque as depleções por erosão, agrotóxicos, transgênicos, entre outras, dificulte ou impeça a percepção sobre a tragédia das áreas comuns, no interesse da Nestlé, governo, religião etc. A agricultura familiar deixou de utilizar o seu leite materno e passou a atender a Nestlé . Isto causa grande alegria para os objetivos das empresas que expressam abertamente a necessidade de sua extinção.

Quando vemos as políticas públicas dos atuais governos no Conesul e as grandes empresas intermediárias BUNGE e CARGILL afoitas, introduzindo a soja (transgênica) sustentável na Amazônia e Pampa e os movimentos sociais respondendo à altura, conforme as oficinas no IV Fórum Social Mundial em 2005, temos de trazer a realidade da tragédia das áreas comuns , pois uns estão sendo forçados a plantar soja em nome dos juros da dívida, outros a migrarem excluídos e transformados em consumidores. E os cidadãos urbanos sendo obrigados compulsoriamente a comer ração de commodities industriais em sua dieta. Ambas situações vantajosas para elas.

Enquanto isso, estas empresas acumulam riquezas em função da depleção (nome que a economia designa para a destruição ou desvalorização de um recurso ambiental) na área comum (natureza), que lentamente mingua ou exige mais insumos. Podemos exemplificar com algo ainda inconsciente: a seca ocorrida no sul na última safra, pois a soja transgênica RR, segundo estudos de D. Pimentel, necessita de um terço a mais de água em seu desenvolvimento. Mais uma tragédia nas áreas comuns.

Agora há quem veja, também, a mesma repercussão na proposta de Transposição das Águas do Rio São Francisco . Novamente, vantajosas para elas.

Contudo, a globalização (unilateralismo) insere novos dependentes na área comum , da ilha que é a agricultura familiar, em função da ameaça de Mudança Climática. Eis que surge o eucalipto paladino.

Nossa análise resplandece se trocarmos nosso caprino insular por eucalipto; flora nativa por leite materno; cobiça por informação, fica muito fácil compreender e mais que isso, reverter a tragédia das áreas comuns. Sem questionar governos.

Hoje, há uma grande ameaça para a agricultura de pequena propriedade no Conesul: empresas como Stora Enso, Aracruz, Votorantim e outras introduzem o eucalipto para celulose, terceirizado, no Conesul, em nome de controlar o Efeito Estufa, mas sem estudos de impactos ambiental e hidrológico, ignorando a liberação de gás carbônico retido nas pastagens naturais do pampa, pela introdução do eucalipto. Vantagem para elas. Elas buscam a vantagem futura nos créditos bancários de carbono: aumenta a devastação.

Podemos dizer que esta é a criação de uma nova tragédia das áreas comuns , com suas conseqüências e resultados no tempo, que estão além de uns, outros e lucros, pois há a população tradicional da aldeia global.

Nosso reconhecimento a Garret Hardin, pois só agora compreendi o que significa valor social da propriedade (rural), princípio da precaução e, principalmente, o que significa soberania alimentar. Por que estas empresas e governos falam tanto em segurança alimentar. Segurança alimentar tem um cão ou animal doméstico. Ele come o que seu dono determina. Ele não come o que quer (sua dieta cultural), mas a dieta que o náufrago determina na ilha.

A questão da Agricultura Familiar e Soberania Alimentar, ambas são tão necessários no Mercosul. (Ecoagência, 30/10)

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