Projeto mostra impactos de espécies exóticas em ambientes de água doce
2005-10-31
As chamadas espécies exóticas – plantas e animais que são removidos de seu
ecossistema e introduzidos em outro – são consideradas a segunda causa mundial de
perda de biodiversidade. Essa ameaça levou a Organização das Nações Unidas (ONU) e
outros órgãos internacionais a criarem, em 1997, o Programa Global de Espécies
Invasoras (Gisp). No Brasil, alguns projetos científicos financiados pelo Ministério
do Meio Ambiente (MMA) buscaram levantar os impactos das espécies exóticas em
diferentes ecossistemas e, ao mesmo tempo, trazer alternativas para controle e
manejo dessas espécies.
Um desses projetos foi concluído em junho deste ano e envolve o controle de espécies
exóticas de água doce. Os estudos foram realizados por pesquisadores dos
Departamentos de Ecologia e Biologia Evolutiva e do Departamento de Hidrobiologia da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Também participaram cientistas do
Departamento de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG),
do Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada e do Departamento de Hidráulica e
Saneamento da Universidade de São Paulo (USP). Os recursos iniciais concedidos pelo
MMA foram de R$ 280 mil, ampliados para R$ 340 mil, e serão usados também para
edição do livro “Espécies Invasoras em água doce: Estudo de Caso e Propostas de
Manejo”, que deve ser editado ainda deste ano.
Na fauna brasileira, os peixes e moluscos representam 20% das espécies exóticas;
logo depois vêm os crustáceos, com 19%, e mamíferos, com 13%. “Essas espécies têm
afetado o ecossistema de nossos rios, lagos e represas que estão perdendo uma parte
de seus animais e plantas nativas por causa de animais e plantas de outros lugares
ou até de outros países, que são trazidas pelos homens e neles introduzidas, explica
Odete Rocha, pesquisadora do Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva da UFSCar
e uma das organizadoras do livro.
A incidência de espécies exóticas aumentou nos últimos anos, acompanhando o aumento
do comércio e viagens internacionais e interestaduais. Assim, as espécies exóticas
acabam sendo introduzidas deliberadamente ou acidentalmente nos ambientes. Uma outra
grande fonte de introdução de espécies invasoras em águas doces é, por exemplo, a
água de lastro dos navios que é descartada nos portos. Outras formas de
disseminação de espécies exóticas de água doce é através dos próprios pescadores,
que introduzem espécies deliberadamente em alguns ambientes, e donos de pesque-pague
que por falta de cuidado em suas represas e lagos acabam deixando que espécies
escapem para os ambientes próximos quando ocorre um aumento do nível de água
nesses locais.
As pesquisas foram realizadas em 20 lagos pertencentes ao sistema de lagos do Rio
Doce em Minas Gerais e nos reservatórios do rio Tietê em São Paulo e na represa do
Lobo (Broa) no interior do Estado de São Paulo. Nesse ambientes foram encontradas e
estudadas 18 espécies de peixes exóticos e quatro de moluscos. Foram encontrados
peixes como tucunaré, piranha vermelha e algumas espécies de tilápia. Esses animais
possuem uma alta capacidade de predação e têm causado impactos graves na fauna
desses ambientes, já que “roubam” o espaço e alimento de outras espécies nativas.
– A introdução do tucunaré teve impacto direto sobre a riqueza de espécies nativas.
Pelo hábito alimentar, verificou-se que esse peixe compete por recursos alimentares
com a traíra, a principal espécie nativa carnívora que após a introdução do tucunaré
diminuiu sua abundância relativa de 2,88% para 0,62%-, esclarece Odete.
Após dimensionar o problema das espécies invasoras nesses ambientes, os
pesquisadores propuseram importantes medidas de manejo em curto, médio e longo
prazos. As ações propostas são muitas e vão desde a remoção manual das espécies,
incentivo à pesca seletiva e controle biológico através da introdução de espécies
predadoras, até utilização de sustâncias tóxicas, medidas de educação ambiental,
reposição de espécies, divulgação de informações científicas e incentivo para
utilização das espécies exóticas em projetos de economia solidária com artesanato.
– No caso da utilização do controle biológico, em nosso trabalho nós localizamos um
peixe nativo que consome muito uma espécie exótica de molusco. Assim, uma solução é
a introdução de uma maior quantidade dessa espécie de peixe no ambiente em
determinado período para que consumam esses moluscos-, exemplifica Odete.
Além do livro, que será distribuído gratuitamente para universidades públicas e
outras entidades de pesquisa, já foram feitos cartazes e panfletos explicativos
sobre espécies exóticas em águas doces brasileiras, que serão distribuídos próximos
aos ambientes estudados na pesquisa em locais específicos como escolas,
pesque-pagues e pontos comerciais ligados à pesca. (Ecoagência, 27/10)