A Educação como ferramenta para o desenvolvimento sustentável
2005-10-31
Por Beatriz Dornelas*
O Planeta Terra pede urgência na implementação de ações que possibilitem a
sua sustentabilidade. Essas ações não podem ser vistas como atos isolados,
de responsabilidade de alguns, mas a ação sustentável deve ser iniciada
de dentro para fora, da postura e exemplo de cada um de nós. Do agir
particular de um indivíduo, de um grupo, de uma escola, de uma comunidade,
de um bairro, de uma cidade... É o agir em partes para atingir o todo.
A educação é a ferramenta para realização do sonho da cidadania planetária –
o desenvolvimento sustentável. No seu sentido amplo e no alcance de sua
função social, a educação deve ser a expressão do processo da democracia,
capaz de construir a cidadania através do saber e da análise e reflexão do
contexto global em que estamos inseridos. É o caminho ideal para a aquisição
da identidade social, política e econômica de um povo comprometido com o
equilíbrio e a preservação do Planeta Terra.
A Agenda 21 propõe ações que visem a integração entre meio ambiente e
desenvolvimento sustentável. No plano estratégico, parte de uma visão
integrada de diversos segmentos, onde a abordagem de cada um desses deve
estar comprometida com a preservação do Planeta, através de alternativas que
busquem cuidar da gestão dos recursos naturais impedindo sua escassez e
promovendo em cada realidade local condições ideais de vida e conservação
dos seres vivos.
Dentre esses segmentos responsáveis para a efetivação da Agenda 21 Local, a
Educação é uma prioridade. E, ao ser entendida dessa forma por todos os
demais segmentos da sociedade, torna-se forte, ousada, parceira, e
transformadora do contexto ambiental.
Aos atores do cenário educacional, professores, técnicos, educadores e
pedagogos, cabe incentivar um ensino que leve os alunos a observarem sua
realidade local, diagnosticar as situações-problema do seu meio e levá-los
a não se acomodar, a agirem contra o descaso, a implementarem ações que
gerem soluções efetivas. Cada um deverá ser capaz de transformar a sua
realidade vencendo os obstáculos, libertando–se da omissão e da exploração e
da ignorância comandadas por interesses dominantes.
A educação tem por missão clarear e fortalecer o pensamento do indivíduo,
para que esse não seja mais um cego social, omisso e sem percepção da
realidade que o cerca, promovendo nos bancos das escolas, no chão da sala
de aula, discussões de temas atuais e a busca conjunta entre educandos e
educadores por soluções que promovam ações concretas locais no intuito de
sanar os problemas diagnosticados ao seu redor.
A leitura do mundo continua válida como estratégia pedagógica de uma
educação libertadora na qual ler o mundo é condição necessária para a sua
transformação. Nessa perspectiva, a Pedagogia abre espaço para uma atuação
comprometida com a sustentabilidade, impondo, assim, a necessidade de se
dar mais atenção às questões ambientais locais e globais, conduzindo-as aos
conteúdos trabalhados diariamente na sala de aula.
Torna-se imprescindível a construção de um projeto político-pedagógico que
se preocupe com os desafios do século, em especial os de âmbito ambiental.
Segundo Leonardo Boff, ex-frade franciscano estudioso da ecologia social e
um dos responsáveis pela redação da Carta da Terra, as ações ecológicas
estão sustentadas por quatro grandes pilares. O primeiro pilar é: Respeitar
e cuidar da comunidade de vida, ou seja, do meio ambiente em sentido amplo. O
segundo: Manter a integridade ecológica, no que diz respeito à manutenção da
sua riqueza, beleza e diversidade. A terceira grande pilastra: justiça
social e econômica, uma vez que a existência dessas desigualdades afeta ao
ser mais complexo da natureza que é o ser humano. Toda injustiça social
provoca uma injustiça ecológica contra o ser humano. E por último: a
democracia, não violência e paz. Pensar ecologia de forma ampla, abrangendo
não só em termos de democracia dos seres humanos, mas de todos os seres
vivos.
Os pilares ou princípios encarnam o conceito da sustentabilidade, impondo
aos seres humanos a necessidade de relações de consumo que amparem a
cooperação, e não a competitividade ambiciosa, os valores éticos, a paz e
harmonia ecológica. Evitando a relação de violência, de não alteridade, de
não respeito, estaremos introduzindo o cuidado, que é uma relação amorosa
para a vida, é não agressiva, é abrir-se generosamente ao outro, acolher e
respeitá-lo na sua diferença.
A pedagogia do cuidado, como conceitua Boff é o preservar, o cuidar para
a vida, para os ecossistemas, nas relações entre as pessoas. O cuidado
supera as classes, inclui todos numa perspectiva de igualdade. É a
pré-condição que garante que as coisas dêem certo. Tudo aquilo que se cuida
dura muito mais e é revertido em benefícios para todos. A educação é capaz
de ressignificar o conceito de sustentabilidade, ultrapassando o sentido
econômico de garantir o sustento, mas de garantir a existência da vida
humana e da diversidade dos seres vivos. Perpetuando assim a integridade, a
beleza natural, e a capacidade de regeneração de todas as espécies, porque
a Terra, como diz o teólogo e ambientalista Leonardo Boff, está cheia
de chagas. É preciso fazer com que ela crie condições, que os desertos
voltem a ser férteis, que as florestas, matas ciliares junto aos rios, que
foram derrubadas, possam voltar a manter a umidade e a alimentar as
nascentes.
O papel da escola ideal é divulgar a potencialidade e o poder que cada um
tem, expandindo as idéias nascidas após as discussões em salas de aula, em
fóruns e seminários nas escolas e comunidades, criando alternativas que
possam ser multiplicadas para a comunidade e fortalecidas por setores
públicos e privados da sociedade.
Concluindo, a escola é fundamental como instrumento para disseminar as
idéias que estão na Carta da Terra em dois momentos: primeiro, num momento
de uma nova consciência, aprendendo os dados sobre a situação da Terra,
sobre a natureza, sobre a biodiversidade e sobre a nossa responsabilidade
desde pequeninos até o resto da vida sobre a casa comum que é o planeta
Terra, as águas, os ecossistemas, os animais, as plantas. E em segundo
lugar, a escola deve se articular com a própria natureza diretamente,
organizando que os estudantes tenham contato com as plantas, com os animais,
conheçam a história e a inter-relação entre todos eles e finalmente sintam o
ambiente não como uma coisa exterior, mas como uma coisa que pertence à vida
humana.
Nós fazemos parte do ambiente, do Planeta Terra, por isso, precisamos
divulgar e informar ao mundo que o destino da natureza será o nosso destino.
A partir daí nasce uma consciência de responsabilidade, uma ética do cuidado
para que todas as coisas que estão doentes, em perigo de extinção, tenham
possibilidade de se revitalizar e as que estão sadias possam evoluir junto
conosco, e gerar o desenvolvimento sustentável tão discutido e almejado nos
dias de hoje.
Em consonância com as ações priorizadas na Agenda 21, torna-se importante
e essencial a construção da Agenda 21 Local, de forma participativa e
democrática, acolhendo as idéias centrais e gerais de todos os segmentos. As
ações propostas para a área da educação exprimem intenções gerais que
deverão ser analisadas, adaptadas e desmembradas em diversas outras ações de
acordo com a realidade e prioridades locais diagnosticadas.
Ações recomendadas na área da Educação:
1. Divulgar o documento Agenda 21 nas escolas, da Educação Infantil ao
Ensino Superior, apresentando o documento e seus respectivos capítulos, com
histórico, finalidade e importância para o futuro do Planeta Terra, de forma
estimulante e adequada a cada faixa etária, utilizando recursos e
estratégias diversas.
2. Criação de grupos de estudo para a leitura e aprendizagem dos conceitos
presentes em cada um dos capítulos da agenda, enfatizando a importância do
capítulo 36 para a educação.
3. Planejar e montar oficinas pedagógicas com toda a comunidade escolar,
tendo como finalidade a informação, reflexão e planejamento de práticas e
ações efetivas para solução de problemas locais diagnosticados.
4. Articular e criar fóruns de agenda 21 nas escolas, com o objetivo de
discutir diretrizes para uma educação sintonizada com os conceitos chaves da
agenda: Desenvolvimento sustentável, eqüidade social e meio ambiente seguro
e saudável.
5. Instituir a Agenda 21 da escola e do bairro, buscando enfrentar em cada
unidade escolar seus múltiplos problemas, concentrando a energia coletiva em
favor de mudanças que melhorem as condições de trabalho, vida e ensino.
6. Viabilizar através da área de educação, a implementação de projetos
culturais, econômicos, ambientais, e de saúde que promovam iniciativas
positivas de preservação do meio ambiente e, em conseqüência, do próprio
ser humano no Planeta Terra.
7. Solicitar dos Conselhos Municipais de Educação, Assistência Social, da
Criança e do Adolescente e outros, propostas de ações que promovam o
desenvolvimento ambiental sustentável.
8. Estimular todos os segmentos da sociedade a participarem e serem
parceiros em ações voluntárias que visem a contribuir para a conservação da
vida.
9. Levar para dentro das escolas o apoio e o envolvimento das ONGs, do setor
empresarial, das iniciativas de entidades religiosas e lideranças
comunitárias, para juntos atuarem localmente sob a realidade ambiental
diagnosticada.
10. Realizar trabalho de mobilização em torno da educação formal e informal
nas comunidades, para estimular o interesse pelo aprendizado e a importância
do desenvolvimento sustentável.
11. Promover cursos de capacitação de profissionais da área da educação para
agirem como agentes ambientais.
12. Consolidar um balanço das experiências de educação ambiental e
desenvolvimento sustentável nas escolas de Muriaé e avaliar os seus
resultados, com o apoio da mídia.
13. Realizar projetos de educação ambiental e de capacitação para
viabilização das ações propostas na Agenda 21.
14. Incentivar nos jovens e idosos o gosto pelo serviço civil voluntário,
pelas ações comunitárias, operações de socorro e conservação da natureza,
estimulando ações de tipo cooperativo.
15. Construir nas escolas Planos Integrados de Ação para o Desenvolvimento
Sustentável no município, a partir da própria realidade.
16. Implementar o sistema de ensino em tempo integral em parceria com
setores privados, promovendo atividades que combatam o analfabetismo
funcional e a desinformação ambiental.
17. Transformar a escola em centro de excelência e cidadania, e ponto de
pesquisa da realidade ambiental da cidade, integrando-a ao bairro e à
cidade.
18. Mobilizar as Faculdades locais a organizarem palestras, seminários,
fóruns e divulgarem os resultados dos mesmos às comunidades escolares.
19. Incentivar a participação de pais de alunos na gerência de projetos
ambientais da escola, e da preservação dos recursos naturais locais, para
melhoria da qualidade de vida de todos os seres vivos.
20. Desburocratizar a participação da comunidade escolar e voluntários da
sociedade em projetos ambientais nas escolas.
21. Fortalecer o papel protagonista da mulher na sociedade, incorporando
seus valores ancestrais de respeito à natureza, à paz e à coesão social e
estimular a igualdade de gênero.
22. Valorizar a história da cultura indígena e negra, na preservação e
conservação dos recursos naturais.
23. Conhecer o uso sustentável dos recursos naturais, protegendo-os da
destruição provocada pela biopirataria.
24. Promover nos espaços universitários, centros de referência, pesquisa e
desenvolvimento, voltados para a capacitação em desenvolvimento sustentável,
estimulando seus vínculos com os projetos de desenvolvimento regional, de
combate à pobreza, de fortalecimento da identidade cultural e de implantação
de projetos de interesse local.
*Beatriz Dornelas é professora da rede pública municipal de Muriaé - Zona da Mata Mineira,
graduada em Filosofia e especialista em Psicopedagogia pela FAFISM.
(Fonte: Ambiente Brasil, 26/10/2005)