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2005-10-28
No mapa, o Brasil perdeu 26.130 km2 de floresta amazônica entre agosto de 2003 e agosto de 2004, conforme divulgou o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) no primeiro semestre. Na prática, 1,3 bilhão de árvores derrubadas, 46,5 milhões de aves e 1,5 milhão de primatas afetados no período, em média. Os números compõem uma estimativa feita por três pesquisadores brasileiros e publicada no último número da revista do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP). Com a avaliação, o trio mostra que, por trás de anúncios oficiais de índices e planos contra a ação dos desmatadores, existe um impacto na biodiversidade e na disponibilidade de recursos naturais difícil de ser recuperado.

O cálculo é simples: uma regra-de-três com base na área divulgada, que representa o corte raso das árvores, e dados colhidos de outros trabalhos científicos. Hoje, já é aceito que 1 hectare de floresta amazônica tem uma média de 450 a 750 árvores, de acordo com a ecorregião que se trabalha - o que equivale a 45 mil a 750 mil delas por quilômetro quadrado. Multiplicado pela área estimada pelo Inpe, chega-se ao número inacreditável: de 1,17 bilhão a 1,43 bilhão de árvores cortadas e queimadas. Se colocadas lado a lado, dariam mais de três voltas ao redor da Terra.

O mesmo cálculo foi feito para animais. A Amazônia abriga mais de mil espécies de aves. Como se encontra de 1.658 a 1.910 indivíduos em 1 km2, o corte afetou a vida de 43 a 50 milhões de aves em um ano. No caso de primatas, de 914 mil a 2,1 milhões tiveram sua vida mexida, já que cada quilômetro quadrado pode ser o lar de 35 a 81 animais.

Mesmo levando em conta que a maior parte dos locais desmatados fica próxima de onde o homem atua há tempo, Peter Mann de Toledo, coordenador do projeto Geoma e um dos autores do estudo, explica que os animais estariam ainda por perto.

— Pesquisas feitas perto de Manaus, onde há áreas degradadas, mostram que os animais fogem das bordas, mas estão no miolo da floresta. Eles são atingidos sim pelo desmatamento.

Toledo admite que o trabalho é uma extrapolação sem comprovação científica .

— Mas o número está bastante próximo da realidade, pois existem muitos estudos, alguns bastante recentes, com estimativas similares da população de árvores em um hectare, por exemplo.

Como provocação a quem duvida, ele faz outro cálculo, este com ajuda do engenheiro florestal Rafael Salomão, do Museu Goeldi, que não participou do estudo publicado na revista. Segundo eles, nos 26.130 km2, cerca de 58 milhões de árvores teriam valor comercial. Como são cortadas de forma indiscriminada (muitas vezes, com ajuda do correntão, quando uma corrente é presa entre dois tratores para derrubar grandes áreas rapidamente) cerca de 98 milhões de m3 de madeira vão literalmente para o espaço.

— Vamos pegar um valor baixo, R$ 100 o metro cúbico. Isso significa R$ 9,8 bilhões jogados fora - diz Salomão.

Para Toledo e seus dois colegas, Ima Vieira, diretora do Museu Goeldi, e José Maria Cardoso da Silva, da ONG Conservação Internacional, a solução é aparentemente tão simples quanto a regra-de-três: desmatamento zero e aproveitamento sustentável do território.

A proposta já havia sido feita em 2003, pelo museu e a ONG, mas o debate sobre a proposta não se fortaleceu.

— Há um custo político alto. Então defendemos um grande pacto entre governos, estaduais e federal, e o setor produtivo - diz Vieira.

Para ela, não é preciso derrubar mais para que a Amazônia cresça e produza.

— O Pará já tem 20% de seu território alterado, então segundo a lei já está no limite. Não precisa tirar mais árvore.

O aproveitamento de solos degradados pelo desmatamento, por exemplo, integra projetos na região, entre eles da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em parceria com Incra.

Toledo engrossa o coro e diz que o País pode resolver os grandes problemas da Amazônia, como a falta de ordenamento fundiário, enquanto muda o modelo de exploração.

— O governo precisa agir em várias frentes e é possível ordenar as diferentes ações. Não adianta tentar parar o trem em alta velocidade se colocando na frente dele; é preciso subir e construir o freio. (O Estado de S. Paulo, 27/10)

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